O
BREJO E SUA GENTE VIII – JOÃO BAWDEN
*Enoque
Alves Rodrigues
Quando
em março de 1931, Jacinto Silveira passou ás mãos do médico Paulo Cerqueira
Rodrigues Pereira a direção do município de brejo das Almas depois de sua
nomeação pelo presidente Olegário Maciel, pouco ou quase nada se sabia do
indicado, na verdade, até aquela ocasião, um médico de renome em Belo
Horizonte. Realizou, no entanto, uma eficiente administração não obstante ter
presidido o município por apenas oito meses quando foi transferido na condição
de médico leprólogo, para a Colônia Santa Izabel, em Belo Horizonte. Assim sendo
faço aqui este sucinto relato apenas para registrar sua passagem pela
Prefeitura do Brejo em virtude do muito que realizou não obstante o pouco tempo
que a ocupou. Construção do matadouro ás margens do rio são domingos, inicio do
nivelamento das ruas e praças, reparos nas estradas que dão acesso ao interior
do município, fiscalização do ensino, reforma do cemitério, etc., são algumas
obras de sua bem-sucedida administração.
Nascido
no século 19, durante o império, filho do médico, político influente (quatro
vezes governador do estado de Minas) e minerador Doutor Antônio Teixeira de
Sousa Magalhães e de dona Maria Angelina Bawden, os barões de Camargo, uma das
mais ricas famílias da cidade de Mariana, em Minas Gerais, João Bawden Teixeira
teve onze irmãos e desde a infância já trazia no sangue o vírus benevolente da
mais pura e tradicional política mineira, na qual fora introduzido pelo pai, onde
a palavra dada sobrepunha a todo e qualquer documento. Ainda adolescente
matriculou-se na Escola de Minas, berço da nata abastada, em Ouro Preto, de
onde saiu após se formar Engenheiro Geógrafo, com 23 anos de idade. Muito tempo
depois se transferiu para Montes Claros onde juntamente com os coronéis João
Martins da Silva Maia, Virgílio Machado e os engenheiros José Bawden Teixeira
(seu irmão), Nelson Washington da Silva e ele João Bawden Teixeira fundaram
nesta Cidade a empresa de engenharia Maia, com a qual construiu centenas de
quilômetros de estradas de rodagens sertão á dentro, quando, finalmente, por
mera casualidade, ou seja, quando realizava levantamentos topográficos por uma
“picada” quando menos se esperava, viu-se em pleno centro de um simpático
povoado pelo qual de cara se apaixonou. Era o Brejo das Almas com o seu famoso
amontoado de pequenas casas e empoeiradas ruas. Ali ele passou a residir “de
passagem”. Assim nós mineiros definimos as localidades aonde nos encontramos em
trânsito por que não pretendemos fixar residência, mas, que no caso do Dr. João
Bawden tal colocação não funcionou, por que a cada dia que se passava
tornava-se cada vez mais potente o seu amor pelo Brejo ao ponto de lá
permanecer do final do ano de 1930 até o dia da sua morte ocorrida dois dias
antes do Natal de 1937.
Na
introdução do meu livro “O Brejo das
Almas em Crônicas” faço um pequeno passeio pelas origens das mais
tradicionais famílias que residem no Brejo das Almas, hoje Francisco Sá. Como a
maioria dos sobrenomes que povoam até os dias atuais o Brejo das Almas descende
de Ouro Preto, Vila Rica e Mariana, o Doutor João Bawden Teixeira também acabou
por se juntar a essas famílias no Brejo. Tornou-se amigo incondicional do
coronel Jacinto que em virtude do agravamento do mal de Parkinson já estava se
afastando da política, assim como do atual prefeito, o médico doutor Paulo
Cerqueira Rodrigues Pereira e das mais importantes forças políticas regionais.
Quando o Doutor João Bawden tomou conhecimento do afastamento do prefeito Doutor
Paulo Cerqueira correu até a casa do coronel Jacinto solicitando-lhe, com
humildade, que o indicasse como substituto do Doutor Paulo Cerqueira de quem
ele era admirador pela maneira como conduzia a gestão do município e pela forma
arrojada de trabalhar, salientando, ainda com modéstia, suas experiências como
engenheiro e que pretendia, com toda sinceridade, dar continuidade aos projetos
iniciados pelo Doutor Paulo Cerqueira bem como empreender novas benfeitorias no
sofrido município. Várias vozes se levantaram contra o pleito do Doutor Bawden.
