sábado, 4 de julho de 2015

O BREJO E SUA GENTE VII - GERALDO TITO



O BREJO E SUA GENTE VII – GERALDO TITO

*Enoque Alves Rodrigues

Escrever alguma coisa sobre alguém com quem, de certa forma, tivemos, ainda que esporadicamente, algum contato visual em algum lugar do passado, não é fácil. As dificuldades se multiplicam por mil à maneira que a pessoa que desejamos nos referir, em singela homenagem, tenha vivido intensamente ao transformar cada minuto de sua existência terrestre relativamente longa, em produzir. Produzir e produzir. O personagem que reverencio neste mês de Julho-15 não desperdiçou um segundo sequer da vida que Deus lhe deu com algo que não fosse útil. Transitou com inteira cadência e desenvoltura por todos os patamares da vida, tendo se destacado em todos, mas, principalmente no campo do intelecto, onde com humildade, proficiência, elegância e maestria grande e valioso legado nos deixou, suficiente para nos orgulharmos dele e pela oportunidade que tivemos de sermos seus conterrâneos.

Geraldo Tito Silveira, Coronel, Escritor, Político, Professor, Delegado, Historiador, Jornalista, Diretor, Filantropo, Espírita Kardecista Vidente, era um dos filhos de Jacinto Silveira, fazendeiro e político e de Maria Luiza Silveira, normalista do outrora povoado de Brejo das Almas, hoje Francisco Sá, MG, onde nasceu no dia 06/02/1917 e desencarnou em Montes Claros no dia 18/12/2005 de causas naturais, com quase 89 anos.

Aos sete anos matriculou-se no Grupo Escolar de Brejo das Almas onde sua mãe era professora de onde saiu aos doze anos depois de se formar no curso primário para ir estudar em Montes Claros, no Ginásio Diocesano. Ao concluir o curso ginasial então com 16 anos partiu para Belo Horizonte onde mergulhou por inteiro nos estudos e no trabalho, iniciando-se na Capital das Alterosas profícua produção literária ao mesmo tempo em que galgava patentes na policia mineira, onde, aos 24 anos tornou-se oficial aspirante e na sequência oficial de gabinete, coronel, delegado e outros cargos e estrelas que com meritocracia inquestionável, resultado de muito trabalho, dedicação e esmero, conseguiu amealhar. Como delegado especial atuou em várias cidades de Minas, inclusive, em sua cidade de nascimento Francisco Sá aonde posteriormente veio a ser também prefeito, exercendo, respeitosa e dignamente as atribuições que este cargo requer, sempre pautado pela retidão de caráter, justiça social, honestidade e austeridade, auferindo ao erário municipal recursos jamais dantes aportados, sem em nenhum momento se descuidar do exercício altivo e persistente das ações empreendedoras em resposta ás necessidades dos munícipes carentes. Destacou-se, enquanto prefeito de Francisco Sá, pela atenção especial e prioritária que dispensou ao ensino público ao dotar as escolas de razoável estrutura física desde o seu mobiliário, além de estabelecer um calendário de reciclagem do corpo docente levando levas imensas de professores de volta aos bancos escolares em cidades vizinhas como, Montes Claros, Porteirinha, Monte Azul, entre outras, de onde retornavam com currículos turbinados, mais preparados para reassumirem suas funções só que agora, promovidos e remanejados para outros distritos do grande município, mediante melhores salários e condições de trabalho.

Jornalista e Redator dos bons por mais de 50 anos, daqueles que possuíam em um velho caderno capa dura, nomes, endereços e telefones das mais importantes figuras da República de então, jamais se deixou levar pela ansiedade do furo da notícia antes de checar as fontes e muitas vezes consultar o próprio noticiado. Geraldo Tito Silveira escreveu para vários jornais, entre eles, o Estado de Minas, Hoje em Dia, Diário da Tarde, Diário de Minas, O Globo, Jornal do Brasil, além dos jornais de Montes Claros, como O Diário, Jornal do Norte e Jornal de Notícias. Foi diretor-superintendente do Jornal do Norte, de 1983 a 1984. Escreveu para inúmeras revistas e mereceu críticas extraordinárias de jornalistas e Redatores famosos em sua época.

