sexta-feira, 7 de agosto de 2015

O BREJO E SUA GENTE VIII - JOÃO BAWDEN



O BREJO E SUA GENTE VIII – JOÃO BAWDEN


*Enoque Alves Rodrigues


Quando em março de 1931, Jacinto Silveira passou ás mãos do médico Paulo Cerqueira Rodrigues Pereira a direção do município de brejo das Almas depois de sua nomeação pelo presidente Olegário Maciel, pouco ou quase nada se sabia do indicado, na verdade, até aquela ocasião, um médico de renome em Belo Horizonte. Realizou, no entanto, uma eficiente administração não obstante ter presidido o município por apenas oito meses quando foi transferido na condição de médico leprólogo, para a Colônia Santa Izabel, em Belo Horizonte. Assim sendo faço aqui este sucinto relato apenas para registrar sua passagem pela Prefeitura do Brejo em virtude do muito que realizou não obstante o pouco tempo que a ocupou. Construção do matadouro ás margens do rio são domingos, inicio do nivelamento das ruas e praças, reparos nas estradas que dão acesso ao interior do município, fiscalização do ensino, reforma do cemitério, etc., são algumas obras de sua bem-sucedida administração.

Nascido no século 19, durante o império, filho do médico, político influente (quatro vezes governador do estado de Minas) e minerador Doutor Antônio Teixeira de Sousa Magalhães e de dona Maria Angelina Bawden, os barões de Camargo, uma das mais ricas famílias da cidade de Mariana, em Minas Gerais, João Bawden Teixeira teve onze irmãos e desde a infância já trazia no sangue o vírus benevolente da mais pura e tradicional política mineira, na qual fora introduzido pelo pai, onde a palavra dada sobrepunha a todo e qualquer documento. Ainda adolescente matriculou-se na Escola de Minas, berço da nata abastada, em Ouro Preto, de onde saiu após se formar Engenheiro Geógrafo, com 23 anos de idade. Muito tempo depois se transferiu para Montes Claros onde juntamente com os coronéis João Martins da Silva Maia, Virgílio Machado e os engenheiros José Bawden Teixeira (seu irmão), Nelson Washington da Silva e ele João Bawden Teixeira fundaram nesta Cidade a empresa de engenharia Maia, com a qual construiu centenas de quilômetros de estradas de rodagens sertão á dentro, quando, finalmente, por mera casualidade, ou seja, quando realizava levantamentos topográficos por uma “picada” quando menos se esperava, viu-se em pleno centro de um simpático povoado pelo qual de cara se apaixonou. Era o Brejo das Almas com o seu famoso amontoado de pequenas casas e empoeiradas ruas. Ali ele passou a residir “de passagem”. Assim nós mineiros definimos as localidades aonde nos encontramos em trânsito por que não pretendemos fixar residência, mas, que no caso do Dr. João Bawden tal colocação não funcionou, por que a cada dia que se passava tornava-se cada vez mais potente o seu amor pelo Brejo ao ponto de lá permanecer do final do ano de 1930 até o dia da sua morte ocorrida dois dias antes do Natal de 1937.

