SOBRE O BREJO DAS ALMAS – 74 ANOS SEM O FUNDADOR
Enoque Alves Rodrigues
Brejo das Almas, 17 horas e 30 minutos do dia 8 de Janeiro do ano de 1938. Falecia, depois de padecer por doze anos do mal de parkinson, o fundador e maior benemérito da Cidade de Brejo das Almas, ou Francisco Sá, localizada no norte de Minas, Jacinto Alves da Silveira. Portanto, amanhã, Domingo, 8 de Janeiro de 2012, completará setenta e quatro anos de seu regresso à Pátria Espiritual.
A doença de Parkinson é idiopática, ou seja, é uma doença primária de causa obscura. Há degeneração e morte celular dos neurônios produtores de dopamina. É, portanto, uma doença degenerativa do sistema nervoso central, com início geralmente após os 50 anos de idade. É uma das doenças neurológicas mais freqüentes visto que sua prevalência situa-se entre 80 e 160 casos por cem mil habitantes, acometendo, aproximadamente, 1% dos indivíduos acima de 65 anos de idade. Apesar do muito que já se pesquisaram, decorridos quase duzentos anos do descobrimento desta gravíssima enfermidade por James Parkinson, pouco ou quase nada se sabe sobre suas causas.
O fato é que, deve-se a ela, todas as conseqüências que justificam doze anos de sofrimentos impetrados ao grande e até hoje insubstituível benfeitor de Brejo das Almas. Tudo começou quando ainda vereador em Montes Claros , quando lutava pela aprovação de mais um projeto que beneficiaria o Brejo, sentiu-se as primeiras dores no dedo indicador da mão direita, a qual insistia em não obedecer aos seus comandos. Seu colega de partido, o mesmo do Dr. Honorato Alves, Antonio Ferreira de Oliveira, o Niquinho “Açúcar”, ou Farmacêutico, é quem conta com todos os detalhes, o inicio desse verdadeiro tormento, que, como já mencionei, doze anos depois ceifaria a vida de quem tanto fez pelo Brejo.
Jacinto Alves da Silveira, sobre o qual muito já falei, foi, até hoje, o único capaz de reunir todas as características que habilita qualquer individuo a afirmar ter vivido a vida em toda a sua plenitude. Descendente de famílias de Ouro Preto, assim como os Pena, Oliveira, Dias, Xavier, entre outras, esta última pertencente a genealogia do grande Mártir da Inconfidência, o Tiradentes, Jacinto, um dos muitos filhos do velho Fazendeiro José Alves da Silveira, nasceu no Brejo, lá pelos idos de 1871, quando o Brejo sequer sonhava em ter as feições de hoje. Ao contrário, assemelhava-se, muito mais, daquele dois de novembro de 1704, quando não passava de uma vasta mata às margens dos rios Verde Grande, São Domingos e Gorutuba, onde Antonio Gonçalves Figueira fincou pela primeira vez, ao lado da Lagoa das Pedras, o imenso cruzeiro que marcaria para sempre, no tempo e no espaço, o inicio de uma nova era, de uma promissora civilização e de uma progressiva Cidade. Jacinto, ao contrário de seus outros irmãos que eram todos Fazendeiros, desde a idade tenra, apesar de rústico, já despontava para as coisas da intelectualidade, quando lia, escrevia e realizava cálculos difíceis até mesmo para quem tinha a mais polida cultura. Era, portanto, desde aqueles tempos, um iluminado, na mais clara e límpida definição do termo.
Bonito, com um metro e oitenta de altura, bigodes bem fornidos, cabelos cortados a escovinha, trajando-se sempre de brim cáque, o belo mancebo Jacinto Silveira conduzia, juntamente com outros peões, grandes manadas de gados que eram vendidas na cidade de Curralinho, hoje, Corinto, no norte de Minas Gerais. Jovem ainda conheceu e casou-se com a normalista Maria Luiza de Araújo, na velha Matriz de Montes Claros, no dia 16 de Novembro de 1895. Maria Luiza foi durante toda a vida, sua fiel e inseparável companheira, a qual seria responsável pela condução dos destinos do povo brejeiro no campo da educação e cultura, enquanto Jacinto preparava esse mesmo povo na política e principalmente para a emancipação administrativa do Brejo, que ocorreria em 1923/24. A Câmara compunha-se dos seguintes vereadores: Padre Augusto Prudêncio da Silva, Francisco Fernandes de Oliveira, José Dias Pereira Zeca, João de Deus Dias de Farias e Rogério da Costa Negro, este último, um grande comerciante do ramo de tecidos.
Lutador, pelos direitos de seu povo, probo, íntegro, transparente, correto em todas as suas atitudes, honesto até a medula, numa época em que a mosca varejeira sequer sonhava sobrevoar o mundo da política, Jacinto Silveira conduzia os destinos do povo Brejeiro pelos caminhos da retidão, assim como Moisés do Egito conduzia seu povo rumo à Terra Prometida. Jamais perdeu uma só eleição. O Brejeiro daqueles tempos sabia reconhecer os valores incontestáveis de Jacinto e o tinha como a um verdadeiro Líder. E como tal se comportava: jamais deixou de falar o que pensava. Nunca se utilizou de meias palavras. Era homem de posições definidas. Não era de ficar sobre o muro. Educação casta e polida sabia ser enérgico no tempo certo. Muitos foram os Governadores de Estado que se utilizaram do prestigio de Jacinto junto aos Brejeiros.
