O BREJO E SUA GENTE IV –
ARTHUR JARDIM
*Enoque Alves Rodrigues
Em 24/08/1949, quando Feliciano Oliveira, Prefeito
de Francisco Sá, inaugurava o serviço permanente de luz elétrica fornecida pela
Usina Santa Marta, a mesma que abastecia Montes Claros, poucos se lembravam de
que a iniciativa daquele grande feito que agora se concretizava havia se
iniciado, na verdade, dez anos antes, ou precisamente em 30/11/1939, ainda que
de maneira precária, na gestão do grande Brasileiro nascido no ano de 1897, em
Conselheiro Lafaiete, norte de Minas, de nome Arthur Jardim de Castro Gomes, ou
melhor, Doutor, sim, ele era Doutor, não por ter sido o grande engenheiro que
foi o que para nós já seria uma grande honra, mas, principalmente por sua inteligência,
caráter, competência, e integridade inquestionáveis em todos os postos que
ocupou. Talvez a pobreza de dados que atualmente se encontram disponíveis sobre
o Doutor Arthur Jardim de Castro Gomes se justifica pela inexistência de réguas
capazes de dimensiona-lo integralmente, em toda a sua magnitude. Sabemos que
nem sempre a história é pródiga ou justa para com os grandes vultos que efetivamente
a souberam escrever, quase sempre com letras de sangue, por que eles existiram
em uma época em que tudo era mais difícil e muitas vezes para levar adiante os
seus projetos tiveram de “tirar leite de pedra”, além de se sacrificar ao
extremo em prol do ideal de realizar o seu melhor para assim minorar o
sofrimento dos mais carentes.
O Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes que também foi
Prefeito da cidade de Corinto tornou-se Prefeito de Francisco Sá de 1938 á
1942, no período intervencionista, em substituição ao Dr. João Bawden Teixeira
que morreu repentinamente. Em sua bem-sucedida administração frente à
Prefeitura Brejeira a cidade que ainda chorava seu líder recentemente
desaparecido (08/01/1938) se transformou em um verdadeiro canteiro de obras. O
arrojado Plano Diretor que o Prefeito Dr. Arthur Jardim escreveria de próprio
punho para por em prática no primeiro ano de seu mandato, contemplou todas as
áreas vinculadas direta ou indiretamente ao desenvolvimento urbano do sofrido Município
de maneira que ao chegar ao final de sua gestão quase nada restava por fazer do
que havia planejado. Em seu relatório, a guisa de prestação de contas, que ele
escreveu e enviou ao então Governador do Estado de Minas, Benedito Valadares, em
dezembro de 1942, deixa claro em linguagem simples e objetiva que soube dignificar
o cargo que lhe fora confiado com grandes e incalculáveis realizações em
beneficio da cidade e de seus munícipes, que lhe propiciavam á consciência
tranquila do dever cumprido.
Enumerar as realizações do Dr. Arthur Jardim na Prefeitura
do Brejo significa correr riscos de omissão. Fez tanto que ainda hoje
permanecem inabaláveis os pilares de sua administração. Da radical mudança
topográfica do antigo traçado das ruas brejeiras com aterramentos colossais que
sepultavam o feio fazendo brotar o bonito, escavações que punham abaixo
montanhas de terra que durante anos desafiaram cabeças geniais, terraplenagens extensas
e nivelamentos abismais que colocavam cara a cara em condição de igualdade o
aclive íngreme com o declive, empedramentos, prédios, jardins, barragens, criou
bairros e distritos, etc.
O Prefeitão Arthur Jardim abusava de suas
multifaces qualidades na cavernosa arte de “engenhar”. Grande parte dos
projetos que executou quando se achava na Prefeitura do Brejo foram produzidos
por ele. Saíram de sua prancheta e ganharam formas pelo seu nanquim. Ele mesmo
os fazia e ainda corria para executa-los. Também, pudera. O cara era tudo na
engenharia. Ele era engenheiro topógrafo, engenheiro civil e eletricista,
engenheiro rural, engenheiro paisagístico e engenheiro urbano. Para o Brejo das
Almas daqueles tempos, então, o Dr. Arthur Jardim não poderia ter vindo em hora
mais oportuna. Ele era também escritor,
conferencista, jornalista e articulista de vários jornais entre eles, “Gazeta
do Norte”, “Gazeta do Lavrador” e “Diário da Noite”, entre outros.
Membro da Maçonaria onde praticava fervorosamente
seu amor e devoção por todos. Intelectual acadêmico, tendo ocupado a cadeira de
nº 26 da Academia Montesclarense de Letras, é também naquele egrégio templo do saber
patrono da cadeira de nº 14 ocupada com humildade, sapiência e galhardia pela
escritora e professora Karla Celene Campos. O Dr. Arthur Jardim foi também
funcionário graduado de instituições de renome e projeção nacional como Estrada
de Ferro Central do Brasil, Departamento de Estradas e Rodagens, Departamento
de Águas e Esgotos de Minas Gerais, etc.