Na introdução do meu livro “O Brejo das Almas em Crônicas” faço um pequeno passeio pelas origens das mais tradicionais famílias que residem no Brejo das Almas, hoje Francisco Sá. Como a maioria dos sobrenomes que povoam até os dias atuais o Brejo das Almas descende de Ouro Preto, Vila Rica e Mariana, o Doutor João Bawden Teixeira também acabou por se juntar a essas famílias no Brejo. Tornou-se amigo incondicional do coronel Jacinto que em virtude do agravamento do mal de Parkinson já estava se afastando da política, assim como do atual prefeito, o médico doutor Paulo Cerqueira Rodrigues Pereira e das mais importantes forças políticas regionais. Quando o Doutor João Bawden tomou conhecimento do afastamento do prefeito Doutor Paulo Cerqueira correu até a casa do coronel Jacinto solicitando-lhe, com humildade, que o indicasse como substituto do Doutor Paulo Cerqueira de quem ele era admirador pela maneira como conduzia a gestão do município e pela forma arrojada de trabalhar, salientando, ainda com modéstia, suas experiências como engenheiro e que pretendia, com toda sinceridade, dar continuidade aos projetos iniciados pelo Doutor Paulo Cerqueira bem como empreender novas benfeitorias no sofrido município. Várias vozes se levantaram contra o pleito do Doutor Bawden. Ninguém ali conhecia o seu passado. Também pudera: O doutor Bawden não era do lugar e acabava de ali chegar. Estou me referindo ao final do ano de 1931. Sequer imaginavam que por trás daquele homem riquíssimo apesar de aparência simples, existia uma longa e muito bem consolidada carreira politica que começou ainda jovem, em Mariana, como vereador, passando por todas as escalas, de maneira que em 1903 já era senador da República recentemente proclamada por Deodoro, em 1889. As lideranças politicas locais encontravam-se “rachadas” pau a pau ou meio a meio como queira. O fiel da balança ali estava difícil de achar e a tal “metade e mais um” que decide tudo em nossas vidas ali não se manifestava. Escafedeu-se. Não dava o ar da graça. Jacinto apenas endossou o desejo do Dr. João, mas, como eu já disse doente, não se envolvia mais com política. Á favor, Sebastião Bessa e seu grupo puxavam de um lado, enquanto que do lado contrário o grande Rogério da Costa Negro e seu grupo também puxavam com vontade. O argumento de Rogério era robusto e indestrutível: O doutor João Bawden que havia nascido em berço de ouro em local distante era pouco afeito ao trabalho e não cumpriria com suas promessas por que era demasiado boêmio e não seria responsável o suficiente para zelar pelas coisas do município.


Rachados e intransigentes entraram todos para a reunião promovida no Brejo das Almas pelo Partido Republicano Mineiro em casa do próprio Sebastião Bessa e depois de acirrada discussão Rogério da Costa Negro ainda se mantinha irredutível em sua posição. Foi quando alguém ali temeroso por entregar ás rédeas do destino do município em mãos estranhas, para surpresa de todos os presentes, surgiu em meio aquela reunião, ostentando um empoeirado exemplar do Jornal “Liberal Mineiro”, da Cidade de Ouro Preto, pertencente ao Partido Liberal, que em sua edição de número 93, do dia 16 de agosto do ano de 1884, na “seção parlamentar” do dia 07/08/1884 se registrava, clara e evidente, a seguinte menção honrosa alusiva ao “desconhecido” doutor João Bawden: “é dotado de sentimentos de nobreza e dignidade. É essencialmente caritativo, amigo sincero e extremado, está sempre pronto a acudir (socorrer) com prazer a voz da amizade e aos reclamos da pobreza de quem ele é um firme sustentáculo (benfeitor). Como as sementes, os grandes sentimentos precisam de terrenos e estações próprias para vingar e florescer no coração do nosso magnânimo e ilustre democrata, que é um sacrário de virtudes e por isso florescem exalando perfume nos corações que sabem conhecer a altura dos seus merecimentos...”.


Era só o que faltava. Contra fatos não há argumentos já dizia uma sábia raposa da politica mineira de nome José Maria. As forças agora se alinhavam em torno de João Bawden que acabou tendo o seu nome referendado como prefeito substituto do Brejo das Almas em Janeiro de 1932, consecutivamente.


Quando Vargas determinou eleições gerais constitucionais o Dr. João Bawden diante do muito que havia realizado pelo Brejo das Almas foi aclamado e eleito pelo povo prefeito constitucional. Mesmo após o Presidente Getúlio Vargas a 10 de Novembro de 1937, consumar o golpe de estado que lançou o País numa ditadura cruel e sanguinária e depois de promover uma verdadeira caça ás bruxas, com milhares de prisões e destituições violentas de políticos guindados constitucionalmente ao poder pelo voto popular, não encontrando no Brejo das Almas nada que desabonasse a conduta imaculada e transparente do prefeitão “bom de trampo” Doutor João Bawden, não lhe restou nenhuma alternativa que não fosse confirma-lo no cargo de prefeito que já ocupava. Infelizmente, agora, pouco tempo ele teria naquela nova gestão, porque vitimado por um ataque de angina veio a falecer no cargo no dia 23/12/1937 quando foi substituído pelo Dr. Arthur Jardim de Castro Gomes, aqui já retratado. Como justa homenagem ao homem que tanto dignificou a nossa terra o povo Brejeiro exigiu que o seu corpo nela fosse sepultado.


