terça-feira, 6 de janeiro de 2015

O BREJO E SUA GENTE I - JACINTO SILVEIRA


O BREJO E SUA GENTE I – JACINTO SILVEIRA
 
*Enoque Alves Rodrigues
 
No próximo dia 8 de Janeiro de 2015 o nosso querido Brejo das Almas ou Francisco Sá estará completando 77 anos desde que viu partir rumo ao mundo maior, com quase 67 anos de idade, o seu fundador e principal defensor Jacinto Alves da Silveira, que durante toda a vida travou, no campo de batalha da politica, na maioria das vezes enfrentando inimigos sem rostos, ocultos por falsidades e traições, lutas ferozes que varavam noites, no sentido de ver concretizado o sonho de emancipação politico-administrativa do Brejo das Almas do município de Montes Claros o que ocorreria em 1923/24, para que através deste feito, conforme ele imaginava, o seu povo pudesse usufruir-se de dias melhores e de um futuro menos incerto. Faleceu Jacinto em 1938 depois de ter padecido durante doze longos anos do mal de Parkinson cuja patologia neurológica degenerativa o obrigava a arrastar-se pelas ruas do Brejo até a antiga sede do agora município onde trabalhava arduamente numa demonstração clara e inequívoca de dignidade, retidão de caráter, força e persistência, deixando gravado em letras indeléveis à posteridade os mais sólidos e reais exemplos de vida que se encontram apenas na lide honrada uma vez que somente por este caminho o homem consegue escrever o seu próprio nome nos anais de uma história igualmente digna e longeva.
 
Lutador incansável pelos direitos de seu povo, íntegro, transparente, correto em todas as suas atitudes, honesto até a medula, numa época em que a mosca varejeira já sobrevoava o mundo da política, Jacinto Silveira conduzia os destinos do povo Brejeiro para o porvir, assim como Moisés do Egito o seu povo rumo à Terra Prometida. Jamais perdeu uma eleição. O Brejeiro daqueles tempos sabia reconhecer os valores inalienáveis daquele homem e o tinha como a um verdadeiro Líder. E como tal ele se comportava: respeitador e cerimonioso, de falar pausado, mirava sempre nos olhos do interlocutor e não o interrompia enquanto falava. Firme, convincente e assertivo. Jamais tergiversou ou se utilizou de meias verdades para expressar o seu pensamento. Era homem de posições claras e definidas. Benevolente e despojado, servia a todos com amor sem pedir nada em troca. Disciplinado, sabia ser enérgico sem ser jactante. Muitos foram os Governadores de Estado que utilizaram o prestigio de Jacinto. A palavra dele era uma ordem e nela todo e qualquer Brejeiro acreditava cegamente por que Jacinto a proferia com clareza e nunca deixou de cumpri-la.
 
Jacinto Alves da Silveira foi, até hoje, o único capaz de reunir todos os predicados que habilitam qualquer individuo a afirmar ter vivido a vida em toda a sua plenitude na prática do bem. Descendente de famílias de Ouro Preto, assim como Pena, Oliveira, Dias, Xavier, entre outras, Jacinto, um dos muitos filhos do velho Fazendeiro José Alves da Silveira, nasceu no Brejo, lá pelos idos de 1871, quando o Brejo sequer sonhava em ter as feições de hoje. Assemelhava-se, muito mais, ao longínquo dois de novembro de 1704, quando não passava de uma vasta mata às margens dos rios Verde Grande, São Domingos e Gorutuba, onde Antônio Gonçalves Figueira fincou pela primeira vez, ao lado da Lagoa das Pedras, o imenso cruzeiro que marcaria para sempre, no tempo e no espaço, o inicio de uma nova era. Jacinto, ao contrário de seus outros irmãos que eram todos Fazendeiros, desde a infância, apesar de rústico, já se revelava muito inteligente, quando lia, escrevia e realizava cálculos difíceis até mesmo para quem tinha a mais elevada cultura. Era, desde aqueles tempos, um iluminado, na mais clara e límpida definição do termo.
 
Alto, bigodes aparados e cabelos cortados à escovinha, Jacinto trajava-se sempre de brim-cáqui. Em sua juventude percorria no lombo do cavalo por estradas de chão batido, a longa distância de 270 quilômetros conduzindo grandes manadas de gados de corte que eram vendidas na cidade de Curralinho, hoje, Corinto, situada ao norte de Minas Gerais. Com 24 anos conheceu e casou-se com a normalista Maria Luiza de Araújo, na velha Matriz de Montes Claros, no dia 16 de Novembro de 1895. Maria Luiza foi durante toda a vida, sua fiel e inseparável companheira, a qual foi responsável pela condução dos destinos do povo brejeiro no campo da educação e cultura, enquanto Jacinto preparava esse mesmo povo na política e principalmente para a emancipação administrativa do Brejo. Jacinto foi o primeiro presidente da primeira legislatura municipal brejeira, 1924/1930, que era composta pelos seguintes vereadores: Padre Augusto Prudêncio da Silva, Francisco Fernandes de Oliveira, José Dias Pereira Zeca, João de Deus Dias de Farias e Rogério da Costa Negro, este último, um grande comerciante do ramo de tecidos.
 
