domingo, 5 de abril de 2015

O BREJO E SUA GENTE IV - ARTHUR JARDIM


O BREJO E SUA GENTE IV – ARTHUR JARDIM

*Enoque Alves Rodrigues

Em 24/08/1949, quando Feliciano Oliveira, Prefeito de Francisco Sá, inaugurava o serviço permanente de luz elétrica fornecida pela Usina Santa Marta, a mesma que abastecia Montes Claros, poucos se lembravam de que a iniciativa daquele grande feito que agora se concretizava havia se iniciado, na verdade, dez anos antes, ou precisamente em 30/11/1939, ainda que de maneira precária, na gestão do grande Brasileiro nascido no ano de 1897, em Conselheiro Lafaiete, norte de Minas, de nome Arthur Jardim de Castro Gomes, ou melhor, Doutor, sim, ele era Doutor, não por ter sido o grande engenheiro que foi o que para nós já seria uma grande honra, mas, principalmente por sua inteligência, caráter, competência, e integridade inquestionáveis em todos os postos que ocupou. Talvez a pobreza de dados que atualmente se encontram disponíveis sobre o Doutor Arthur Jardim de Castro Gomes se justifica pela inexistência de réguas capazes de dimensiona-lo integralmente, em toda a sua magnitude. Sabemos que nem sempre a história é pródiga ou justa para com os grandes vultos que efetivamente a souberam escrever, quase sempre com letras de sangue, por que eles existiram em uma época em que tudo era mais difícil e muitas vezes para levar adiante os seus projetos tiveram de “tirar leite de pedra”, além de se sacrificar ao extremo em prol do ideal de realizar o seu melhor para assim minorar o sofrimento dos mais carentes.

O Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes que também foi Prefeito da cidade de Corinto tornou-se Prefeito de Francisco Sá de 1938 á 1942, no período intervencionista, em substituição ao Dr. João Bawden Teixeira que morreu repentinamente. Em sua bem-sucedida administração frente à Prefeitura Brejeira a cidade que ainda chorava seu líder recentemente desaparecido (08/01/1938) se transformou em um verdadeiro canteiro de obras. O arrojado Plano Diretor que o Prefeito Dr. Arthur Jardim escreveria de próprio punho para por em prática no primeiro ano de seu mandato, contemplou todas as áreas vinculadas direta ou indiretamente ao desenvolvimento urbano do sofrido Município de maneira que ao chegar ao final de sua gestão quase nada restava por fazer do que havia planejado. Em seu relatório, a guisa de prestação de contas, que ele escreveu e enviou ao então Governador do Estado de Minas, Benedito Valadares, em dezembro de 1942, deixa claro em linguagem simples e objetiva que soube dignificar o cargo que lhe fora confiado com grandes e incalculáveis realizações em beneficio da cidade e de seus munícipes, que lhe propiciavam á consciência tranquila do dever cumprido.

Enumerar as realizações do Dr. Arthur Jardim na Prefeitura do Brejo significa correr riscos de omissão. Fez tanto que ainda hoje permanecem inabaláveis os pilares de sua administração. Da radical mudança topográfica do antigo traçado das ruas brejeiras com aterramentos colossais que sepultavam o feio fazendo brotar o bonito, escavações que punham abaixo montanhas de terra que durante anos desafiaram cabeças geniais, terraplenagens extensas e nivelamentos abismais que colocavam cara a cara em condição de igualdade o aclive íngreme com o declive, empedramentos, prédios, jardins, barragens, criou bairros e distritos, etc.

O Prefeitão Arthur Jardim abusava de suas multifaces qualidades na cavernosa arte de “engenhar”. Grande parte dos projetos que executou quando se achava na Prefeitura do Brejo foram produzidos por ele. Saíram de sua prancheta e ganharam formas pelo seu nanquim. Ele mesmo os fazia e ainda corria para executa-los. Também, pudera. O cara era tudo na engenharia. Ele era engenheiro topógrafo, engenheiro civil e eletricista, engenheiro rural, engenheiro paisagístico e engenheiro urbano. Para o Brejo das Almas daqueles tempos, então, o Dr. Arthur Jardim não poderia ter vindo em hora mais oportuna.  Ele era também escritor, conferencista, jornalista e articulista de vários jornais entre eles, “Gazeta do Norte”, “Gazeta do Lavrador” e “Diário da Noite”, entre outros.

Membro da Maçonaria onde praticava fervorosamente seu amor e devoção por todos. Intelectual acadêmico, tendo ocupado a cadeira de nº 26 da Academia Montesclarense de Letras, é também naquele egrégio templo do saber patrono da cadeira de nº 14 ocupada com humildade, sapiência e galhardia pela escritora e professora Karla Celene Campos. O Dr. Arthur Jardim foi também funcionário graduado de instituições de renome e projeção nacional como Estrada de Ferro Central do Brasil, Departamento de Estradas e Rodagens, Departamento de Águas e Esgotos de Minas Gerais, etc.