Como escritor, foi o melhor que o norte de Minas já produziu até os dias de hoje. Ninguém melhor que o Cel. Tito conseguiu decifrar com tanta riqueza de pormenores a alma do caboclo brejeiro, seus costumes, suas crenças e seus anseios. Sua produção literária é robusta e imbatível. Convivi com ela em infância e posso assegurar o quanto agregou ao meu saber. Tenho o privilegio de possuir ainda hoje 14 livros, garimpados com muito suor em sebos Brasil a fora, dos 24 que compõem sua obra literária publicadas em vida, e outra após sua morte, sem contar as inéditas no total de 10 a serem publicadas. Os livros escritos por Geraldo Tito são enciclopédias balsâmicas de viagens no tempo. É possível a qualquer um visitar o antigo Brejo das Almas com suas estreitas e empoeiradas ruazinhas de chão batido, seu folclore e seus personagens da época sem sair do lugar apenas lendo pérolas como “O Padre Velho”, “Lembranças Antigas do Brejo das Almas”, “A família Silveira de Brejo das Almas”, etc., tamanha é a autenticidade de sua narração. Já o antigo Egito pode ser visitado nas páginas de “Memórias de Cláudia Prócula” ou “Pôncio Pilatos”. “Conversa de Meganha”, “Crônica da Polícia Militar de Minas Gerais”, “Os Milicianos da Capitania do Ouro”, “Tocaia de Bugres”, etc., nos remetem aos fatos e costumes praticados pela polícia mineira em várias épocas. Espírita Kardecista praticante, convicto e fervoroso, Geraldo Tito Silveira brindou á comunidade espírita, da qual faço parte, com importantes obras como “O Evangelho Segundo Judas”, “Fumaça de Satanás”, “Os Litostrótos”, “O Salto no Tempo”, “O Clero da Foice e do Martelo”, etc.

Geraldo Tito Silveira recebeu muitos prmios e horarias em vida, que, no entanto, apesar de indiscutíveis valores literários e exaltação ao saber, ficaram muito aquém do jus merecido. Ele foi realmente um homem muito além de seu tempo. Foi membro da Academia Municipalista de Letras, Academia Montesclarense de Letras, Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e acadêmico fundador da Academia de Letras João Guimarães Rosa, da Polícia Militar de Minas Gerais e chefe de segurança das Usinas Malvinas.

Geraldo Tito Silveira foi casado com a professora Maria José Nunes Silveira com quem teve seis filhos. De seu segundo casamento com dona Maria de Fátima Oliva Silveira teve apenas uma filha. A seu respeito escreveu o grande poeta e intelectual, Cândido Canela: “Conheço Geraldo Tito Silveira desde os tempos de calças curtas. Ao contrário do que muitos pensam, trata-se de um homem de bom coração, caridoso, cidadão correto, militar digno de seus galões, espírita kardecista convicto, excelente esposo, pai e avô amorozíssimo.”. Por ter lidado com oligarquias que queriam dobrá-lo pela força da autoridade e do dinheiro e com pessoas que o ameaçavam, através de armas, por circunstâncias de sua própria profissão, ele desenvolveu uma couraça de brabeza. Entretanto, prova das palavras de Cândido Canela foi o fato de ter deixado, por onde passou dezenas de afilhados, filhos de soldados, cabos e sargentos, que sempre o amaram e respeitaram muito.

Depositário fiel das mais puras e relevantes virtudes humanitárias que nem mesmo a vida dura de caserna ou a dor da injustiça e padecimento por longa doença do pai conseguiram abalar, Geraldo Tito Silveira é o nosso grande exemplo de que o que é bom já nasce feito e que as dificuldades da vida de cada um de nós só devem servir para nos tornarem cada vez melhores. Que a mais sólida lembrança que podemos deixar de nós mesmos é a do saber com humildade. Herança esta que transitoriedade nenhuma consegue apagar.