Rico, dono de várias fazendas de gado e cultivo, casas comerciais e muitas outras fontes de renda, Jacinto Alves da Silveira, homem que durante toda a existência sempre teve a casa cheia de amigos e correligionários aos quais sempre ajudava com recursos pessoais, sem qualquer interesse ou apego material senão ao simples prazer de servir. Bancava, do próprio bolso, inúmeros candidatos em campanhas eleitorais caríssimas. Depois de ter custeado a emancipação do Brejo das Almas onde, também, doou ao estado prédios de sua propriedade para comporem a Sede Administrativa e o Conjunto Arquitetônico do Município, condição esta indispensável a sua aprovação e homologação, morreu, no entanto, pobre, mas digno e praticamente só, tendo ao seu lado apenas os familiares mais próximos.
 
Não é sem motivo que um de seus filhos, o também Coronel Geraldo Tito Silveira, assim se expressa em um de seus lindos libelos, referindo-se as indiferenças das quais fora vitima o pai: “Nos áureos tempos de sua vida abastada, quando ele plantava as sementes de uma pequena fortuna, depois esbanjada nos ardores da política, feita somente para o bem-estar de outrem, sua casa solarenga vivia repleta de “amigos”. Até então, não se via pela estrada real, que ia dar à Bahia, uma só pousada ou hospedaria, de modo que os forasteiros que por ali passavam procuravam a casa do Coronel Jacinto, onde recebiam todo o conforto, gratuitamente. Muitas dessas pessoas eram acometidas de terríveis pestes inclusive febre brava!”.
 
E arremata o grande escritor do Norte de Minas, Geraldo Tito Silveira, agora lamentando mais uma grande injustiça com a qual brindaram o pai. Aliás, muito já falei sobre tal injustiça que espero um dia, quiçá nessa atual encarnação ver corrigida: “Como corolário da ingratidão dos homens, mudaram o nome de Brejo das Almas, não para perpetuar o nome de Jacinto Silveira, na terra que engrandecera, mas para honrar o nome de outro Brasileiro, Ilustre, é verdade, mas que nada fizera por ela.”. Refere-se ao Doutor Francisco Sá, (1862-1936), nascido na fazenda Brejo de Santo André, que naqueles tempos pertencia ao Município de Grão Mogol e que foi Ministro da Viação e levou a Estrada de Ferro Central do Brasil até Montes Claros, esta sim, muito lhe deve.
 
Servidor nato e dedicado que jamais guardou mágoas ou fugiu à luta, não obstante toda a ingratidão que recebeu, em virtude de seu incondicional amor pelo Brejo e seu povo, se realizassem hoje uma chamada oral convocando homens de bem a colaborarem com qualquer causa que tivesse por objetivo o bem comum, a justiça social, a luta contra as desigualdades dos menos favorecidos, alguém, digno, decente, probo e humano em quem, todos nós pudéssemos nos espelhar, ao gritarem o nome “Jacinto Alves da Silveira!”, com toda certeza ouviríamos, prontamente, em algum lugar do Brasil a voz firme, forte e determinada do coronel e grande Líder Brejeiro:
 
“Presente... Eis-me aqui!”.
 
E tenho dito.
 
*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo das Almas.
 

sábado, 27 de dezembro de 2014

FELIZ ANO NOVO BREJEIROS!


FELIZ ANO NOVO, BREJEIROS!

 

Desejo a todos vocês amigos e conterrâneos de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, um ano de 2015 cheio de muita saúde, paz e incontáveis realizações em suas vidas material e espiritual.

Que todos os seus sonhos se cumpram com muito trabalho, persistência e comprometimento com a moral, ética e retidão de caráter.

Que jamais se enveredem por caminhos aparentemente fáceis, por que na vida nada se consegue sem que seja com muita luta e árdua lide.

Que nunca se esqueçam durante os 365 dias do ano  que iremos começar de que quando se trabalha focado na excelência de resultados, tudo se consegue.

Sinceros votos de muito sucesso e um forte abraço do Brejeiro distante.

