segunda-feira, 20 de agosto de 2012

CASOS DO BREJO III - MESSIAS PREÁ


CASOS DO BREJO III – MESSIAS PREÁ

Enoque Alves Rodrigues

No Brejo das Almas de antigamente não há quem não o tenha conhecido. Na verdade ele pouco ia ao Centro do Brejo. Ocupava a maior parte de seu tempo caçando preás no morro do mocó. Vivia, praticamente, no topo do morro. Descia todas as tardes em direção à antiga fazenda de Antonio Miranda por onde saia para bebericar alguns pileques nos bares da região.

Messias Antonio Dias, assim se chamava. A alcunha de “Messias Preá” foi-lhe dada devido a esta prática de caçar preás. No entanto, ele era um caçador meio que às avessas, pois ao invés de caçar estes pequenos animais, pertencentes ao grupo dos roedores, para se alimentar, ele apenas os caçava por mero prazer. Ele se realizava ao vê-los cair em suas inofensivas armadilhas. Uma vez presos e imobilizados ele, curiosamente, amarrava uma pequenina fita em uma das patinhas do preá e o soltava de volta à Natureza. Antes ele tinha o cuidado de registrar em uma folha de caderno a data e o número do bichinho. Assim caso houvesse alguma repetição de o mesmo vir a cair em sua armadilha ele o soltava imediatamente, porque não mais necessitava ser “recenseado”. A sua sensação estava na primeira vez. Nada mais.

Redundante seria me estender sobre a lenda que, segundo a qual, há no morro do mocó um rico tesouro, enterrado que foi por Jerônimo Xavier de Souza. Sobre o dito cujo, muitos historiadores interessantes, de renome e projeção nacional já discorreram. Houve, inclusive, várias corridas à caça do mesmo que, no entanto, resultaram-se infrutíferas. Talvez não tenha chegado ainda o tempo necessário para esta revelação ou quiçá, o espirito deste Bandeirante, parente próximo de Joaquim José, já tenha encontrado o repouso suficiente que o tornou indiferente ás necessidades materiais mais comezinhas de pobres brejeiros, que nada desejariam, senão uma pequena parte deste imenso quinhão, cada dia mais distante.

Bem, antes que você me pergunte: E o que teria o pobre do Messias Preá a ver com isso? Pois, é. Vamos, então, partir para o “quase” epílogo desta despretensiosa crônica e no final você entenderá que, ao contrário do que imaginava, ele, Messias Preá, tinha sim, muito a ver com tudo isso, pois esta história não existiria não fosse ele seu principal personagem.

A tarde caia faceira e preguiçosa por aqueles recônditos de meu Deus. O astro rei acabava de se ausentar do Orbe, partindo para iluminar os mundos intangíveis aos nossos olhos e limitadas divagações. O clarão da lua cheia já cintilava nas águas do São Domingos. Messias houvera tido um dia “muito cansativo e enfadonho”. A caça e identificação de seus preás fora muito produtiva. Agora ele estava se preparando para descer o morro. Sairia em frente ao antigo casarão da sede da fazenda de Antonio Miranda e dona Edite e dali, ganharia as imediações. Era o que ele imaginava. Mas não foi exatamente isso o que ocorreu. 

De soslaio, visualizou algo que a primeira vista não conseguiu identificar, mas que reluzia. Brilhava um brilho azulado que resplandecia até as copas dos mais altos e frondosos arbustos. Curioso, apesar de comedido, aproximou-se um pouco daquele estranho objeto. A distância não era grande. Mas, mesmo assim, por estar um pouco escuro, não lhe permitiu definir do que se tratava realmente. Aproximou-se um pouco mais... Mais... Mais... E, zás... Lá estava um grande, e encardido alforje em couro de um boi que seguramente fora sacrificado centenas de anos antes daquela descoberta. Estava aquele alforje, ainda, sujo da terra vermelha do Brejo das Almas, ou Francisco Sá, “igual a ti, outro não há”. Isso só já era motivo mais que primordial para levar a mais iluminada das mentes a navegar por mares pródigos e alvissareiros onde patacas de ouro cunhadas nos tempos do Império tilintavam as vistas do caboclo. 