E tenho dito.

*Enoque Alves Rodrigues é brejeiro.

Vem ai, Feliciano Oliveira. Não percam!

quinta-feira, 4 de junho de 2015

O BREJO E SUA GENTE VI - EURICO PENA



O BREJO E SUA GENTE VI – EURICO PENA


*Enoque Alves Rodrigues


Seguindo com a série mensal que tem por objetivo reverenciar de maneira singela, alguns de nossos antepassados Brejeiros de relevância maior que se destacaram na história de nossa cidade pelo muito que por ela realizaram e que com lisura de caráter, sólidas iniciativas sociais, político-administrativa, souberam dignifica-la, ao levar adiante suas gestões com transparência, honestidade, dedicação e equilíbrio sempre privilegiando aqueles que mais necessitavam, preservando, imaculadamente, suas respectivas biografias as quais escreveram com naturalidade, despretensiosamente, etc. 


O meu retratado de hoje pertence a uma contemporaneidade recente e é possível que muitos dos poucos que ainda me leem devam ter com ele cruzado um dia em nossa querida Francisco Sá. Sim, o período ao qual me reporto não é o do Brejo das Almas. Aliás, ele apenas “nasceu no Brejo onde viveu até os 24 anos”. Mas, fez-se homem, político e importante mesmo em Francisco Sá pela qual trabalhou arduamente. Se você não é conterrâneo te informo que Brejo das Almas e Francisco São uma mesma Cidade. Pronto: poupei-lhe do trabalho de recorrer á “Wikipédia”. Isto posto, vamos em frente!

Eurico Pena da Silveira é o nobre personagem que ilustra esta minha crônica de Junho exatamente por canalizar em torno de si todas as referências positivas e virtudes singulares das quais grandes castas de gestores públicos atuais a cada dia se distanciam. Por motivos que imensa parte das inteligências medianas não alcança competência, dedicação e honestidade são virtudes que levas consideráveis de gestores não conseguem coadunar. Esforçam-se, é verdade, por vezes, chegando até mesmo a jurar sobre a Bíblia que independente das circunstâncias que venham a enfrentar seguirão firmes e fortes na defesa de seus princípios lastreados por este trinômio, mas, lamentavelmente, ao tomarem posse de nosso erário se esquecem de que de nada adianta ser competente e dedicado se não for honesto o suficiente para resistir ás tentações do dinheiro fácil. Dureza mesmo para eles, garbosos, faceiros e lisos como o quiabo, somente o “drear” (assim falamos no Brejo), “por que desce macio e reanima”. Tomou?


Dedicado, competente e honesto. Empreendedor nato e tocador de obras, assim era Eurico Pena que por duas vezes esteve á frente da Prefeitura de nossa querida cidade de Francisco Sá onde se destacou pela quantidade de obras que realizou. Muitas delas, inclusive, se encontravam com os seus projetos engavetados há dezenas de anos. Conheci de perto, o grande Eurico, sobre o qual fiz um pequeno relato primeiro, acredito, há alguns anos atrás em crônica intitulada “Assim Era Francisco Sá – Jardim Público Municipal”, na qual descrevia a inauguração desta obra, projetada por outro prefeitão, o Dr. Arthur Jardim.