FELIZ 2015 hoje, amanhã e sempre!

 

sábado, 13 de dezembro de 2014

FELIZ NATAL, BREJEIROS!!!


FELIZ NATAL, BREJEIROS!

Neste momento quando todas as atenções e expectativas se voltam para os verdadeiros sentidos do renascimento, quero aqui neste espaço que utilizo durante todo o ano desejar a todos vocês, amigos e conterrâneos do Brejo das Almas que sempre me honram com suas visitas os mais sinceros e profundos votos de um Feliz Natal.

Que todos os vossos propósitos possam se concretizar e que a Luz que há mais de dois mil anos veio iluminar o mundo possa se fazer presente em vossos corações em todos os dias do ano e de suas vidas!

FELIZ NATAL, BREJEIROS!!!

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

COISAS DO BREJO - GARAPAS BREJEIRAS I


Coisas do Brejo – Garapas Brejeiras I

*Enoque Alves Rodrigues

Herança de nossos antepassados que aqui se aportaram com suas caravelas, ainda hoje, esporadicamente, aqui e ali, se cultiva no Brasil e principalmente no norte de Minas Gerais, a tradição milenar dos engenhos artesanais que em sua maioria são aqueles cuja moagem é feita mediantes tração animal ou especificamente por algumas cangas de bois quando se quer produzir em grandes escalas melado, rapadura, mascavo, doce, “puxa”, cachaça, etc.

Em meus tempos de menino quaisquer famílias detentoras de um pequeno pedaço de terra se destacavam pelo cultivo da cana de açúcar e a sua posição econômica era medida pelo tamanho do engenho que tinha assim como pela quantidade de cangas, trelas ou parelhas de bois que utilizavam aos seus serviços.

No Brejo das Almas ou Francisco Sá e suas adjacências as moagens se iniciavam lá pelo mês de Julho e se estendiam até o mês de dezembro absorvendo mão de obra excedente e barata que, via de regra, tornava-se obsoleta imediatamente após o término das atividades nos engenhos. Durante a colheita e moagem da cana famílias inteiras se acorriam ás fazendas por que sabiam que em todas elas havia o fator gerador de seus estipêndios com os quais pelo menos durante aquele semestre supririam suas necessidades mais elementares. O “ganhâme” era pouco, mas o trabalho pesado que as mantinham era constante e com isso dava para ir enganando o estômago. Todas as fazendas iniciavam ao mesmo tempo a moagem da cana quando o cantar dolente das moendas em sinfonia perfeita, ecoava pelas quebradas do sertão sem fim. Eu ficava extasiado naquele mundo e me sentia como se os meus pés tocassem o solo de outro planeta.

Mantendo a tradição, o meu avô que possuía um bom pedaço de terra também tinha o seu engenho. Portanto, conheço muito bem essa rotina de perto, pois com ela convivi em infância. Aliás, várias foram as oportunidades em que me referi aos engenhos do meu avô em minhas crônicas e livros. Por que era uma rotina no mínimo curiosa até mesmo para quem “é do meio.”.

No caso particular do meu avô e seu engenho, ao contrário do que muitos possam pensar, os preparativos se iniciavam em Janeiro de cada ano á partir da seleção e treinamento “workshop” dos bois e composição de seus respectivos pares com os quais iriam conviver por longos seis meses. Tinha de existir uma química entre as parelhas e esta química se aferia desde a sintonia dos olhares passando pela arrancada ao mesmo tempo em obediência á ordem do tocador até a manutenção do mesmo ritmo de puxamento á nova ordem de parada ou “break” para um “lanche ou café” dos dignos colaboradores ruminantes, bem como dos humanos que não ruminam, mas também são filhos de Deus e não são de ferro, pois saco vazio não para em pé. Soma-se aos preparativos dos bois ás cangas em madeira leve e macia que o meu avô talhava com toda maestria e carinho para não machuca-los. Relhos e ferrões ou qualquer efeito coercitivo não existiam ali. Todos trabalhavam ordeira e prazerosamente sem imposição alguma por que todos ali tinham conhecimento e consciência plena de suas importâncias e tarefas que coroariam com êxitos a busca obstinada da excelência no final da jornada.

As atribuições hierárquicas desenvolvidas pelos seres humanos dentro de um engenho em plena produção é algo hoje impensável e seguramente difícil de acreditar razão pela qual me poupo de me aprofundar em sua narrativa pela complexidade que incansavelmente já expliquei ou pelo menos tentei explicar em crônicas antiguíssimas e mais recentemente em meu livro “O Brejo das Almas em Crônicas”. Para lhe refrescar um pouco as ideias as atividades interativas (por que em um engenho de verdade não existe ninguém trabalhando só, isoladamente) lembram, e muito, o trabalho de formiguinhas em seus habitat.