Inebriado, extasiado. São sinônimos, não importa. Era assim que ele estava. Contemplava tudo aquilo, mas não acreditava no que seus olhos viam. Estaria ele experimentando o fenômeno da segunda-vista ou dupla-vista que se trata de um efeito de emancipação da alma o qual se manifesta quando nos achamos acordados, cuja finalidade é nos fazer ver coisas ausentes como se presentes estivessem? Seria ele, Messias Preá, clarividente? Bem, se nem ele sabia possuir este dom quem dirá, eu que, nem lá estava e que, somente hoje, oitenta anos depois, me atrevo a fazer este misero relato. 

A curiosidade que matou o gato, por certo,  pensava ele, não o mataria. Á necessidade que fez o sapo pular, dele não se apoderaria. Fechara, consigo próprio, que independente do que houvesse naquele alforje, ele não tomaria conhecimento. Abdicado estava, segundo ele, de todo e qualquer desejo que o levasse a por a mão “naquela coisa”. 

Você ai que me lê, procure controlar também a sua curiosidade e espere os próximos capítulos por que só darei o final desta história após eu retornar do Brejo das Almas para onde viajo nesta semana para comemorar o aniversário de minha mãe. Não avançarei nesse caso, um milímetro sequer, antes disso. 

É...

Por vezes, ou quase sempre, saber esperar com paciência e resignação também é uma das grandes virtudes.

E tenho dito!

Enoque Alves Rodrigues, que vive em São Paulo, é brejeiro de nascimento e convicção. Atua há mais de 41 anos na área de Engenharia. É autor do livro “Liderança Conquistada”, temática simples sobre otimismo, liderança e motivação, cuja primeira edição já se encontra esgotada. É Colunista, Palestrante Motivacional, Historiador e Divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil
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Se você é Brejeiro e deseja participar da seleção de minhas melhores crônicas que serão inseridas no meu próximo livro “O Brejo das Almas em Crônicas” entre nos meus blogs e escolha. Ao final envie-me o titulo da crônica pelo e-mail: enoque.rodrigues@ibest.com.br

sábado, 11 de agosto de 2012

CASOS DO BREJO II - JUAREZ DE QUADROS


CASOS DO BREJO II –  JUAREZ DE QUADROS

Enoque Alves Rodrigues

Morro da Masseira - Francisco Sá, MG
Definitivamente ele estava com o burro na sombra. Nasceu numa família onde criar e vender gado de corte era tradição centenária. Assim como seu tio que vivia nababescamente, já em idade avançada, na bela Curralinho dos tempos antigos, ele também se enveredou pelos caminhos da fazenda. Depois de muita labuta e escorregões em bosta de vaca, agora ele estava colhendo os frutos que havia plantado na juventude. Deitado eternamente em berço esplêndido. Ao som do mar não, porque Minas, assim como o Brejo das Almas onde ele nasceu, não tem mar. Porque se o tivesse, certamente que o acolheria. De mais a mais, usufruía de todas as regalias ou benesses. Claro que eu sei que esta estrofe se refere a nossa Pátria Mãe Gentil e que se trata de uma exaltação ao nosso gigantismo e pujança. Ele era merecedor do que possuía. Venceu na vida sem se utilizar de atalhos. Tampouco à sombra do tio rico. Ele correu atrás. Foi à luta. Ele conseguiu.

Juarez Dias de Quadros era este o seu nome, não obstante ter feito todos os seus estudos na Capital Mineira, onde se formou em medicina, jamais quis exercer esta profissão. Aliás, no Brejo das Almas ou Francisco Sá, quase ninguém sabia que ele era médico. Importante salientar que este sobrenome “Dias de Quadros” não tem nenhuma ramificação familiar com homônima atual. O dele descendia do Pará. 

Ao seu retorno para o Brejo das Almas, seu tio Olacyr o presenteou com uma imensa fazenda.   Foi por isso que antes de prestar o juramento de Hipócrates, a inclinação para com as coisas da terra já estava em seu sangue.

Casou-se com Vanda. Nunca tiveram filhos. Com isso, tempos depois, ricos, estavam agora, Juarez e Vanda, sozinhos no casarão daquela fazenda em cujo frontispício se achava uma cabeça empalada de boi, acima da qual se lia em letras garrafais: “Fazenda Pau Preto – propriedade de Juarez e Vanda – 1932”.