Hoje, ao ver em meu Brejo das Almas, ruas e praças com suas placas ostentando o nome do Doutor João Bawden eu me pergunto: qual seria, ao certo, a porcentagem de Brejeiros locais que saberia resumir em poucas palavras a importância que teve este nome para a nossa cidade?


Acredito que poucos.


E tenho dito.


*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo.

sábado, 4 de julho de 2015

O BREJO E SUA GENTE VII - GERALDO TITO



O BREJO E SUA GENTE VII – GERALDO TITO

*Enoque Alves Rodrigues

Escrever alguma coisa sobre alguém com quem, de certa forma, tivemos, ainda que esporadicamente, algum contato visual em algum lugar do passado, não é fácil. As dificuldades se multiplicam por mil à maneira que a pessoa que desejamos nos referir, em singela homenagem, tenha vivido intensamente ao transformar cada minuto de sua existência terrestre relativamente longa, em produzir. Produzir e produzir. O personagem que reverencio neste mês de Julho-15 não desperdiçou um segundo sequer da vida que Deus lhe deu com algo que não fosse útil. Transitou com inteira cadência e desenvoltura por todos os patamares da vida, tendo se destacado em todos, mas, principalmente no campo do intelecto, onde com humildade, proficiência, elegância e maestria grande e valioso legado nos deixou, suficiente para nos orgulharmos dele e pela oportunidade que tivemos de sermos seus conterrâneos.

Geraldo Tito Silveira, Coronel, Escritor, Político, Professor, Delegado, Historiador, Jornalista, Diretor, Filantropo, Espírita Kardecista Vidente, era um dos filhos de Jacinto Silveira, fazendeiro e político e de Maria Luiza Silveira, normalista do outrora povoado de Brejo das Almas, hoje Francisco Sá, MG, onde nasceu no dia 06/02/1917 e desencarnou em Montes Claros no dia 18/12/2005 de causas naturais, com quase 89 anos.

Aos sete anos matriculou-se no Grupo Escolar de Brejo das Almas onde sua mãe era professora de onde saiu aos doze anos depois de se formar no curso primário para ir estudar em Montes Claros, no Ginásio Diocesano. Ao concluir o curso ginasial então com 16 anos partiu para Belo Horizonte onde mergulhou por inteiro nos estudos e no trabalho, iniciando-se na Capital das Alterosas profícua produção literária ao mesmo tempo em que galgava patentes na policia mineira, onde, aos 24 anos tornou-se oficial aspirante e na sequência oficial de gabinete, coronel, delegado e outros cargos e estrelas que com meritocracia inquestionável, resultado de muito trabalho, dedicação e esmero, conseguiu amealhar. Como delegado especial atuou em várias cidades de Minas, inclusive, em sua cidade de nascimento Francisco Sá aonde posteriormente veio a ser também prefeito, exercendo, respeitosa e dignamente as atribuições que este cargo requer, sempre pautado pela retidão de caráter, justiça social, honestidade e austeridade, auferindo ao erário municipal recursos jamais dantes aportados, sem em nenhum momento se descuidar do exercício altivo e persistente das ações empreendedoras em resposta ás necessidades dos munícipes carentes. Destacou-se, enquanto prefeito de Francisco Sá, pela atenção especial e prioritária que dispensou ao ensino público ao dotar as escolas de razoável estrutura física desde o seu mobiliário, além de estabelecer um calendário de reciclagem do corpo docente levando levas imensas de professores de volta aos bancos escolares em cidades vizinhas como, Montes Claros, Porteirinha, Monte Azul, entre outras, de onde retornavam com currículos turbinados, mais preparados para reassumirem suas funções só que agora, promovidos e remanejados para outros distritos do grande município, mediante melhores salários e condições de trabalho.