Enquanto no canavial um caboclo corta a cana o outro a transporta para o carro de bois onde outro caboclo depois de acomoda-las ordena aos bois para que puxem o carro até o engenho aonde outros bois esperam para triturar a cana convertendo-a em bagaço. Chegando ao engenho outro caboclo (o singular que utilizo é uma mera “licença poética” por que em um grande engenho tudo é superlativo. Tudo é no plural) limpa a cana e leva até as moendas que após moê-las subtrai-lhes, à exaustão, determinado “líquido dos deuses” que ainda em sua fase primitiva recebe o nome nada pomposo de “garapa” o qual, felizmente, ostenta por pouquíssimo tempo ou somente enquanto percorre dentro do cocho a distância entre ás moendas e o tacho de bronze fumegante pelo fogo nos fundilhos. Dali, ela, a garapa, vai passar por várias mutações e metamorfoses de acordo com a determinação do dono do engenho que fica muito difícil imaginar que o produto final no qual resultou tudo aquilo foi garapa algum dia.

É uma caminhada escalonada e progressiva a que a garapa empreende desde que sai da cana e a cada ponto por ela atingido é um produto pronto e acabado. De posse de uma cuia escumadeira ou espumadeira, com a qual se retira a espuma, quem determina o ponto certo e a qual produto o mesmo corresponde é uma cabocla ou caboclo, no meu tempo era cabocla fêmea que recebia o nome de “viradeira de garapa”, em alusão ao vai-e-vem frenético de sua enxada de madeira que revirava a garapa transformando-a em estado sólido sem queimar ou endurecer precocemente o que seria uma perda total da taxada.

O ponto que mais me atraia na taxada e que eu esperava ansiosamente era o segundo ponto. Você sabe qual é o segundo ponto da garapa? Não?

Pois é exatamente o ponto onde a garapa atingiu o estado semissólido que é aquele onde se faz a puxa e os doces antes de ela endurecer o coração nas formas de madeira que a transformam em rapadura que como todos sabem, é doce, mas não é mole. Poderia discorrer longamente sobre ás mil e uma utilidades da cana e seus derivados, bem como nominar cada etapa de seus produtos. Mas fatalmente eu não poderia fazê-lo sem chegar à “mardita” que me reservo o direito de me abster pelo fato de jamais ter ingerido álcool e não vou aqui fazer apologia ou propaganda de algo do qual não sei o gosto. Fazer cachaça eu sei. Beber cachaça, não.

Sinceramente, não sei se em meu Brejo das Almas ainda há engenhos. Se existem é certo que não são como descrevi. É possível que assim como as mutações e metamorfoses pelas quais passam a cana na confecção de seus produtos, os engenhos brejeiros hoje não devem ter o menor resquício do que foram antes. Perderam status. Suas moendas outrora barulhentas emudeceram. Não cantam mais. Gostaria muito que em minha próxima ida ao Brejo das Almas algum local me apresentasse a um engenho para que eu o compare com a imagem do que restou no fundo de minhas reminiscências.

E tenho dito!

*Enoque Alves Rodrigues é Brejeiro de nascimento.

sábado, 1 de novembro de 2014

O BREJO DAS ALMAS E AS SECAS DA MINHA INFÂNCIA


O BREJO DAS ALMAS E AS SECAS DA MINHA INFÂNCIA

*Enoque Alves Rodrigues

O período de escassez de chuvas que atualmente assola grande parte do Brasil onde se destacam por ordem de intensidade os Estados de São Paulo e Minas Gerais me transporta ao querido torrão natal de Brejo das Almas dos meus tempos de menino, quando, munidos de garrafas com água e guiados por dona Lú (Maria de Lurdes), saiamos da Vila Vieira, antiga Lagoa, em novenas intermináveis onde, depois de passarmos pelo Centro do Brejo e largo da Matriz, seguíamos em direção ao morro da Caixa D’agua onde depositávamos aquelas garrafas contendo o mais precioso líquido juntamente com as nossas esperanças de que a entidade responsável pela torneira que faz chover nos atenderia. Quanto mais o Homem lá de cima aquecia o seu maçarico mais nós rezávamos aqui em baixo. Tempos difíceis àqueles onde o sol não dava tréguas ardendo sem dó e piedade no lombo do caboclo.

Graciliano Ramos dizia que as secas se diferem uma da outra apenas pela sua duração por que todas as secas são iguais por afetar diretamente o que o sertanejo tem de mais sagrado: a roça, o sustento e a dignidade.