Velhos e alquebrados. Tiveram o privilegio de avançar na vida e na idade. Ninguém vive sem envelhecer. Mas eles eram felizes. Plenamente? Bem! Talvez. Quem sabe. Eram. Claro, não lhes faltava nada. Esperem um pouco, sem mineirismo: Juarez e Vanda eram felizes porque tinham tudo? Ou porque não lhes faltava nada! Particularmente, se eu pudesse, não sairia da zona de conforto. Eu ficaria, por certo, com as duas alternativas. Mas sabemos que há momentos na vida em que temos que decidir. Temos que optar... 

Pois é, meus conterrâneos Brejeiros, eles se achavam felizes exatamente porque na concepção deles, não lhes faltava nada. Mas eles não tinham mais a doce sensação de levantar todos os dias de manhã e sair em busca de algo. Uai, sendo assim eles não tinham tudo. Mas também haviam passado quase todos os anos de suas vidas levantando-se de madrugada para conseguirem amealhar patrimônio que pudesse sustenta-los pelo resto da existência. E agora colhiam os frutos.

Bem, não demorou muito e o implacável senhor da razão mandou-lhes a fatura. O burro, conforme eu disse na introdução, estava realmente na sombra. Tudo que Juarez e Vanda desejavam conquistar os deuses lhes deram em dobro. Vocês já perceberam que alguns que parecem nem ter trabalhado tanto conseguem enriquecer com muito mais facilidades que outros que ralaram a vida toda? Eles venceram, é verdade, eu já disse. Mas o carnê agora chegava e tinha que ser quitado. Vinha com juros e correções.

Começou com uma dorzinha nas costas de Juarez. Algum tempo depois Vanda reclamava da mesma dor que baixou para as pernas. Transcorridos dois dias, Juarez também passou a reclamar da dita cuja nas pernas, que endureceram. As de Vanda, também. Agora passavam os dias sentados, um ao lado do outro, cada qual numa bela e bem trançada cadeira em vime. O rico patrimônio, dores e endurecimento nas articulações, somados com a falta de necessidades materiais, eram agora motivos, ou melhor, justificativas, mais que suficientes para manter aqueles dois pombinhos no ócio. Não se mexiam. Também não precisavam. Serviçais zelosos que se esmeravam aos seus cuidados dias e noites, anos a fio, estavam ali, para servi-los. 

Foi oportuna e indispensável á intervenção de pequena Plêiade que lá de cima os observava.
Dizia um deles que parecia ser o líder:

- O que são aqueles dois pontinhos escuros e imóveis, lá embaixo, no Brejo das Almas, ao pé do morro da masseira?

- Não saberia informar-lhe, Senhor. Da altitude em que nos encontramos é muito difícil distinguir alguma coisa!
- Vá lá, então. Certifique-se do que se trata e venha me contar. Não é possível: Há 10 anos, 9 meses, 25 dias, 6 horas, 33 minutos e 28 segundos que não consigo registrar em meus apontamentos um minuto sequer de trabalho daqueles dois. Mal consigo sentir a vibração dos elos que os unem a nós e que são alimentados pela força do trabalho. A continuarem assim, em pouquíssimo tempo, os elos vão se romper, e ai, eu não poderei fazer mais nada.
Foi assustadora a chegada do anjo àquelas paragens. Com o dedo em riste apontava para Juarez e Vanda, esbravejando: 

- Quem diabos vocês pensam ser? Quem foi que lhes autorizou a parar de trabalhar? Qual foi o tonto que lhes disse que vocês já estão com a vida ganha? Vocês não sabem que um ano trabalhado aqui embaixo representa somente uma hora de estadia lá em cima? Mexam-se, seus preguiçosos. Vocês estão se enferrujando e daqui a pouco não vamos mais conseguir ver vocês. O chefe mandou dizer que se vocês não se movimentarem. Não forem à luta e não trabalharem para seguirem contando pontos, ele vai “puxar vocês”!

Ai, brejeiro, não teve jeito. Quando a água bate na bunda neguinho pula. Todos querem o Paraiso, mas ninguém quer morrer. Saltaram da cadeira e retomaram a luta. Bater o ponto era preciso. 

É...

Por vezes, é quando pensamos que temos a vida ganha que mais necessitamos trabalhar. Os apontadores do além não dão moleza. Eles não dormem nunca.

E tenho dito!

Enoque Alves Rodrigues, que vive em São Paulo, é brejeiro de nascimento e convicção. Atua há mais de 41 anos na área de Engenharia. É autor do livro “Liderança Conquistada” temática simples sobre otimismo, liderança e motivação, cuja primeira edição já se encontra esgotada. É Colunista, Palestrante Motivacional, Historiador e Divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.