Eurico Pena da Silveira nasceu no Brejo das Almas, hoje Francisco Sá, Minas Gerais, em 07/05/1914, ao pipocar da primeira guerra mundial. Filho de dona Joana Alves da Silveira e de Tiburtino de Oliveira Pena enveredou-se, muito cedo pelos campos das artes e da política tendo sido contemporâneo de grandes vultos da política local. Foi prefeito de Francisco Sá em plena ditadura militar, em dois períodos distintos, de 01/02/1967 a 31/01/1970 e de 01/02/1973 a 31/01/1977. Não obstante as dificuldades naturais por que passavam o Brasil devido ao regime de exceção e principalmente o norte de Minas onde se localiza a nossa cidade, em meio ao polígono da seca, as administrações de Eurico Pena da Silveira foram todas elas cobertas por grandes realizações pautadas no “bom e barato”. Realizou-se muito com pouco dinheiro. Em sua primeira gestão (1967/1970) Eurico elegeu como prioridade revolucionar o perímetro urbano do Município onde construiu prédios, praças, escolas, pontes, chafarizes e empedrou ruas inteiras além de fazer seus nivelamentos e corrigir seus traçados. Aos bairros de Francisco Sá, distantes, íngremes e sofríveis, além de estender essas benfeitorias, levou água e luz elétrica que até então não possuíam. Após embelezar nossa cidade, dotando-a de uma nova roupagem e semblante saudável, alegre e amistoso, Eurico, agora, voltava a sua segunda gestão (1973/1977), progressista e eficiente, para as zonas rurais deste imenso município composto, então, por distritos cujo índice de analfabetismo, crescimento social e miserabilidade haviam desafiado vários antecessores e suas administrações, que pouco ou quase nada conseguiram avançar. 


Calçando botas de couro canos longos e usando calças rústicas do tipo “arranca toco” e camisa de morim batido, transportado por uma velha “rural bandeirante” dessas que sobem em serras, Eurico supervisionava pessoalmente as obras nos mais longínquos distritos. Acompanhava tudo de perto. Nesse diapasão, graças a sua coragem e empenho construiu inúmeras escolas em zonas rurais inóspitas para onde também levou estradas e pontes que agora ligavam aqueles pequeninos núcleos marginalizados por desditas anacrônicas, ao centro urbano de Francisco Sá, onde respiravam os seus iguais, em melhores condições de civilidade. O matuto brejeiro teve sua honra e dignidade restabelecidas por Eurico que para isto nenhum esforço mediu.


Na cultura, mexeu na grade escolar instituindo turnos distintos além de reforçar a merenda da gurizada. Incentivador incansável do folclore do lugar. “Festeiro, convicto, participava de todas as comemorações brejalminas que ocorrem, quase sempre, no mês de setembro, quando se homenageiam a “um milhão de santos em cada dia”“. Presença marcante nos catopés. Nas artes, patrocinava compositores e cantores, principalmente aqueles que enalteciam as coisas de Francisco Sá. Na literatura bancava escritores e suas publicações nem sempre bem-sucedidas, etc.


Grande baluarte da boa política brejeira que praticava em prol do bem comum sem jamais utiliza-la em benefício próprio. Nascido em famílias de tradições política e religiosa secular na vida de Francisco Sá, Eurico Pena da Silveira, criança ainda, não teve dificuldade em escolher o caminho que seguiria ao crescer. Seria político assim como os seus ancestrais. Mas não seria um político qualquer. Tentaria, dentro do possível, ser igual ou próximo ao velho Jacinto, falecido em 1938. Queria prefeitar. Desejava, humildemente, colocar um tijolinho nas paredes de seu Brejo das Almas ou Francisco Sá. Acabou por erguer muitas paredes nas quais se encontram gravado o seu honroso nome em letras indeléveis que o tempo, senhor absoluto da razão, merecidamente, insiste em reluzir, não obstante a sua ausência física já longeva, efetivada que foi em 27/05/1993.


Eurico Pena da Silveira. Esse é o cara do qual todos nós brejeiros temos motivos mais que suficientes para nos orgulharmos. Viveu em uma época aonde a lei do mais forte prevalecia e aqueles que detinham o poder o utilizavam para massacrar os mais fracos e alimentar seus próprios egos. Eurico Pena enfrentou todas as dificuldades “tirando leite de pedra” sem jamais se esquecer dos menos favorecidos para os quais governava, não obstante vir ele de família de posses. O que é bom já nasce feito. E fim de papo.


E tenho dito.


*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo.