A seca que estamos vivendo nos dias atuais em Minas e em São Paulo além de ser uma das mais longas em quase 80 anos é sem duvida alguma a mais grave e prejudicial por que afeta todos os setores da economia, impactando, invariavelmente, na conta de todos que além de ter de conviver com a falta d’agua para suprir necessidades básicas de sobrevivência terá de arcar com os aumentos escorchantes dos produtos que certamente irão reduzir o feijão na mesa do pobre e a água que o rico esbanjava lavando seus carrões. Foi-se o tempo em que as secas as quais se referia Graciliano castigava só o sertanejo. Naquela época o homem nascia, vivia e morria no campo onde produzia safras que consumia e vendia o seu excedente aos pequenos e grandes centros urbanos. Hoje não. Com o êxodo rural que aos poucos foi tirando o homem do campo devido á absoluta falta de oportunidades de lá seguir produzindo, empurrou-o para a cidade com a cabeça cheia de esperança de dias melhores que na maioria das vezes não passa de uma vã ilusão ou utopia, pois as barreiras com as quais o sertanejo que não foi preparado para viver na cidade terá de enfrentar superarão, e muito, as que dificuldades que ele, outrora, galhardamente driblava no cultivo da terra seca.

Não entrarei no mérito da crise do desabastecimento de água de São Paulo ou do nível do Cantareira. Vivo em São Paulo, mas sequer sei onde fica essa joça. Isso, no entanto pouco importa. O que importa é que independente da gravidade destas estiagens faltou gestão e sobrou incompetência do Governo. Faltou consciência e sobrou desperdício do povo. Mas, nem mesmo isso me interessa já que não escrevo sobre São Paulo.

Voltando para o meu Brejo das Almas, vejo o esforço hercúleo que as autoridades estão fazendo para amenizar o impacto desta terrível seca na vida de seus cidadãos munícipes. Os rios principais que banham a cidade de Francisco Sá estão minguando. Queira Deus não desapareçam completamente. Córregos que antes corriam o ano todo agora estão secos. Há partes que sequer se consegue acreditar ter existido água algum dia. Lagoas e Brejos que dão nome ao meu rincão querido se esturricaram há muitíssimo tempo.

Materialmente diríamos que a situação é desesperadora e que beira a calamidade não fosse à fé que ainda temos na Providencia Divina. Quando as ações humanas não tem muito que fazer, ou avançar, a alternativa mais sensata que se tem além de seguir lutando com todas as forças, é contar com a ajuda de Deus que a ninguém despreza e no final acaba sempre fazendo o melhor, contemplando-nos com a graça das sonhadas chuvas. Isso já ocorreu com as novenas de Maria de Lurdes que narrei em uma de minhas crônicas antigas.

Sejamos perseverantes em nossos melhores propósitos, confiando, primeiro em Deus e depois naqueles que tem ás mãos os destinos do nosso Brejo das Almas. Teremos muito em breve água farta. É questão de tempo.

Enquanto isto não acontece, retorno-me, em sonhos, á minha infância Brejeira e vou solvendo, lentamente, os momentos felizes onde vejo ás enchentes do rio São Domingos com suas águas barrentas que, qual avalanche, traz em seu leito, serra abaixo, troncos e toras, peixes e sapos que dispensa, violentamente, no rio verde grande. Ao norte da minha cidade vejo na elegância dos seus bancos de areia o rio Gorutuba onde aproveito para descansar. Ainda ao norte correm piscosos os córregos do carrapato, sitio novo, ribeirão de cana brava, o córrego do pau preto, do brejão, mamonas, traçadal e do quem-quem. Já ao sul da “beldade do norte de Minas” onde nasci, observo caudalosos, rio boa vista, vaca brava, córrego dos patos, rio caititu (olha o capitão Enéas ai, gente!), o rio da prata e o córrego rico. Vejo ainda no caminho de Salinas a lagoa da barra. E o que dizer da lagoa das pedras e seus encantos?

Que tristeza que tudo isso não passa de um sonho. Que alegria por a seca ainda não me ter roubado o dom de sonhar. Quanta decepção ao acordar e constatar que o meu sonho não é uma realidade. Quão incomensurável é a minha felicidade em saber que os meus olhos um dia presenciaram tão maravilhosos acontecimentos. Pena que as minhas retinas de menino não “reteram” tudo aquilo. Via com naturalidade o infinito na finitude das coisas e tempos e imaginava que aquelas belezas jamais se acabariam.

Eu era feliz e não sabia!

E tenho dito.