Jornalista e Redator dos bons por mais de 50 anos, daqueles que possuíam em um velho caderno capa dura, nomes, endereços e telefones das mais importantes figuras da República de então, jamais se deixou levar pela ansiedade do furo da notícia antes de checar as fontes e muitas vezes consultar o próprio noticiado. Geraldo Tito Silveira escreveu para vários jornais, entre eles, o Estado de Minas, Hoje em Dia, Diário da Tarde, Diário de Minas, O Globo, Jornal do Brasil, além dos jornais de Montes Claros, como O Diário, Jornal do Norte e Jornal de Notícias. Foi diretor-superintendente do Jornal do Norte, de 1983 a 1984. Escreveu para inúmeras revistas e mereceu críticas extraordinárias de jornalistas e Redatores famosos em sua época.

Como escritor, foi o melhor que o norte de Minas já produziu até os dias de hoje. Ninguém melhor que o Cel. Tito conseguiu decifrar com tanta riqueza de pormenores a alma do caboclo brejeiro, seus costumes, suas crenças e seus anseios. Sua produção literária é robusta e imbatível. Convivi com ela em infância e posso assegurar o quanto agregou ao meu saber. Tenho o privilegio de possuir ainda hoje 14 livros, garimpados com muito suor em sebos Brasil a fora, dos 24 que compõem sua obra literária publicadas em vida, e outra após sua morte, sem contar as inéditas no total de 10 a serem publicadas. Os livros escritos por Geraldo Tito são enciclopédias balsâmicas de viagens no tempo. É possível a qualquer um visitar o antigo Brejo das Almas com suas estreitas e empoeiradas ruazinhas de chão batido, seu folclore e seus personagens da época sem sair do lugar apenas lendo pérolas como “O Padre Velho”, “Lembranças Antigas do Brejo das Almas”, “A família Silveira de Brejo das Almas”, etc., tamanha é a autenticidade de sua narração. Já o antigo Egito pode ser visitado nas páginas de “Memórias de Cláudia Prócula” ou “Pôncio Pilatos”. “Conversa de Meganha”, “Crônica da Polícia Militar de Minas Gerais”, “Os Milicianos da Capitania do Ouro”, “Tocaia de Bugres”, etc., nos remetem aos fatos e costumes praticados pela polícia mineira em várias épocas. Espírita Kardecista praticante, convicto e fervoroso, Geraldo Tito Silveira brindou á comunidade espírita, da qual faço parte, com importantes obras como “O Evangelho Segundo Judas”, “Fumaça de Satanás”, “Os Litostrótos”, “O Salto no Tempo”, “O Clero da Foice e do Martelo”, etc.

Geraldo Tito Silveira recebeu muitos prmios e horarias em vida, que, no entanto, apesar de indiscutíveis valores literários e exaltação ao saber, ficaram muito aquém do jus merecido. Ele foi realmente um homem muito além de seu tempo. Foi membro da Academia Municipalista de Letras, Academia Montesclarense de Letras, Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e acadêmico fundador da Academia de Letras João Guimarães Rosa, da Polícia Militar de Minas Gerais e chefe de segurança das Usinas Malvinas.

Geraldo Tito Silveira foi casado com a professora Maria José Nunes Silveira com quem teve seis filhos. De seu segundo casamento com dona Maria de Fátima Oliva Silveira teve apenas uma filha. A seu respeito escreveu o grande poeta e intelectual, Cândido Canela: “Conheço Geraldo Tito Silveira desde os tempos de calças curtas. Ao contrário do que muitos pensam, trata-se de um homem de bom coração, caridoso, cidadão correto, militar digno de seus galões, espírita kardecista convicto, excelente esposo, pai e avô amorozíssimo.”. Por ter lidado com oligarquias que queriam dobrá-lo pela força da autoridade e do dinheiro e com pessoas que o ameaçavam, através de armas, por circunstâncias de sua própria profissão, ele desenvolveu uma couraça de brabeza. Entretanto, prova das palavras de Cândido Canela foi o fato de ter deixado, por onde passou dezenas de afilhados, filhos de soldados, cabos e sargentos, que sempre o amaram e respeitaram muito.