Se você é Brejeiro e deseja participar da seleção de minhas melhores crônicas que serão inseridas no meu próximo livro “O Brejo das Almas em Crônicas” entre nos meus blogs e escolha. Ao final envie-me o titulo da crônica pelo e-mail: enoque.rodrigues@ibest.com.br

sábado, 4 de agosto de 2012

CASOS DO BREJO I - NALDINHO E MABÉL: GEOGRAFIA E HIDROGRAFIA


CASOS DO BREJO I –  NALDINHO E MABÉL: GEOGRAFIA E HIDROGRAFIA

Enoque Alves Rodrigues

Não. Não podia ser. Aquilo não era verdade. Bem, poderia até ser real. Verdadeiro. Desde que não fosse com ele. Por acaso ele não havia se preparado a vida toda para ser um exemplar pai de família? Um ótimo professor? Optara, desde a mais tenra idade pelo sacerdócio do ensinar e agora estava ali, ouvindo aquilo. Fora, durante toda a vida um estudante aplicado. Orgulho maior de todos os seus professores que se gabavam ao chama-lo a lousa para dissertar sobre os mais variados temas. Ele deixava qualquer um de boca aberta. A sua inteligência era o que se podia classificar como privilegiada. Tinha, com toda certeza um QI de três dígitos. 

Brejeiro, nascido na Praça Jacinto Silveira, num lindo casarão onde hoje se localiza um Hotel, Agnaldo Francisco da Conceição, ou Naldinho, parecia biblioteca ambulante. Era a cultura em ebulição. Transpirava o saber por todos os poros.

Menino, ainda, conheceu Maria Isabel Dias ou Mabel nos áureos tempos de Mariquinhas. Lindos dias. Nas namorações veladas dos dois celibatários, onde um se assentava em uma ponta do banco e o outro na outra, o assunto que, pelas circunstancias naturais, tinha que versar sobre as coisas do coração, quando menos se esperava, debandava pelos campos da ciência, da astrologia, da geografia brejeira e da bacia hidrográfica que banha aqueles rincões. Era engraçado de ver. Ele, por força do hábito, Inseria, sem querer, entre as temáticas do emocional, as friezas medonhas e cansativas das ciências e coisas. Estes temas não se coadunam entre si. Era mais ou menos assim:

- Naldinho, temos que marcar logo o noivado. A mãe que está na ponta daquele banco e o pai que está na outra ponta estão me pressionando.

- Pois é, Mabel, você sabia que o rio São Domingos que nasce aqui na serra do Catuni,  desagua no rio Verde Grande? E que o rio Verde Grande divide o nosso município de Brejo das Almas do município de Montes Claros? Que a rede hidrográfica do Brejo das Almas é muito pobre devido á maioria de seus córregos secarem quando não chove? Imagine você, uma coisa, Mabel, como é que pode isso? Temos tantos córregos, veja: do lado norte temos o córrego do carrapato, o sitio novo, o ribeirão de cana brava, o córrego pau preto, o do brejão, o mamonas, o traçadal e o rio quem-quem que passa na fazenda Terra Branca do “seu” Liberato. Sem falar do grande rio gorutuba com suas belíssimas praias de areias que banham o povoado do Catuni. Já do lado Sul, nós temos outro montão de córregos, como, o rio boa vista, vaca brava, o córrego dos patos, o rio caititu, o rio da prata e o córrego rico. E as nossas lagoas? Você já imaginou quantas são? Mouras, da barra, da prata, das pedras, lagoa nova. E a lagoa do tabual... E mesmo assim, tudo isso seco... Já imaginou?

- Então, Naldinho, o que você me diz do nosso casamento? 

