sábado, 26 de novembro de 2011

SOBRE O BREJO DAS ALMAS – O COMÉRCIO DE ANTIGAMENTE

SOBRE O BREJO DAS ALMAS – O COMÉRCIO DE ANTIGAMENTE

Enoque Alves Rodrigues

Desnecessário seria recorrer as quase duas mil crônicas que escrevi até hoje sobre o Brejo das Almas, para me certificar de que já me referi, parcialmente, por mais de uma vez, ao tema que dá titulo a minha crônica deste final de semana. Porém, não obstante reunir modesto cabedal de conhecimentos sobre isso, jamais fiz uma alusão mais profunda e compatível com a importância que o assunto requer e merece. Assim sendo, futuramente entrarei nesse tema, pormenorizadamente, com citações nominais dos comerciantes e seus respectivos perfis, endereços de seus comércios, ramo de atividade e muitas outras particularidades comerciais do Brejo das Almas de antigamente. Com isso, muitos saberão que até chegar a Casa Viena, Casa Branca e Costa Negro, de saudosa memória, para não citar os atuais, a distância percorrida foi muito grande. 

É difícil até mesmo para alguns moradores do Brejo atual, diante da grande efervescência do comércio local, acreditar que não faz tanto tempo, o escambo era uma das principais moedas de troca no Brejo das Almas. O meu avô, por exemplo, que viveu quase cem anos, muitas vezes teve que recorrer a esta modalidade, praticada pelos antigos Egípcios e todo o mundo civilizado há alguns milênios antes do nascimento do Crucificado. A numismática inexistia. Não haviam moedas cunhadas com valores monetários predefinidos, senão o dar um bem em troca do outro. Mesmo após a invenção da moeda na Lídia, um território da região ocidental da Ásia Menor, hoje pertencente à Turquia, no Século VII, a. C., esses costumes permaneceram arraigados nas entranhas da humanidade. No Brejo, então, não era diferente.

Quando o Brejo se achava em crise, e isso acontecia com frequência ou sempre que as secas grassavam os sertões do Norte de Minas, o povo ficava inteiramente descapitalizado. Nesse caso, o jeito mesmo, meu nego, era munir-se de uma cuia do mantimento que dispunha em casa e sair pelas ruas rezando e implorando ao São Gonçalo para encontrar alguém que  não o tivesse. Ou melhor, que tivesse outro diferente do seu, para que houvesse o mutuo interesse da troca por necessidade. É a lei da oferta e da procura só que de uma forma meio as avessas, entendeu?

Pois é, se o Cidadão Brejeiro estava sem capital, ou seja, sem dinheiro, sem grana, não tinha como azeitar a máquina que girava e fazia girar em torno de si todas as coisas e o comércio de antanho. Ai a gritaria era geral. O desespero tomava conta de todos, inclusive dos comerciantes. Tinham que desovar os seus estoques de qualquer jeito para fugirem de uma perda total, pois os carunchos, famintos, não perdoavam nada, vinham detonando tudo que encontravam pela frente.

França tinha um comércio cujo ramo de atividade passava a milhões de anos luz de distância dos famosos secos e molhados. Dos comestíveis. Dos mastigáveis. Dos sossegam lombrigas e protozoários. O querido França militava no ramo dos “bebíveis”. Não, bebum, não era aguardente, não. França vendia remédios como injeções, comprimidos, xaropes, garrafadas, rui barbo e bicarbonato para o estômago, etc., serve pra você? Ele tinha uma farmácia que ficava na esquina do antigo Largo da Matriz, bem próximo de onde hoje se localiza a agência do Banco do Brasil. Nos fundos da farmácia, França, curiosamente, mandou construir dois inusitados cercados, sendo um com tela de arame e o outro só com madeira. O primeiro logo ganhou ares de galinheiro, já o segundo, como não podia deixar de ser, transformara-se em um grande e luxuoso chiqueiro. Esses compartimentos eram utilizados a guisa de cofre. Sim, era lá que França guardava as férias do dia, semanas, meses e anos.

Cenas que hoje deixariam qualquer um estupefato, sem nada entender ou até mesmo sair correndo, ali, sem quaisquer surpresas ou constrangimentos, aconteciam, naturalmente. Raciocine comigo: suponhamos que você esteja dentro de uma farmácia e de repente entra alguém com uma galinha, um porco debaixo do braço ou um bornal com milho, feijão ou arroz. Coloca aquilo sobre o balcão, puxa do bolso de trás uma receita em papel amassado e vai logo dizendo para o Farmacêutico: “Mecê tem esse rumédio ai pra ieu?” Diante da resposta positiva, lhe pergunta: “Isto custa quantas galinhas?”... “Quantos porcos?”... Ou “quantos quilos de feijão?” Pois é, os que me conhecem sabem perfeitamente que não tenho o vezo da hipérbole. Por isso, creiam-me, sinceramente, que era mais ou menos isso que acontecia no Brejo das Almas de então.

França era um ótimo sujeito, mas agora andava meio chateado com sua clientela que, por não ter feito uma previdência que lhes propiciasse um pouco de tranquilidade na doença, vivia agora abarrotando seus cercados com todo tipo de animal. O ruim de tudo isso era que aquele tipo de moeda, o pobre França, por mais que tentasse, não conseguia repassar aos seus fornecedores de Montes Claros. Para os caras dos laboratórios, porco, galinha, feijão, arroz, milho e outras “guloseimas mais”, só interessavam mesmo depois de cozidos, e no prato. Preferencialmente, se possível, por que ninguém é de ferro, na boquinha. Só aceitavam o pagamento em dinheiro ou então em notas promissórias com juros altíssimos.