*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo das Almas.


segunda-feira, 20 de outubro de 2014

CARTA AO POVO BRASILEIRO - UMA SEMANA PARA VOCÊ DECIDIR


CARTA AO POVO BRASILEIRO – UMA SEMANA PARA VOCÊ REFLETIR
*Enoque Alves Rodrigues
Apenas uma semana nos separa do grande pleito eleitoral onde teremos a oportunidade de escolher, livre e espontaneamente, quem irá presidir o nosso Brasil durante os próximos quatro anos.
Estaremos, no próximo domingo, 26/10/2014, assinando uma procuração, entregando-a a quem caberá zelar pela nossa soberania e estabilidade socioeconômica. Ninguém sai por aí contratando seu defensor sem antes ter tido o cuidado de conhecer-lhe, de antemão, em que apito toca.
Assim sendo, é muito importante que antes façamos algumas reflexões, por pequenas que sejam mergulhando-nos ao fundo de nossa consciência para que, desnudados de todo e qualquer fanatismo ou hipocrisia possamos exercer, responsável e tranquilamente, o sagrado direito de escolha. É próprio das democracias desenvolvidas ou em desenvolvimento como a nossa, o respeito ás individualidades de cada um desde que assumam suas próprias consequências e não ponham em riscos os interesses da maioria.
No entanto, quando falamos de uma eleição onde se disputam o cargo máximo do Brasil, pródiga em ataques pessoais e paupérrima em propostas de governo por que a candidata da situação em seu desespero da derrota iminente insiste nesta conduta a fim de nos ludibriar como se tontos fôssemos, é de salutar importância alertar para os danos irreversíveis que apenas um voto, de um só eleitor, poderá causar a toda uma coletividade. É por isso que necessário se faz refletirmos para não darmos um passo em falso e ai, meu nego, não tem mais jeito a não ser chorar na pia por mais quatro longos anos de tristeza, desilusão, muito trabalho e pouco feijão na panela.
Como sabemos que a vida é feita de comparações e que não há como se fazer isso sem dois pontos de referências, quero aqui, a guisa de colaboração modesta, tecer-lhes alguns comentários, para, quem sabe, te ajudar no grande momento do voto. Mesmo que você não faça parte dos 6% de indecisos que ainda restam, ou mesmo que você já tenha escolhido o seu candidato, esta reflexão lhe será útil.
Sempre militei na iniciativa privada, no campo da engenharia. Jamais havia tido, até o ano de 1980 qualquer envolvimento com temas políticos, quando um jovem de barbas, com língua curta, que ainda falava “menas” ao invés de “menos”, que tinha o poder de arregimentar exércitos de trabalhadores em torno de suas ideias utópicas, não obstante não ter ele qualquer identificação com essa categoria por que jamais trabalhou duro na vida, paralisava o Brasil ditatorial com greves intermináveis. Bafejado pelos desejos de mudanças entranhados nos recônditos de todo e qualquer jovem, deixei-me levar, propositadamente, - pois eu sempre soube o momento certo de entrar e sair - e quando menos esperava lá estava eu em meu descanso semanal remunerado (domingo), no estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, debaixo de uma tenda, onde vendia, sem auferir-me de um centavo sequer, os livros do Lula enquanto o próprio juntamente com os seus mais próximos discursava para uma plateia inflamada e sedenta de um futuro melhor. Ali nascia o PT ao qual jamais me filiei por que como eu disse sempre soube quando entrar e sair. Um ano de convivência e observação me foi suficiente para prever no que ia dar tudo aquilo.
Desnecessário seria me alongar nos quesitos desmandos, corrupções, autoritarismos, insolências, nepotismos, enriquecimentos ilícitos inclusive do jovem barbudo, arrogância e empáfia em detrimento da classe trabalhadora e dos menos favorecidos em nome dos quais eles, do PT tanto falam até hoje. Aliás, como trabalhador incansável que sou, tenho vergonha de saber que este partido, em cuja guarida, respira o que há de mais condenável e nefasto na politica brasileira, ostente em seu frontispício a denominação “trabalhadores”.
Dilma, não obstante sua história de perseguida da ditadura teve nestes quatro anos, sua grande oportunidade de fazer um governo com politicas realmente consistentes e voltadas para as resoluções dos problemas que afetam o Brasil. Mas para isto ela teria de ter se dissociado de seu criador. No entanto, como boa petista, preferiu o caminho mais simples da zona de conforto junto aos seus companheiros mesmo sabendo estar contrariando a vontade da maioria dos cidadãos de bem e até mesmo diante do recado que lhe foi dado diretamente pelo eco das ruas em Junho-2013, manteve-se acomodada, confiante numa blindagem de araque de seu padrinho (que já não tem mais tanta bala na agulha assim), que lhe garantiria a vitória folgada nestas eleições que, se Deus quiser, não passará nem perto da maioria dos sufrágios necessários, maioria esta que ela esnobou e desprezou.
Por outro lado temos o Aécio, uma força jovem comprometida com o que existe de mais puro, integro, sólido e exequível. Forjado do mais puro aço das alterosas, de onde se originam Tancredo e Juscelino, não traz consigo o açodamento natural dos jovens, mas a tranquilidade do nosso matutar mineiro antes de proferir qualquer palavra que venha gerar falsas expectativas. É comprometido com todas as causas sociais em todas as suas magnitudes, e tem arraigado dentro de si, o desejo inquestionável de dar o melhor para o seu povo. Testado e aprovado em sua honradez e desprendimento, não nos restam dúvidas de que o momento atual pertence ao Aécio. Pertence a nós. Pertence ao Brasil.
Sou mineiro, mas vivo em São Paulo há muito tempo. Portanto, não conhecia o Aécio. Apenas sabia ser ele neto de Tancredo, de ter sido um governador probo do estado onde nasci deputado e senador de expressões robustas. Passei a conhecê-lo ao saber de sua pretensão em se candidatar à Presidência da República. Fiz o que todo e qualquer cidadão consciente deveria fazer: mineiramente escarafunchei a sua vida desde o nascedouro até os dias atuais. Com esse embasamento me vejo na condição favorável de afirmar aos que me leem há mais de trinta anos que não tenham dúvidas de que as soluções para os problemas do Brasil que se agravaram durante estes doze anos de PT exigem ações rápidas e eficazes. Somente Aécio está preparado para toma-las. Aécio possui a lisura, independência, vontade de fazer, coragem e, como falamos lá em Minas, cabelo no peito para enfrentar com destemor ás forças contrárias as mudanças em favor do Brasil e de sua gente. Aécio é humilde, comedido e pacificador e saberá conquistar com sua peculiar simpatia, os homens de boa vontade e inteligência em prol do Brasil. Conduzirá o seu povo por caminhos seguros, como fez Moisés no deserto, rumo à terra prometida onde realmente jorra o leite e o mel. Por que, até aqui, a nossa terra, graças aos seus vendilhões, só tem jorrado para nós o amargo sabor do fel.
O resto é conversa mole do PT para nos enganar mais uma vez ou se preferir: “tertúlias flácidas para dormitar bovinos.”.
E tenho dito.
*O autor é Brasileiro, nasceu no Brejo das Almas e trabalha há 42 anos em Engenharia.
 