- Interessante mesmo Mabel, não é a nossa hidrografia, mas sim, a nossa geografia. Veja: você sabia que o nosso município se situa na bacia do rio São Francisco? Que o nosso vasto território fica  no vale médio do verde grande? Que somos limítrofes, ao norte com Grão Mogol. Ao sul com Montes Claros e Capitão Enéas. Ao leste com o município de Juramento e a oeste com Janaúba? Que estamos distantes de Belo Horizonte 480 quilômetros? Que a nossa área territorial compõe-se de 2.749.393 quilômetros quadrados? Que a nossa densidade demográfica gira em torno de 9.5 habitantes por quilômetro quadrado, sendo 49,5% de homens e 50,5% de mulheres? Você sabia que o nosso município de Brejo das Almas seria maior hoje não fossem as duas grandes mutilações que ele sofreu para “dar a luz” aos municípios de Janaúba e Capitão Enéas? Sabia que o nosso município tem vida própria e é habitado por um povo laborioso, pacato, de hábitos simples e hospitaleiro o que muito dignificam as nossas origens? E o que você me diz, Mabel, de nossa altitude de 667 metros acima do nível do mar? E sobre as nossas coordenadas geográficas de 16º’27’00 de altitude sul e de 43º’28’00 de longitude WGr? E o nosso fundador, Seu Jacinto. Você já leu alguma coisa sobre ele? E os nossos ancestrais? Você já imaginou como o Bandeirante Antonio Gonçalves Figueira conseguiu chegar por nossas terras?

Bem, convenhamos que o “papo firme” do amigo Agnaldo, que, aliás, não possuía em nenhuma parte de seu bojo uma pitada sequer de romantismo, destoava, inteiramente, do que a bela brejeira Mabel queria ouvir. Se ele tivesse ao menos falado das matas, dos pássaros e principalmente das flores silvestres que cercam e ainda perfumam a minha terra, poderia ter recebido um desconto. Mas desta vez a sua mente iluminada o traíra. Ele não falou das flores. E, por não ter ele falado das flores estava agora ali, no veneno, literalmente “no brejo”.   

Era exatamente por isso que ele agora se amaldiçoava. Maldizia a sua sina. Não acreditava no que lhe reservara o destino. Lamentava, conforme o encontramos na introdução destas mal traçadas linhas. Levara um tremendo pé no traseiro que o deixou desnorteado. Desiludido, abandonou numa esquina qualquer do Brejo o sonho de ser professor. Casar, constituir família e viver uma vida simples, mas, tranquila e sossegada, a beira do rio. Rio? Não! Isso não... Foi exatamente por falar tanto em rios, córregos, lagoas, altitudes, longitudes, densidades, extensões territoriais e o diabo a quatro, era que ele agora estava ali, sozinho. Sem o amor de Mabel. Ele teria que viver em algum lugar que não fosse o Brejo das Almas, e, de preferência, onde não existisse nada que o fizesse recordar da dor da perda de sua Mabel. Pensou. Repensou. Matutou. Ruminou e não chegou a nenhuma conclusão. Bem... Chegou, sim. A de que na terra ou em qualquer lugar sobre ela, não existiria nada que o fizesse olvidar aquela desilusão. Num misto de fraqueza, coragem e covardia, tomou a pior e mais abominável das decisões. Encontramo-lo, agora, vagando sem rumo pela crosta sem poder subir ou descer. Lá não há elevador nem ascensorista.  Coitado, percebeu, tardiamente, que nem mesmo aquele seu tresloucado gesto de “bravura” conseguira liberta-lo do peso da culpa pela perda daquela paixão transitória. Muitíssimos anos depois, em idade avançada, partiu do Brejo a bela Mabel em direção ao Infinito. Não. Não se encontraram. Eles transitam por vibrações diferentes cuja distancia, um do outro, nenhuma medida astronômica conseguiria mesurar. Enquanto isso, aqui em baixo, no velho campo santo do Brejo das Almas, ou Francisco Sá, até bem pouco tempo atrás, por coincidência ou obra do destino, seus corpos jaziam, quase numa mesma cova, um ao lado do outro. Foram colocados ali, involuntariamente. Será?

É...

Por vezes, ou quase sempre, nem tudo que está junto na terra significa que esteja também junto no Céu.

E tenho dito!

Enoque Alves Rodrigues, que vive em São Paulo, é brejeiro de nascimento e convicção. Atua há mais de 41 anos na área de Engenharia. É autor do livro “Liderança Conquistada” temática simples sobre otimismo, liderança e motivação, cuja primeira edição já se encontra esgotada. É Colunista, Palestrante Motivacional, Historiador e Divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. 

Se você é Brejeiro e deseja participar da seleção de minhas melhores crônicas que serão inseridas no meu próximo livro “O Brejo das Almas em Crônicas” entre nestes sites e escolha. Ao final envie-me o titulo da crônica pelo e-mail: enoque.rodrigues@ibest.com.br