CASOS DO BREJO III – MESSIAS PREÁ
Enoque Alves Rodrigues
No Brejo das
Almas de antigamente não há quem não o tenha conhecido. Na verdade ele pouco ia
ao Centro do Brejo. Ocupava a maior parte de seu tempo caçando preás no morro
do mocó. Vivia, praticamente, no topo do morro. Descia todas as tardes em
direção à antiga fazenda de Antonio Miranda por onde saia para bebericar alguns
pileques nos bares da região.
Messias
Antonio Dias, assim se chamava. A alcunha de “Messias Preá” foi-lhe dada devido
a esta prática de caçar preás. No entanto, ele era um caçador meio que às
avessas, pois ao invés de caçar estes pequenos animais, pertencentes ao grupo
dos roedores, para se alimentar, ele apenas os caçava por mero prazer. Ele se
realizava ao vê-los cair em suas inofensivas armadilhas. Uma vez presos e
imobilizados ele, curiosamente, amarrava uma pequenina fita em uma das patinhas
do preá e o soltava de volta à Natureza. Antes ele tinha o cuidado de registrar
em uma folha de caderno a data e o número do bichinho. Assim caso houvesse alguma
repetição de o mesmo vir a cair em sua armadilha ele o soltava imediatamente,
porque não mais necessitava ser “recenseado”. A sua sensação estava na primeira
vez. Nada mais.
Redundante
seria me estender sobre a lenda que, segundo a qual, há no morro do mocó um
rico tesouro, enterrado que foi por Jerônimo Xavier de Souza. Sobre o dito cujo,
muitos historiadores interessantes, de renome e projeção nacional já
discorreram. Houve, inclusive, várias corridas à caça do mesmo que, no entanto,
resultaram-se infrutíferas. Talvez não tenha chegado ainda o tempo necessário
para esta revelação ou quiçá, o espirito deste Bandeirante, parente próximo de
Joaquim José, já tenha encontrado o repouso suficiente que o tornou indiferente
ás necessidades materiais mais comezinhas de pobres brejeiros, que nada
desejariam, senão uma pequena parte deste imenso quinhão, cada dia mais distante.
Bem, antes que
você me pergunte: E o que teria o pobre do Messias Preá a ver com isso? Pois,
é. Vamos, então, partir para o “quase” epílogo desta despretensiosa crônica e
no final você entenderá que, ao contrário do que imaginava, ele, Messias Preá,
tinha sim, muito a ver com tudo isso, pois esta história não existiria não
fosse ele seu principal personagem.
A tarde caia
faceira e preguiçosa por aqueles recônditos de meu Deus. O astro rei acabava de
se ausentar do Orbe, partindo para iluminar os mundos intangíveis aos nossos
olhos e limitadas divagações. O clarão da lua cheia já cintilava nas águas do São
Domingos. Messias houvera tido um dia “muito cansativo e enfadonho”. A caça e
identificação de seus preás fora muito produtiva. Agora ele estava se
preparando para descer o morro. Sairia em frente ao antigo casarão da sede da
fazenda de Antonio Miranda e dona Edite e dali, ganharia as imediações. Era o
que ele imaginava. Mas não foi exatamente isso o que ocorreu.
De soslaio,
visualizou algo que a primeira vista não conseguiu identificar, mas que
reluzia. Brilhava um brilho azulado que resplandecia até as copas dos mais
altos e frondosos arbustos. Curioso, apesar de comedido, aproximou-se um pouco
daquele estranho objeto. A distância não era grande. Mas, mesmo assim, por
estar um pouco escuro, não lhe permitiu definir do que se tratava realmente.
Aproximou-se um pouco mais... Mais... Mais... E, zás... Lá estava um grande, e
encardido alforje em couro de um boi que seguramente fora sacrificado centenas
de anos antes daquela descoberta. Estava aquele alforje, ainda, sujo da terra
vermelha do Brejo das Almas, ou Francisco Sá, “igual a ti, outro não há”. Isso
só já era motivo mais que primordial para levar a mais iluminada das mentes a
navegar por mares pródigos e alvissareiros onde patacas de ouro cunhadas nos
tempos do Império tilintavam as vistas do caboclo.
Inebriado,
extasiado. São sinônimos, não importa. Era assim que ele estava. Contemplava
tudo aquilo, mas não acreditava no que seus olhos viam. Estaria ele
experimentando o fenômeno da segunda-vista ou dupla-vista que se trata de um
efeito de emancipação da alma o qual se manifesta quando nos achamos acordados,
cuja finalidade é nos fazer ver coisas ausentes como se presentes estivessem?
Seria ele, Messias Preá, clarividente? Bem, se nem ele sabia possuir este dom
quem dirá, eu que, nem lá estava e que, somente hoje, oitenta anos depois, me
atrevo a fazer este misero relato.
A curiosidade
que matou o gato, por certo, pensava
ele, não o mataria. Á necessidade que fez o sapo pular, dele não se apoderaria.
Fechara, consigo próprio, que independente do que houvesse naquele alforje, ele
não tomaria conhecimento. Abdicado estava, segundo ele, de todo e qualquer
desejo que o levasse a por a mão “naquela coisa”.
Você ai que me
lê, procure controlar também a sua curiosidade e espere os próximos capítulos
por que só darei o final desta história após eu retornar do Brejo das Almas
para onde viajo nesta semana para comemorar o aniversário de minha mãe. Não
avançarei nesse caso, um milímetro sequer, antes disso.
É...
Por vezes, ou
quase sempre, saber esperar com paciência e resignação também é uma das grandes
virtudes.
E tenho dito!
Enoque Alves Rodrigues, que vive
em São Paulo, é brejeiro de nascimento e convicção. Atua há mais de 41 anos na
área de Engenharia. É autor do livro “Liderança
Conquistada”, temática simples sobre otimismo, liderança e motivação, cuja
primeira edição já se encontra esgotada. É Colunista, Palestrante Motivacional,
Historiador e Divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas
Gerais, Brasil
.
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seleção de minhas melhores crônicas que serão inseridas no meu próximo livro “O
Brejo das Almas em Crônicas” entre nos meus blogs e escolha. Ao final envie-me
o titulo da crônica pelo e-mail: enoque.rodrigues@ibest.com.br