sábado, 27 de setembro de 2014

FIGUEIRA E O BREJO DAS ALMAS

Figueira e o Brejo das Almas

*Enoque Alves Rodrigues

Quando no dia 30 de Outubro de 1672 o Sertanista Antonio Gonçalves Figueira, Paulista nascido em Santos, filho de Maria Gonçalves Figueira e de Manoel Afonso Gaia fez sua primeira viagem integrando a expedição das esmeraldas liderada por Fernão Dias Paes e Borba Gato rumo ao norte de Minas Gerais, aquela localidade nada mais era senão um amontoado de matas virgens onde apenas índios e a pintada reinavam. Figueira tinha fama de grande caçador e quando saia à caça jamais voltava de mãos abanando.

Nesta sua primeira viagem em uma expedição a qual ficaria eternamente gravada nos anais da história em consequência de vários e insólitos episódios o grande Antonio Gonçalves Figueira, nada mais era senão um simples ajudante de ordens de seu cunhado Matias Cardoso de Almeida, Tenente naquela expedição. As atribuições de um ajudante de ordens daqueles tempos se restringiam a preparar as montarias para mais graduados montarem além de se responsabilizar pelos suprimentos da tropa incluindo ai as caçadas com as quais a alimentava bem como da cozinha onde preparava o rango da moçada.

Esta primeira expedição serviu-lhe muito mais como experiência do que não deveria fazer caso fosse o desejo lograr êxito na busca das esmeraldas e outras pedras preciosas por que ao contrário do que lhe ocorria quando saia à caça voltou de mãos abanando por que nenhuma pedrinha sequer conseguira colher. Na volúpia em busca das verdinhas o Bandeirante Fernão desembestou-se pelos lados da Bahia enquanto que Figueira, seu cunhado Matias Cardoso retornaram a São Paulo para reestudarem novas tentativas que de fato viriam a efeito nos anos de 1.694 e 1698, quando, finalmente definiram um rumo certo: o norte de Minas Gerais ou especificamente em Itacambira ou mais especificamente ainda na Lagoa Vapabuçú onde segundo davam conta às más línguas o próprio Fernão, assim como havia passado e colhido algumas pedras assim como muito antes haviam feito Sebastião Tourinho e Antonio Dias Adorno.