Rico, dono de muitas fazendas de gado e cultivo, casas comerciais e muitas outras fontes de renda, Jacinto Alves da Silveira, homem que durante toda a existência sempre teve a casa cheia de amigos e correligionários, que sem nenhum apego às coisas materiais, ajudava, com recursos próprios a todo e qualquer Brejeiro; bancava, do próprio bolso, vários candidatos em campanhas eleitorais caríssimas. Depois de ter custeado com recursos próprios a emancipação do Brejo das Almas, tendo inclusive doado prédios para comporem o conjunto arquitetônico do Município, condição esta indispensável a sua homologação, já no final da vida, corroído pela enfermidade degenerativa, ainda era obrigado a arrastar-se de sua casa até a Prefeitura, onde dava expedientes, deixando-nos o exemplo o qual sigo até hoje, de que é no trabalho onde nos enobrecemos e dignificamos. Morreu, no entanto, pobre e praticamente só, tendo a seu lado apenas alguns familiares.
Não é sem motivo que um de seus filhos, o também Coronel Geraldo Tito Silveira, assim se expressa em um de seus lindos libelos, referindo-se as injustiças das quais fora vitima o pai: “Nos áureos tempos de sua vida abastada, quando ele plantava as sementes de uma pequena fortuna, depois esbanjada nos ardores da política, feita somente para o bem-estar de outrem, sua casa solarenga vivia repleta de “amigos”. Até então, não se via pela estrada real, que ia dar à Bahia, uma só pousada ou hospedaria, de modo que os forasteiros que por ali passavam procuravam a casa do Coronel Jacinto, onde recebiam todo o conforto, gratuitamente. Muitas dessas pessoas eram acometidas de terríveis doenças inclusive febre brava!”
E arremata o grande escritor do norte de Minas, Geraldo Tito Silveira, agora, lamentando a grande injustiça da qual foi vítima o pai, Jacinto Alves da Silveira. Aliás, muito já falei sobre tal injustiça que talvez, um dia, ainda nesta minha atual encarnação, veja corrigida: “Como corolário da ingratidão dos homens, mudaram o nome de Brejo das Almas, não para perpetuar o nome de Jacinto Silveira, na terra que engrandecera, mas para honrar o nome de outro Brasileiro, ilustre, é verdade, mas que nada fizera por ela.” Refere-se ao Dr. Francisco Sá, nascido no Município, na fazenda Brejo de Santo André, que foi Ministro da Viação e levou a estrada de ferro central do Brasil até Montes Claros, que muito lhe deve.
Não sei, até porque de há muito não vivo mais no Brejo e não participo de seu dia-a-dia, se a Sociedade Brejeira, movida por nobres sentimentos de gratidão, ou, quiçá, políticos locais, se lembrarão de promover neste dia 8 de Janeiro, alguma cerimônia, por mais simples que seja, ainda que um singelo minuto de silêncio, àquele que foi, é e será, o primeiro e mais importante Brejeiro. O maior de todos, porque deu tudo de si, até a própria vida, coisa que hoje não vejo ninguém fazer, para que o Brejo das Almas ou Francisco Sá, figurasse, no mapa de Minas e no Mapa do Brasil, como um dos progressivos Municípios Brasileiros.
Depois de permanecer longo tempo na erraticidade, acha-se, atualmente, no meio de nós. Não dentro da política que, convenhamos, mudou muito, e para pior, desde os seus tempos. Servidor incansável e dedicado que jamais fugiu à luta, não obstante toda a ingratidão com a qual lhe brindaram, acreditem céticos de plantão, em uma coisa: Se hoje se realizasse uma “chamada oral” convocando homens de bem a colaborarem com qualquer causa que tivesse por objetivo o bem comum, a justiça social, a luta contra as desigualdades dos menos favorecidos, alguém para expurgar e limpar a corrupção e tudo o que há de podre no mundo da política, ao se pronunciar o nome “Jacinto Alves da Silveira!” Com toda certeza ouviríamos, prontamente, em algum lugar do Brasil, a voz firme, forte e determinada do Coronel: “Presente. Eis-me aqui!”
E tenho dito!
Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/ http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur
Caro Enoque, sou montesclarense, filha de brejeiros, destarte interessada nos "causos do Brejo das almas". Sua crônica apresentou-me mais um homem o qual a biografia deveria constar nas enciclopédias universais. Felicito-o por tê-la escrito com exímio cuidado linguístico e pertinente tema.
ResponderExcluirObrigado, Carla. Fico muito feliz pelo seu interesse e, principalmente, pelos seus comentários a respeito do grande Jacinto Silveira.
ResponderExcluirAbraços
Enoque.