Depositário fiel das mais puras e relevantes virtudes humanitárias que nem mesmo a vida dura de caserna ou a dor da injustiça e padecimento por longa doença do pai conseguiram abalar, Geraldo Tito Silveira é o nosso grande exemplo de que o que é bom já nasce feito e que as dificuldades da vida de cada um de nós só devem servir para nos tornarem cada vez melhores. Que a mais sólida lembrança que podemos deixar de nós mesmos é a do saber com humildade. Herança esta que transitoriedade nenhuma consegue apagar.

E tenho dito.

*Enoque Alves Rodrigues é brejeiro.

Vem ai, Feliciano Oliveira. Não percam!

quinta-feira, 4 de junho de 2015

O BREJO E SUA GENTE VI - EURICO PENA



O BREJO E SUA GENTE VI – EURICO PENA


*Enoque Alves Rodrigues


Seguindo com a série mensal que tem por objetivo reverenciar de maneira singela, alguns de nossos antepassados Brejeiros de relevância maior que se destacaram na história de nossa cidade pelo muito que por ela realizaram e que com lisura de caráter, sólidas iniciativas sociais, político-administrativa, souberam dignifica-la, ao levar adiante suas gestões com transparência, honestidade, dedicação e equilíbrio sempre privilegiando aqueles que mais necessitavam, preservando, imaculadamente, suas respectivas biografias as quais escreveram com naturalidade, despretensiosamente, etc. 


O meu retratado de hoje pertence a uma contemporaneidade recente e é possível que muitos dos poucos que ainda me leem devam ter com ele cruzado um dia em nossa querida Francisco Sá. Sim, o período ao qual me reporto não é o do Brejo das Almas. Aliás, ele apenas “nasceu no Brejo onde viveu até os 24 anos”. Mas, fez-se homem, político e importante mesmo em Francisco Sá pela qual trabalhou arduamente. Se você não é conterrâneo te informo que Brejo das Almas e Francisco São uma mesma Cidade. Pronto: poupei-lhe do trabalho de recorrer á “Wikipédia”. Isto posto, vamos em frente!

Eurico Pena da Silveira é o nobre personagem que ilustra esta minha crônica de Junho exatamente por canalizar em torno de si todas as referências positivas e virtudes singulares das quais grandes castas de gestores públicos atuais a cada dia se distanciam. Por motivos que imensa parte das inteligências medianas não alcança competência, dedicação e honestidade são virtudes que levas consideráveis de gestores não conseguem coadunar. Esforçam-se, é verdade, por vezes, chegando até mesmo a jurar sobre a Bíblia que independente das circunstâncias que venham a enfrentar seguirão firmes e fortes na defesa de seus princípios lastreados por este trinômio, mas, lamentavelmente, ao tomarem posse de nosso erário se esquecem de que de nada adianta ser competente e dedicado se não for honesto o suficiente para resistir ás tentações do dinheiro fácil. Dureza mesmo para eles, garbosos, faceiros e lisos como o quiabo, somente o “drear” (assim falamos no Brejo), “por que desce macio e reanima”. Tomou?


Dedicado, competente e honesto. Empreendedor nato e tocador de obras, assim era Eurico Pena que por duas vezes esteve á frente da Prefeitura de nossa querida cidade de Francisco Sá onde se destacou pela quantidade de obras que realizou. Muitas delas, inclusive, se encontravam com os seus projetos engavetados há dezenas de anos. Conheci de perto, o grande Eurico, sobre o qual fiz um pequeno relato primeiro, acredito, há alguns anos atrás em crônica intitulada “Assim Era Francisco Sá – Jardim Público Municipal”, na qual descrevia a inauguração desta obra, projetada por outro prefeitão, o Dr. Arthur Jardim.


