sábado, 2 de junho de 2012

A FÊNIX BREJEIRA III - MARGOT DO BOTECO


A FÊNIX BREJEIRA III – MARGOT DO BOTECO

Enoque Alves Rodrigues

Na primeira crônica que escrevi na série “A Fênix Brejeira” que teve como personagem principal Manezim Vaqueiro cuja notoriedade obteve da noite para ao lançar-se à lagoa das pedras para salvar uma criança e, ao ser ovacionado pelo gesto, passou um sabão nos riquinhos que não tomaram tal atitude, etc. Conduzido por marmanjos em procissão que o dispensaram na casa de Margot, na verdade, um fétido boteco com ares e fama de inferninho, que se localizava na beira da estrada de quem saia do Francisco Sá ou Brejo das Almas com destino à Salinas e adjacências, etc. É possível que alguns hoje velhinhos que naquele tempo já eram “hominhos” se lembrem daquele “point” onde muitos caminhantes e boiadeiros paravam para descanso e outras diversões. Mas é claro que não tenho aqui a pretensão de que algum conterrâneo se apresente como frequentador de mencionado “site”, ainda que em épocas tão distantes. Pois, eu próprio, só estou tendo a coragem de declarar ter conhecido aquele lugar, “de passagem,” porque naqueles tempos eu era apenas uma criança, sem maldade e sem testosterona. Viram como eu me saí bem? Isto posto vamos à Margot.

Brejeira, digna, esbelta, 50 anos. Tivera, em infância, uma vida farta, quando o pai, Júlio, dono de uma pequena propriedade onde cultivava alho e algodão, culturas em ascensão na época, não deixava que nada faltasse. Muito bonita e cortejada pelos bons partidos do Brejo, nossa beldade estudou nas melhores Escolas de lá, tendo inclusive realizado um périplo por importantes Colégios da bela MOC, de onde retornou com um lindo canudo de Normalista. No Brejo, quando todos pensavam que nossa musa fosse buscar uma Instituição para lecionar, ou se dedicar a carreira para a qual se preparou, ao quadrar o lindo traseiro nos bancos escolares, eis que a deusa se envereda por caminhos que julgava mais fáceis, mas que de fácil mesmo, como ela confirmaria depois, tardiamente, não tinham nada. Quase todas as jovens que são levadas a estes sendeiros o fazem depois de terem passado por alguma desilusão amorosa ou então, por necessidades que não conseguiram, de outra maneira, suprir. A beldade a qual me refiro hoje não se originava de nenhuma destas vertentes. Ou seja, foi, na verdade por mera curiosidade. Gostou, aderiu, agregou. Permaneceu assim, enquanto a Natureza não lhe mandava a fatura. Quando, por fim, o carnê chegou nossa Margot, na verdade, Margarida Maria de Jesus, já se encontrava com a idade de 45 anos e terrivelmente ferrada pelas marcas implacáveis e indeléveis do senhor da razão. O tempo é foda mesmo. Não perdoa ninguém.

Não tendo outras condições até porque não houvera poupado para usufruir de uma velhice amparada, não lhe restou alternativa senão abrir aquele boteco numa afastada região. Em pouco tempo Margot estava no fundo do poço. O negócio não prosperava. A clientela não aparecia. Não tinha filhos. Os parentes de há muito a abandonaram. Ás vezes amanhecia sem ter o que comer. Mas Margot era grande. Margot não se entregava. Ao invés de lamentar, sorria. Não era nenhum sorriso fingido, mas espontâneo, franco  e resplandecente. Ao invés de chorar, cantava. Não era um canto triste, mas alegre. Ao invés de xingar, rezava. Mas ela não rezava da boca pra fora, mas com a fé dos iluminados que acreditam e confiam. Se o corpo, agora trôpego e trêmulo reclamava de cansaço, trabalhava. Mas trabalhava com afinco e dedicação plena de que um dia, tempos melhores viriam. Não, não trabalhava no que você está pensando. Desta profissão houvera de há muito, se aposentado.
Vernúcio, Salineiro, viúvo, fazendeiro, tocava sua boiada juntamente com mais três vaqueiros com destino aos Frigoríficos de Montes Claros. Com sede e fome pararam naquele boteco. Nada havia além de água. 

Os olhares se cruzaram. A paixão foi fulminante. De repente toda aquela beleza da juventude que se achava apenas adormecida lá no interior de nossa beldade, ressurgiu. Uma vez bonita sempre bonita. Aliás, não há ninguém feio. Existem apenas aqueles sofridos que não sabem sorrir. A “conta fechou positivamente por aqueles lados.”  Deu empate. Vernúcio não queria mais sair dali. A todo custo conseguiram convencê-lo de que ele havia saído de Salinas para vender uma boiada em Montes Claros. Seguiu viagem somente depois de Margot lhe prometer que lhe esperaria naquele mesmo prefixo. Naquele mesmo lugar ou se preferir, naquele mesmo “ponto.” E assim foi.

Vernúcio retornou com as burras cheias de gaita. Margot fechou o negócio para sempre. Foi viver com o primeiro marido de toda a sua vida de 50 anos em uma bela fazenda que se localizava quase na entrada de Salinas a qual muitos com certeza conheceram. Trinta e cinco anos depois lá estavam os dois pombinhos “firmes no batente.” Margot Fruía, agora, no ápice da vida, do conforto que todos que a conheceram antes, unânimes, não acreditavam. Ela era grande. Ela era o máximo. Ela deu a volta por cima sem se utilizar de atalhos. Singulares virtudes que somente aqueles, como Margot, que receberam na testa, ao nascer, o carimbo dos bravos e vencedores conseguem atingir.

É...

Por vezes, dizia Platão, na velha Atenas, 347 anos antes do Cara, “não existe barreira intransponível para o ser humano que pensa, luta e acredita.”

Tomou?

E tenho dito!

Enoque Alves Rodrigues, que vive em São Paulo, é brejeiro de nascimento e convicção. Atua há mais de 41 anos na área de Engenharia. É autor do livro “Liderança Conquistada” que já se encontra nas melhores Livrarias do Brasil e pode ser pedido diretamente pelo e-mail: enoque.rodrigues@ibest.com.br  ou pelo telefone da Livraria SN Station, (11) 2221-0703. É Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.

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