Ninguém ali conhecia o seu passado. Também pudera: O doutor Bawden não era do
lugar e acabava de ali chegar. Estou me referindo ao final do ano de 1931. Sequer
imaginavam que por trás daquele homem riquíssimo apesar de aparência simples,
existia uma longa e muito bem consolidada carreira politica que começou ainda
jovem, em Mariana, como vereador, passando por todas as escalas, de maneira que
em 1903 já era senador da República recentemente proclamada por Deodoro, em
1889. As lideranças politicas locais encontravam-se “rachadas” pau a pau ou
meio a meio como queira. O fiel da balança ali estava difícil de achar e a tal
“metade e mais um” que decide tudo em nossas vidas ali não se manifestava.
Escafedeu-se. Não dava o ar da graça. Jacinto apenas endossou o desejo do Dr.
João, mas, como eu já disse doente, não se envolvia mais com política. Á favor,
Sebastião Bessa e seu grupo puxavam de um lado, enquanto que do lado contrário
o grande Rogério da Costa Negro e seu grupo também puxavam com vontade. O
argumento de Rogério era robusto e indestrutível: O doutor João Bawden que
havia nascido em berço de ouro em local distante era pouco afeito ao trabalho e
não cumpriria com suas promessas por que era demasiado boêmio e não seria
responsável o suficiente para zelar pelas coisas do município.
Rachados
e intransigentes entraram todos para a reunião promovida no Brejo das Almas
pelo Partido Republicano Mineiro em casa do próprio Sebastião Bessa e depois de
acirrada discussão Rogério da Costa Negro ainda se mantinha irredutível em sua
posição. Foi quando alguém ali temeroso por entregar ás rédeas do destino do
município em mãos estranhas, para surpresa de todos os presentes, surgiu em
meio aquela reunião, ostentando um empoeirado exemplar do Jornal “Liberal
Mineiro”, da Cidade de Ouro Preto, pertencente ao Partido Liberal, que em sua edição
de número 93, do dia 16 de agosto do ano de 1884, na “seção parlamentar” do dia
07/08/1884 se registrava, clara e evidente, a seguinte menção honrosa alusiva
ao “desconhecido” doutor João Bawden:
“é
dotado de sentimentos de nobreza e dignidade. É essencialmente caritativo,
amigo sincero e extremado, está sempre pronto a acudir (socorrer) com prazer a
voz da amizade e aos reclamos da pobreza de quem ele é um firme sustentáculo
(benfeitor). Como as sementes, os grandes sentimentos precisam de terrenos e
estações próprias para vingar e florescer no coração do nosso magnânimo e
ilustre democrata, que é um sacrário de virtudes e por isso florescem exalando
perfume nos corações que sabem conhecer a altura dos seus merecimentos...”.
Era
só o que faltava. Contra fatos não há argumentos já dizia uma sábia raposa da
politica mineira de nome José Maria. As forças agora se alinhavam em torno de João
Bawden que acabou tendo o seu nome referendado como prefeito substituto do
Brejo das Almas em Janeiro de 1932, consecutivamente.
Quando
Vargas determinou eleições gerais constitucionais o Dr. João Bawden diante do
muito que havia realizado pelo Brejo das Almas foi aclamado e eleito pelo povo
prefeito constitucional. Mesmo após o Presidente Getúlio Vargas a 10 de
Novembro de 1937, consumar o golpe de estado que lançou o País numa ditadura cruel
e sanguinária e depois de promover uma verdadeira caça ás bruxas, com milhares
de prisões e destituições violentas de políticos guindados constitucionalmente
ao poder pelo voto popular, não encontrando no Brejo das Almas nada que
desabonasse a conduta imaculada e transparente do prefeitão “bom de trampo” Doutor João Bawden, não
lhe restou nenhuma alternativa que não fosse confirma-lo no cargo de prefeito que
já ocupava. Infelizmente, agora, pouco tempo ele teria naquela nova gestão, porque
vitimado por um ataque de angina veio a falecer no cargo no dia 23/12/1937
quando foi substituído pelo Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes, aqui já
retratado. Como justa homenagem ao homem que tanto dignificou a nossa terra o
povo Brejeiro exigiu que o seu corpo nela fosse sepultado.
Hoje,
ao ver em meu Brejo das Almas, ruas e praças com suas placas ostentando o nome
do Doutor João Bawden eu me pergunto: qual seria, ao certo, a porcentagem de
Brejeiros locais que saberia resumir em poucas palavras a importância que teve
este nome para a nossa cidade?
Acredito
que poucos.
E
tenho dito.
*Enoque
Alves Rodrigues nasceu no Brejo.
Enoque, meu amigo, teus escritos fazem falta: porque parastes ? "Brejo das Almas" clama pelas tuas crônicas. Nos brinde, por favor, com as mesmas. Um abraço.
ResponderExcluirCésar Xavier.