Eurico Pena da Silveira nasceu no Brejo das Almas, hoje Francisco Sá, Minas Gerais, em 07/05/1914, ao pipocar da primeira guerra mundial. Filho de dona Joana Alves da Silveira e de Tiburtino de Oliveira Pena enveredou-se, muito cedo pelos campos das artes e da política tendo sido contemporâneo de grandes vultos da política local. Foi prefeito de Francisco Sá em plena ditadura militar, em dois períodos distintos, de 01/02/1967 a 31/01/1970 e de 01/02/1973 a 31/01/1977. Não obstante as dificuldades naturais por que passavam o Brasil devido ao regime de exceção e principalmente o norte de Minas onde se localiza a nossa cidade, em meio ao polígono da seca, as administrações de Eurico Pena da Silveira foram todas elas cobertas por grandes realizações pautadas no “bom e barato”. Realizou-se muito com pouco dinheiro. Em sua primeira gestão (1967/1970) Eurico elegeu como prioridade revolucionar o perímetro urbano do Município onde construiu prédios, praças, escolas, pontes, chafarizes e empedrou ruas inteiras além de fazer seus nivelamentos e corrigir seus traçados. Aos bairros de Francisco Sá, distantes, íngremes e sofríveis, além de estender essas benfeitorias, levou água e luz elétrica que até então não possuíam. Após embelezar nossa cidade, dotando-a de uma nova roupagem e semblante saudável, alegre e amistoso, Eurico, agora, voltava a sua segunda gestão (1973/1977), progressista e eficiente, para as zonas rurais deste imenso município composto, então, por distritos cujo índice de analfabetismo, crescimento social e miserabilidade haviam desafiado vários antecessores e suas administrações, que pouco ou quase nada conseguiram avançar. 


Calçando botas de couro canos longos e usando calças rústicas do tipo “arranca toco” e camisa de morim batido, transportado por uma velha “rural bandeirante” dessas que sobem em serras, Eurico supervisionava pessoalmente as obras nos mais longínquos distritos. Acompanhava tudo de perto. Nesse diapasão, graças a sua coragem e empenho construiu inúmeras escolas em zonas rurais inóspitas para onde também levou estradas e pontes que agora ligavam aqueles pequeninos núcleos marginalizados por desditas anacrônicas, ao centro urbano de Francisco Sá, onde respiravam os seus iguais, em melhores condições de civilidade. O matuto brejeiro teve sua honra e dignidade restabelecidas por Eurico que para isto nenhum esforço mediu.


Na cultura, mexeu na grade escolar instituindo turnos distintos além de reforçar a merenda da gurizada. Incentivador incansável do folclore do lugar. “Festeiro, convicto, participava de todas as comemorações brejalminas que ocorrem, quase sempre, no mês de setembro, quando se homenageiam a “um milhão de santos em cada dia”“. Presença marcante nos catopés. Nas artes, patrocinava compositores e cantores, principalmente aqueles que enalteciam as coisas de Francisco Sá. Na literatura bancava escritores e suas publicações nem sempre bem-sucedidas, etc.


Grande baluarte da boa política brejeira que praticava em prol do bem comum sem jamais utiliza-la em benefício próprio. Nascido em famílias de tradições política e religiosa secular na vida de Francisco Sá, Eurico Pena da Silveira, criança ainda, não teve dificuldade em escolher o caminho que seguiria ao crescer. Seria político assim como os seus ancestrais. Mas não seria um político qualquer. Tentaria, dentro do possível, ser igual ou próximo ao velho Jacinto, falecido em 1938. Queria prefeitar. Desejava, humildemente, colocar um tijolinho nas paredes de seu Brejo das Almas ou Francisco Sá. Acabou por erguer muitas paredes nas quais se encontram gravado o seu honroso nome em letras indeléveis que o tempo, senhor absoluto da razão, merecidamente, insiste em reluzir, não obstante a sua ausência física já longeva, efetivada que foi em 27/05/1993.


Eurico Pena da Silveira. Esse é o cara do qual todos nós brejeiros temos motivos mais que suficientes para nos orgulharmos. Viveu em uma época aonde a lei do mais forte prevalecia e aqueles que detinham o poder o utilizavam para massacrar os mais fracos e alimentar seus próprios egos. Eurico Pena enfrentou todas as dificuldades “tirando leite de pedra” sem jamais se esquecer dos menos favorecidos para os quais governava, não obstante vir ele de família de posses. O que é bom já nasce feito. E fim de papo.


E tenho dito.


*Enoque Alves Rodrigues nasceu no Brejo.


Vem ai, Feliciano Oliveira. Não percam!