Vem ai, Feliciano Oliveira. Não percam!

sexta-feira, 1 de maio de 2015

O BREJO E SUA GENTE V - ANTÔNIO FERREIRA



O BREJO E SUA GENTE V – ANTÔNIO FERREIRA

*Enoque Alves Rodrigues

Quando em uma bela e ensolarada manhã de Janeiro do ano de 1929, Antônio Ferreira e sua mulher Cândida Peres juntamente com sua numerosa prole adentraram ás ruas empoeiradas do Brejo das Almas, provenientes da Cidadezinha dos Montes Claros, pouquíssimas almas que habitavam o Brejo de outrora sequer imaginavam a importância que aquele senhor, alto, loiro, de olhos verdes e falar manso teria á partir dali e durante toda a sua vida, para o cotidiano pacato daquele diminuto povoado de cuja emancipação (07/09/1923) que demandou feroz e ferrenha luta, ele próprio havia participado na condição de Vereador ainda em sua cidade. Ele nasceu em Montes Claros, onde se formou em química farmacêutica, mas estava desde o seu reencarne predestinado ao Brejo das Almas.

Uma vez no Brejo, fincou residência no Largo da Matriz, próximo a única farmácia do lugarejo de propriedade de Francelino Dias, o França, com quem passou a trabalhar até conseguir montar sua própria farmácia, lá pelos idos de 1930 no mesmo Largo da Matriz todo desnivelado e esburacado, sem qualquer melhoria. Assim sendo, quando no ano de 1931, na gestão do prefeito Dr. Paulo Cerqueira Rodrigues Pereira se iniciaram as obras de nivelamento e empedramento das ruas e do antigo Largo da Matriz e adjacências, Antônio já se encontrava inteiramente estabelecido naquele Largo com a sua bem sortida e frequentada farmácia que progredia vertiginosamente devido ao empenho, conhecimento e popularidade de seu dono que a transformou na melhor botica de toda a região. O farmacêutico Antônio naquelas bandas era a salvação para muita gente. Olhava na cara do caboclo e já sabia qual remédio lhe dar para a cura plena dos males físicos desde as dores do espinhaço até as dores da alma por que ali Antônio, munido de inteligência impar no campo do intelecto muitas vezes tinha de “atacar” também de psicólogo oferecendo sempre uma palavra terna e amiga de encorajamento e motivação aquela gente sofrida que muitas vezes sequer tinha o que comer em casa. Independente de o matuto brejeiro ter ou não dinheiro no bolso para adquirir o remédio, jamais saia de sua farmácia de mãos abanando. Antônio utilizava muito mais os seus conhecimentos na prática da caridade e filantropia aos menos favorecidos, que para ganhar dinheiro, mesmo vindo ele próprio de família simples, de poucos dotes, apesar de ter sustentado sua grande família com o conforto necessário e com toda dignidade de marido zeloso e pai de família exemplar.

Compadre do Coronel Jacinto Silveira, fundador do Brejo das Almas, muito antes de ele, Antônio, se mudar para o Brejo, pois ainda em Montes Claros, Antônio e Jacinto já eram amigos e companheiros de bancada na Câmara de Vereadores daquela Cidade na qual Antônio era secretário tendo sido dele a redação do projeto que se converteria na lei estadual (843) que faria do Brejo, Município, de onde plantaram as sementes de um novo porvir para o distante povoado que ambos ombreariam, transformando-o em cidade progressista dentro de suas naturais limitações. No Brejo das Almas os elos desses dois gigantes, Antonio e Jacinto, viriam a se fortalecer muito mais quando no dia 20 de Janeiro do ano de 1933, na mesma Igreja Matriz que ainda hoje lá está, une-se em matrimônio uma filha de Antônio, então com dezoito anos, com um dos filhos de Jacinto, de vinte e três anos, cujo enlace de longevidade superior a sete décadas e meia, se estenderia por toda a vida, pois só se findou depois do último suspiro do filho de Jacinto no ano de 2009 e, mais recentemente, para nossa tristeza, com a morte da Diva Brejeira, filha de Antônio com 100 anos no dia 17/04/2015.