Fez todos os seus estudos, do primário á Escola Superior de Engenharia em Belo Horizonte. Foram seus pais José Henrique de Castro Gomes e dona Celestina Jardim de Castro Gomes.

Mesmo não sendo o Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes, Brejeiro de nascimento, conhecia o brejo como ninguém ao ponto de escrever a mais bela e completa monografia onde discorre com riqueza de pormenores nossa região como a fauna com suas variadas espécies de animais domésticos que vivem no Município de Francisco Sá, que em sua maioria se constituem das mais comuns em varias partes do Brasil. Aves e pássaros selvagens característicos da região, canoros e de belas plumagens. Dentre eles o sofrê, o corricho, o canarinho amarelo e o pardo, o pintassilgo, a patativa, o bicudo, o curió, o pássaro preto de três espécies, o cardeal e a brabeza e mais seis espécies de beija-flores. Há também as pombinhas verdadeiras e amargosas, a juriti, a inhambu, a zabelê, o sabiá, o tico-tico, o bem-te-vi, a codorna, o quem-quem, os anuns pretos e brancos, as rolinhas pedrês e parda, o João congo, o João de barro, e muitos outros. Com relação às aves de rapina, catalogou varias espécies de gaviões de penacho e o carcará. Em se tratando dos animais selvagens mencionou a suçuarana, a lombo-preto, e em algumas regiões o tigre, a anta, os gatos maracajá e marisco, a raposa, o caititu, o queixada, os tamanduás, os tatus pebas e bola, a paca, os veados, os coelhos, as cutias, o guaxo, os preás e a jaratataca. Quanto a serpentes, a maior mesmo é a jiboia, a caninana, a jararacuçu, a cipó, a cascavel, a coral, a jararaca e outras mais. No tocante as variedades de peixes são muitas, a começar pelo grande surubi do rio verde grande, o dourado, as curumbatás, as traíras, o piau e, ainda no rio verde e várias lagoas, os grandes jacarés, as ferozes piranhas, os mandis, etc.

Referindo-se á flora o Dr. Arthur Jardim nos diz ser quase toda constituída de CAMPOS – Limpos, Cerrados e Gerais. CAATINGAS – Altas, de vazantes, baixas e médias. CATANDUVAS – Altas e Baixas. Informa que nas Catanduvas encontram-se o Pau de óleo, garapa, potumujú, ipê, catinga de porco, e outras mais. Já nos cerrados o pau terra, o vinhático, a cagaiteira, a samambaia, o tingui, a caraíba, o angico e outros, quanto às serras que rodeiam o nosso município destacou todas elas de acordo com suas grandezas como a Serra do Catuni, um planalto que desce bruscamente, na vertente ocidental, que é a do Verde Grande, de 900 – 1000 metros de altitude média, 700 – 650 na base da elevação, etc. Falou da orografia á composição do solo e subsolo brejeiro que segundo os seus estudos geotécnicos avançadíssimos para a época, são compostos de várias camadas entre elas a de argila, calcário, lajedos, xistos, cascalho, quartzo, entre outras. Sobre a hidrografia do Brejo das Almas o Dr. Arthur informava ser ela pobre tendo em vista que a maioria dos rios e córregos que banham o Município é feita de rios temporários, ou seja, aqueles que só existem no período das chuvas tendo destacado como principais permanentes naqueles tempos hoje nem tanto, o Verde Grande, o São Domingos, e o Gorutuba, etc.

O Doutor Arthur Jardim utilizou em beneficio de Francisco Sá grande parte de seus conhecimentos topográficos, pois com desprendimento e generosidade que somente os que atingiram elevados níveis de grandeza são capazes, graças ao seu amor incondicional pelo Brejo, colocou o nosso município no mapa do mundo ao embrenhar-se em suas entranhas de matas fechadas de difícil acesso, tendo convivido durante trinta dias com todo tipo de obstáculos, onde o caboclo lhe transmitia em dialeto nativo seus usos e costumes e outras preciosidades roceiras que viriam ilustrar o seu rico libelo monógrafo, tendo de lá retornado somente depois de concluir os estudos das linhas imaginárias e seus paralelos, meridianos, latitudes e longitudes que definiriam com exatidão as coordenadas geográficas ou a posição que ocupa a Cidade de Francisco Sá no Globo por onde todo e qualquer ser em qualquer parte do Planeta consegue localiza-la. Talvez para você, da geração GPS, isso não diz nada, mas naqueles tempos significava tudo.

Ufa!

Que prazer falar do grande homem que foi o Doutor Arthur Jardim de Castro Gomes. Que bom poder enaltecer aqui neste pequeno espaço, um pouco do muito que ele fez. Que ótimo seria se os brejeiros de hoje e pósteros jamais o esquecessem.

E tenho dito!

*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo das Almas.

Vem ai, Feliciano Oliveira. Aguardem!