O BREJO E SUA GENTE I – JACINTO SILVEIRA
*Enoque Alves Rodrigues
No próximo dia 8 de Janeiro de 2015 o nosso querido
Brejo das Almas ou Francisco Sá estará completando 77 anos desde que viu partir
rumo ao mundo maior, com quase 67 anos de idade, o seu fundador e principal
defensor Jacinto Alves da Silveira, que
durante toda a vida travou, no campo de batalha da politica, na maioria das
vezes enfrentando inimigos sem rostos, ocultos por falsidades e traições, lutas
ferozes que varavam noites, no sentido de ver concretizado o sonho de
emancipação politico-administrativa do Brejo das Almas do município de Montes
Claros o que ocorreria em 1923/24, para que através deste feito, conforme ele
imaginava, o seu povo pudesse usufruir-se de dias melhores e de um futuro menos
incerto. Faleceu Jacinto em 1938 depois de ter padecido durante doze longos anos
do mal de Parkinson cuja patologia neurológica degenerativa o obrigava a
arrastar-se pelas ruas do Brejo até a antiga sede do agora município onde trabalhava
arduamente numa demonstração clara e inequívoca de dignidade, retidão de
caráter, força e persistência, deixando gravado em letras indeléveis à
posteridade os mais sólidos e reais exemplos de vida que se encontram apenas na
lide honrada uma vez que somente por este caminho o homem consegue escrever o
seu próprio nome nos anais de uma história igualmente digna e longeva.
Lutador incansável pelos direitos de seu povo,
íntegro, transparente, correto em todas as suas atitudes, honesto até a medula,
numa época em que a mosca varejeira já sobrevoava o mundo da política, Jacinto
Silveira conduzia os destinos do povo Brejeiro para o porvir, assim como Moisés
do Egito o seu povo rumo à Terra Prometida. Jamais perdeu uma eleição. O
Brejeiro daqueles tempos sabia reconhecer os valores inalienáveis daquele homem
e o tinha como a um verdadeiro Líder. E como tal ele se comportava: respeitador
e cerimonioso, de falar pausado, mirava sempre nos olhos do interlocutor e não
o interrompia enquanto falava. Firme, convincente e assertivo. Jamais
tergiversou ou se utilizou de meias verdades para expressar o seu pensamento.
Era homem de posições claras e definidas. Benevolente e despojado, servia a
todos com amor sem pedir nada em troca. Disciplinado, sabia ser enérgico sem
ser jactante. Muitos foram os Governadores de Estado que utilizaram o prestigio
de Jacinto. A palavra dele era uma ordem e nela todo e qualquer Brejeiro
acreditava cegamente por que Jacinto a proferia com clareza e nunca deixou de
cumpri-la.
Jacinto Alves da Silveira foi, até hoje, o único
capaz de reunir todos os predicados que habilitam qualquer individuo a afirmar
ter vivido a vida em toda a sua plenitude na prática do bem. Descendente de famílias
de Ouro Preto, assim como Pena, Oliveira, Dias, Xavier, entre outras, Jacinto,
um dos muitos filhos do velho Fazendeiro José Alves da Silveira, nasceu no
Brejo, lá pelos idos de 1871, quando o Brejo sequer sonhava em ter as feições
de hoje. Assemelhava-se, muito mais, ao longínquo dois de novembro de 1704,
quando não passava de uma vasta mata às margens dos rios Verde Grande, São
Domingos e Gorutuba, onde Antônio Gonçalves Figueira fincou pela primeira vez,
ao lado da Lagoa das Pedras, o imenso cruzeiro que marcaria para sempre, no
tempo e no espaço, o inicio de uma nova era. Jacinto, ao contrário de seus
outros irmãos que eram todos Fazendeiros, desde a infância, apesar de rústico,
já se revelava muito inteligente, quando lia, escrevia e realizava cálculos
difíceis até mesmo para quem tinha a mais elevada cultura. Era, desde aqueles
tempos, um iluminado, na mais clara e límpida definição do termo.