Forjado do mais puro aço, de ascendência europeia, a vida nem sempre sorrira para Antônio que desde cedo teve de ir á luta. No Brejo, dentro do ambiente familiar teve de assumir a condução do lar e educação dos filhos devido ao dissabor da ausência da esposa devotada Cândida, para infrutífero, longo e penoso tratamento mental em Montes Claros. Muitas foram às lutas com as quais o gigante Antônio teve de travar com o destino de onde ele sempre ressurgia com mais força e resiliência.

Político, Farmacêutico Diplomado, Médico sem Diploma, Escrivão de Paz, Orador e Poeta. Em todas as enumeradas atividades que Antônio ocupou deixou sua marca indelével gravada à posteridade de curta memória. É possível que poucos saibam hoje quão relevantes foram ás iniciativas deste grande Brasileiro para a vida de nosso pequeno torrão natal de nome Brejo das Almas. 

Na política, combativo e atuante vereador e secretário na Câmara de Montes Claros, entre outras ações de cunho social, foi o autor e redator do projeto que se converteria na lei 843 que tornou o Brejo das Almas Município independente. Farmacêutico, exerceu com dedicação e generosidade essa nobre arte em beneficio dos menos favorecidos. Médico sem diploma, muitas doenças diagnosticou em seu inicio recomendando ao enfermo procurar tratamento imediato em cidades com recursos. Foi de Antônio, o médico sem diploma, o primeiro diagnóstico de câncer na garganta do padre Augusto que depois mediante sua recomendação procurou o doutorzão diplomado João José Alves na bela MOC. Como escrivão de paz, ele colaborou na resolução de muitas pendengas que invariavelmente conduziam seus litigantes aos melhores termos. Orador eloquente, Antônio era capaz de levar ás lágrimas o mais duro coração. Em todo e qualquer evento ele era convidado para realizar a abertura e encerramento onde deixava fluir em dicção clara e didática perfeita os sentimentos arraigados no recôndito do mais puro e elevado saber. O Brejo das Almas que agora se chamava Francisco Sá não tinha um hino que o enaltecesse e identificasse. Professores e alunos lamentavam não ter um hino para cantar em homenagem a jovem beldade do norte de Minas, quase adolescente, que recentemente havia se emancipado. Atendendo ao clamor da professora Maria de Jesus Sampaio coube a Antônio escrevê-lo, brindando a todos nós, Brejeiros que amamos esta terra com o mais lindo hino cuja letra foi musicada por Corinto Cunha, também poeta e amigo de Antônio: 

-“Brejo das Almas ou Francisco Sá... Igual a ti, outro não há...”.

Lembram-se?

Pois é.

Depois de todas essas dicas e deste extenso preâmbulo não é possível que você ainda não saiba a que Antônio me refiro. A menos que você não seja Brejeiro. Nessa condição você estaria desculpado. Mais se você nasceu no Brejo, mesmo não vivendo lá assim como eu, você teria a obrigação de saber de cor e salteado quem foi esse sujeito.

Antonio Ferreira de Oliveira era “Niquinho Farmacêutico” no Brejo das Almas ou “Niquinho Açúcar” como era conhecido em Montes Claros, onde também era farmacêutico.

Niquinho Farmacêutico pode ser considerado um dos grandes expoentes do velho Brejo das Almas. Conseguiu, neste torrãozinho de meu Deus, colocar em prática todos os atributos com os quais a Divina Providência o dotara. Exerceu todas as suas atividades sempre voltadas para a benevolência e crescimento do Brejo e de sua gente. Mesmo assim conseguiu amealhar com toda a sua honestidade, razoável patrimônio que, no entanto, não muito afeito as coisas materiais e, principalmente, pelo vicio do alcoolismo que infelizmente adquiriu, veio a falecer desprovido de bens materiais na residência de sua filha amada e do genro querido. Levou consigo a maior riqueza. A certeza plena de que enquanto neste mundo peregrinou ofereceu a todos indistintamente o seu melhor sem em momento algum pedir algo em troca. Doou-se por inteiro aos que dele necessitavam e com isto partiu feliz não obstante o sofrimento imposto pela doença.

E tenho dito.

*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo.

Vem ai, Feliciano Oliveira. Não percam!