Fez todos os seus estudos, do primário á Escola
Superior de Engenharia em Belo Horizonte. Foram seus pais José Henrique de
Castro Gomes e dona Celestina Jardim de Castro Gomes.
Mesmo não sendo o Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes,
Brejeiro de nascimento, conhecia o brejo como ninguém ao ponto de escrever a
mais bela e completa monografia onde discorre com riqueza de pormenores nossa
região como a fauna com suas
variadas espécies de animais domésticos que vivem no Município de Francisco Sá, que em sua
maioria se constituem das mais comuns em varias partes do Brasil. Aves e
pássaros selvagens característicos da região, canoros e de belas plumagens.
Dentre eles o sofrê, o corricho, o canarinho amarelo e o pardo, o pintassilgo,
a patativa, o bicudo, o curió, o pássaro preto de três espécies, o cardeal e a
brabeza e mais seis espécies de beija-flores. Há também as pombinhas
verdadeiras e amargosas, a juriti, a inhambu, a zabelê, o sabiá, o tico-tico, o
bem-te-vi, a codorna, o quem-quem, os anuns pretos e brancos, as rolinhas
pedrês e parda, o João congo, o João de barro, e muitos outros. Com relação às
aves de rapina, catalogou varias espécies de gaviões de penacho e o carcará. Em
se tratando dos animais selvagens mencionou a suçuarana, a lombo-preto, e em
algumas regiões o tigre, a anta, os gatos maracajá e marisco, a raposa, o
caititu, o queixada, os tamanduás, os tatus pebas e bola, a paca, os veados, os
coelhos, as cutias, o guaxo, os preás e a jaratataca. Quanto a serpentes, a
maior mesmo é a jiboia, a caninana, a jararacuçu, a cipó, a cascavel, a coral,
a jararaca e outras mais. No tocante as variedades de peixes são muitas, a começar pelo grande surubi do rio verde
grande, o dourado, as curumbatás, as traíras, o piau e, ainda no rio verde e
várias lagoas, os grandes jacarés, as ferozes piranhas, os mandis, etc.
Referindo-se á flora
o Dr. Arthur Jardim nos diz ser quase toda constituída de CAMPOS – Limpos,
Cerrados e Gerais. CAATINGAS – Altas, de vazantes, baixas e médias. CATANDUVAS
– Altas e Baixas. Informa que nas Catanduvas encontram-se o Pau de óleo,
garapa, potumujú, ipê, catinga de porco, e outras mais. Já nos cerrados o pau
terra, o vinhático, a cagaiteira, a samambaia, o tingui, a caraíba, o angico e
outros, quanto às serras que rodeiam
o nosso município destacou todas elas de acordo com suas grandezas como a Serra do Catuni, um planalto que desce
bruscamente, na vertente ocidental, que é a do Verde Grande, de 900 – 1000
metros de altitude média, 700 – 650 na base da elevação, etc. Falou da orografia á composição do solo e
subsolo brejeiro que segundo os seus estudos geotécnicos avançadíssimos para a
época, são compostos de várias camadas entre elas a de argila, calcário,
lajedos, xistos, cascalho, quartzo, entre outras. Sobre a hidrografia do Brejo das Almas o Dr. Arthur informava ser ela pobre
tendo em vista que a maioria dos rios
e córregos que banham o Município é feita de rios temporários, ou seja, aqueles
que só existem no período das chuvas tendo destacado como principais
permanentes naqueles tempos hoje nem tanto, o Verde Grande, o São Domingos, e o
Gorutuba, etc.
O Doutor Arthur Jardim utilizou em beneficio de
Francisco Sá grande parte de seus conhecimentos topográficos, pois com
desprendimento e generosidade que somente os que atingiram elevados níveis de
grandeza são capazes, graças ao seu amor incondicional pelo Brejo, colocou o
nosso município no mapa do mundo ao embrenhar-se em suas entranhas de matas
fechadas de difícil acesso, tendo convivido durante trinta dias com todo tipo
de obstáculos, onde o caboclo lhe transmitia em dialeto nativo seus usos e
costumes e outras preciosidades roceiras que viriam ilustrar o seu rico libelo
monógrafo, tendo de lá retornado somente depois de concluir os estudos das
linhas imaginárias e seus paralelos, meridianos, latitudes e longitudes que
definiriam com exatidão as coordenadas geográficas ou a posição que ocupa a
Cidade de Francisco Sá no Globo por onde todo e qualquer ser em qualquer parte
do Planeta consegue localiza-la. Talvez para você, da geração GPS, isso não diz
nada, mas naqueles tempos significava tudo.
Ufa!
Que prazer falar do grande homem que foi o Doutor
Arthur Jardim de Castro Gomes. Que bom poder enaltecer aqui neste pequeno espaço,
um pouco do muito que ele fez. Que ótimo seria se os brejeiros de hoje e
pósteros jamais o esquecessem.
E tenho dito!
*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo das Almas.
Vem ai, Feliciano Oliveira. Aguardem!
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