Só que também desta vez o trem não deu nada certo para eles por que na tal Jaíba coberta por matas densas e fechadas bem como por vegetações rasteiras idênticas rodeadas, pra variar, pelos montes claros que mais se pareciam com as torres gêmeas de tão iguais que eram acabaram por desorienta-los por que por mais que andassem acabavam saindo sempre no mesmo lugar. Aborrecidos e extremamente desapontados depois de darem sete voltas retornando sempre ao mesmo ponto de partida (hoje essa localidade se chama sete passagens), acabaram por abandonar a expedição das esmeraldas a qual ainda permaneceu por ali durante sete anos, tendo cada qual formado sua pequena expedição sendo que a do Figueira composta por 1000 homens ganhou os rumos do rio verde grande onde se acampou e a expedição de seu cunhado Matias retornou á São Paulo margeando o rio grande passando por Miguelópolis até chegar ao vale do Paraíba do Sul onde conseguiram umas pedrinhas chinfrins, mas reluzentes.

As coisas não estavam boas para os lados de Figueira. De Santos chegou-lhe a notícia levada que foi por um mensageiro no lombo de um burro que sua mãe havia morrido. Ele, perdido naquela vasta região do norte de Minas não havia até então conseguido nada de mais significativo senão vários bornais de pedras que imaginava tratar-se de turmalina, um parente meio próximo da esmeralda. Havia ouro sim, metal preciosíssimo que ele não muito interessado colhia. Os patacões saltavam-se das entranhas da terra qual mamona estalando em nosso agreste calorento. A fome do ouro com o qual saciavam a fome do maldito El Rei de Portugal já havia ainda não havia passado, mas a moda agora era mais para as esmeraldas e turmalinas. Por isto fazendo couro á imensa expedição de Fernão Dias Paes Leme a de Figueira se denominava esmeraldinha.

Antonio Gonçalves Figueira acabou dono de uma vasta faixa de terras subdividida em várias fazendas denominadas de Jaíba, Olhos D’água e Colônia dos Montes Claros. Foi com a intenção de unir os Montes Claros á região do rio Gorotuba e de lá até a Bahia, que ele aos treze dias do mês de outubro de 1704 organizou uma diminuta expedição composta de apenas vinte homens partindo em direção ao nordeste quando depois de percorrer vários dias entre idas e vindas ou mais vindas que idas porque seguia se perdendo e voltando sempre ao mesmo lugar, caindo e se levantando, na histórica tarde do dia 2 de novembro daquele mesmo ano sem mais nem menos, inesperadamente, viu-se na barriga da serra do catuni, ao lado de uma linda mais singela lagoa que desaguava em um riacho com nascentes naquela mesma serra, cuja lagoa se denominava "das pedras" que ao contrário do que ele pensava e buscava, não eram preciosas, mas pedra mesmo.

Por ser já tarde, dormiu por lá onde também por ser dia de finados acabou por fincar um cruzeiro de madeira tosca ao pé do qual ele juntamente com os seus vinte comandados rezou e que batizaram de "Cruz das Almas das Caatingas do Rio Verde", onde algum tempo depois construíram uma pequenina Igreja onde depositaram a imagem de São Gonçalo que veio se tornar patrono do lugar. E o resto da história todos conhece. É de domínio público.

O Capitão Antonio Gonçalves Figueira (outros historiadores utilizam "Figueiras") não era, efetivamente, o que podia se denominar de um destemido e inteligente Bandeirante, mas, convenhamos, justiça lhe seja feita, não fossem suas trapalhadas, seus perdidos, sua falta de foco e ausência total de bússola, jamais teria chegado um dia ao meu, ao nosso e ao seu Brejo das Almas querido. Quiçá, tivesse realizado outras descobertas em outras plagas lá pelos lados da não menos querida Bahia. Mas, quis Deus que ele não fosse tão longe e assim conseguiu, mesmo sem querer, querendo, dando-nos de presente o Brejo das Almas, ou Francisco Sá, "beldade do norte de Minas", que hoje cresce a cada dia, sonhando, feliz, a cada despertar, com a aproximação do dia em que real e definitivamente se cumpra mais um vaticínio daquele "Bandeirante trapalhão" quando disse que o lugarejo se tornaria um comércio próspero, não só pela sua posição geográfica, como também pelas riquezas naturais de suas terras.

Que Deus o ouça.

E tenho dito!

*O autor nasceu no Brejo das Almas