Alto, bigodes aparados e cabelos cortados à
escovinha, Jacinto trajava-se sempre de brim-cáqui. Em sua juventude percorria
no lombo do cavalo por estradas de chão batido, a longa distância de 270
quilômetros conduzindo grandes manadas de gados de corte que eram vendidas na
cidade de Curralinho, hoje, Corinto, situada ao norte de Minas Gerais. Com 24
anos conheceu e casou-se com a normalista Maria Luiza de Araújo, na velha
Matriz de Montes Claros, no dia 16 de Novembro de 1895. Maria Luiza foi durante
toda a vida, sua fiel e inseparável companheira, a qual foi responsável pela
condução dos destinos do povo brejeiro no campo da educação e cultura, enquanto
Jacinto preparava esse mesmo povo na política e principalmente para a emancipação
administrativa do Brejo. Jacinto foi o primeiro presidente da primeira
legislatura municipal brejeira, 1924/1930, que era composta pelos seguintes
vereadores: Padre Augusto Prudêncio da Silva, Francisco Fernandes de Oliveira,
José Dias Pereira Zeca, João de Deus Dias de Farias e Rogério da Costa Negro,
este último, um grande comerciante do ramo de tecidos.
Rico, dono de várias fazendas de gado e cultivo,
casas comerciais e muitas outras fontes de renda, Jacinto Alves da Silveira, homem que durante toda a existência
sempre teve a casa cheia de amigos e correligionários aos quais sempre ajudava com
recursos pessoais, sem qualquer interesse ou apego material senão ao simples
prazer de servir. Bancava, do próprio bolso, inúmeros candidatos em campanhas
eleitorais caríssimas. Depois de ter custeado a emancipação do Brejo das Almas
onde, também, doou ao estado prédios de sua propriedade para comporem a Sede
Administrativa e o Conjunto Arquitetônico do Município, condição esta
indispensável a sua aprovação e homologação, morreu, no entanto, pobre, mas
digno e praticamente só, tendo ao seu lado apenas os familiares mais próximos.
Não é sem motivo que um de seus filhos, o também
Coronel Geraldo Tito Silveira, assim se expressa em um de seus lindos libelos,
referindo-se as indiferenças das quais fora vitima o pai: “Nos áureos tempos de sua vida abastada,
quando ele plantava as sementes de uma pequena fortuna, depois esbanjada nos
ardores da política, feita somente para o bem-estar de outrem, sua casa
solarenga vivia repleta de “amigos”. Até então, não se via pela estrada real,
que ia dar à Bahia, uma só pousada ou hospedaria, de modo que os forasteiros
que por ali passavam procuravam a casa do Coronel Jacinto, onde recebiam todo o
conforto, gratuitamente. Muitas dessas pessoas eram acometidas de terríveis
pestes inclusive febre brava!”.
E arremata o grande
escritor do Norte de Minas, Geraldo Tito Silveira, agora lamentando mais uma
grande injustiça com a qual brindaram o pai. Aliás, muito já falei sobre tal
injustiça que espero um dia, quiçá nessa atual encarnação ver corrigida: “Como corolário da ingratidão dos
homens, mudaram o nome de Brejo das Almas, não para perpetuar o nome de Jacinto
Silveira, na terra que engrandecera, mas para honrar o nome de outro
Brasileiro, Ilustre, é verdade, mas que nada fizera por ela.”. Refere-se
ao Doutor Francisco Sá, (1862-1936), nascido na fazenda Brejo de Santo André,
que naqueles tempos pertencia ao Município de Grão Mogol e que foi Ministro da
Viação e levou a Estrada de Ferro Central do Brasil até Montes Claros, esta
sim, muito lhe deve.
Servidor nato e dedicado que jamais guardou mágoas
ou fugiu à luta, não obstante toda a ingratidão que recebeu, em virtude de seu
incondicional amor pelo Brejo e seu povo, se realizassem hoje uma “chamada oral” convocando
homens de bem a colaborarem com qualquer causa que tivesse por objetivo o bem
comum, a justiça social, a luta contra as desigualdades dos menos favorecidos,
alguém, digno, decente, probo e humano em quem, todos nós pudéssemos nos
espelhar, ao gritarem o nome “Jacinto Alves da Silveira!”, com toda certeza ouviríamos,
prontamente, em algum lugar do Brasil a voz firme, forte e determinada do coronel
e grande Líder Brejeiro:
“Presente... Eis-me aqui!”.
E tenho dito.
*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo das Almas.