Necessidade é que faz o sapo pular ou então, quando a água bate na bunda neguinho pula, são ditos da sabedoria popular. Mas cuidado, pense mais e fale o mínimo possível. Não se esqueça de que a língua é o chicote da bunda, dirão outros. França pensou... França refletiu. França tinha que tomar uma providência urgente senão a falência seria inevitável. Mas ele, bondoso, não queria chocar a freguesia. Ele precisava dela. Depois, como ficaria o “remedin” pra combater o paludismo do “brejerin” com a pancinha cheia de “bichin?” Não, definitivamente ele não cometeria uma atrocidade dessas. Brasileiro pensa. Mineiro matuta. Brejeiro pensa e matuta, ao mesmo tempo. Tinha que haver uma saída... Havia.

Naquele tempo, Jacinto que era seu compadre, dava expediente na Prefeitura. A farmácia de França ficava exatamente no trajeto, que Jacinto fazia três vezes ao dia, pois almoçava em casa. Numa dessas passagens, França, desesperado, chamou-o:

- Compadre!

- Pois não. Respondeu-lhe o Coronel Jacinto, sempre educado, cordial e solícito.

- Já não sei mais o que fazer compadre. Não posso mais aceitar porco, galinha e mantimentos como forma de pagamento. Os meus cercados estão cheios. Se eu continuar assim vou quebrar. Mas também não posso deixar o povo sem remédio. O senhor precisa me ajudar!

Jacinto, homem prático, de raciocínio rápido, desses que em fração de segundos cria, amadurece e executa uma idéia, ali mesmo, sobre o balcão da farmácia, pegou sua pena e num papel timbrado escreveu em letras garrafais: “Com o único objetivo de zelar e preservar a valiosa saúde do povo brejeiro, com o intuito exclusivo de evitar propagação de doenças e pestes eventuais, inerentes ás espécies suínas e ovinas, porcos e penosas, proíbo, a partir de hoje, qualquer forma de pagamento de remédios mediante tais modalidades”.

Depois de assinar, entregou o papel para França com a recomendação: “Aqui está compadre, a solução para o seu problema. Pegue isso e cole na frente da farmácia. Quando alguém chegar com porcos e galinhas, basta o senhor mostrar o cartaz. Como a maioria não sabe ler, diga que o papel lhe proíbe de vender remédios para receber de outra forma que não seja em dinheiro vivo”.

É...

Por vezes diz a sabedoria popular, quem tem padrinho não morre pagão.

Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur

sábado, 19 de novembro de 2011

SOBRE O BREJO DAS ALMAS – PERGUNTAS E RESPOSTAS

SOBRE O BREJO DAS ALMAS – PERGUNTAS E RESPOSTAS

Enoque Alves Rodrigues

"AONDE Ó LIBERDADE O SOPRO EXPANDES, EU QUIZERA VOAR, CONDOR DOS ANDES."

Tenho sido indagado com freqüência a respeito do paradeiro de alguns personagens por mim elencados neste espaço desde os idos de 2004, quando ainda publicava no extinto site da Abril, minhas crônicas quinzenais sob o titulo “gente, causos e coisas do brejo”. Confesso não dispor hoje da menor noção de onde alguns deles se encontram. É quase certo que a maioria assim como eu, já se mudou do Brejo ou, quem sabe, já esteja no andar de cima o que não significa absolutamente que  a minha permanência, ainda neste plano, seja por hora extra.

Ainda que alguns menos avisados insistam, ou quiçá, propositadamente, pelo simples dom da retórica fácil ou para polemizar, sou nascido e registrado no Brejo, mas lá vivi por pouco tempo. Não obstante os fortes laços que me prendem a terra mãe que me serviu de berço na atual encarnação e que orgulhosamente divulgo há muito tempo, não tenho hoje no Brejo, pelo menos que eu saiba, nenhuma  relação de parentesco. Fisicamente, como já disse por mais de uma vez, ninguém lá me conhece. Ando pelas ruas do Brejo das Almas sem ser notado. Aliás, há sensação mais gostosa do que você  ser tratado como estranho em sua própria terra? Você já teve alguma vez o seu momento de espírito invisível? Pois é!  Você vê, mede, observa e aprecia todos que estão a sua volta e eles o ignoram inteiramente. Não lhe vêem ou pelo menos, fingem que não estão nem ai pra você. Quando você os fita nos olhos, eles, simultaneamente, desviam o olhar para o nada dando a impressão ser o nada mais importante que você. Isso geralmente ocorre com pessoas simples e naturais, cuja presença, no meu caso, não desperta qualquer interesse ou curiosidade aos demais. Não que eu não me ache bonito, claro, sou muito lindo, os outros que insistem em não me notar. Paciência! Rsrsrsrs.

Saudoso dos meus familiares que vivem em Burarama e do Brejo querido, aproveitando uma rara folga de agenda, estive recentemente no Brejo. Desta vez, ao contrário das vezes anteriores, estava tudo limpinho e arrumado. Chamou-me a atenção especialmente a quantidade de reformas prediais. Bacana.

Entro numa Padaria, na Alameda, peço um café com leite e  pão, que me são servidos em um copo de vidro, desses onde costumam servir “a mardita” aos bebuns. Sigo um pouco adiante, saio da Alameda e entro numa Quitanda, onde, segundo as “más línguas”, são vendidos os mais saborosos e bem preparados pãezinhos de queijo do Brejo. Compro um pacote deles; ainda estão quentinhos. Sou tomado por um arrependimento repentino: Diabos, se eu tivesse esperado alguns segundos mais, poderia agora estar saboreando estes pãezinhos de queijo com o café com leite que acabei de tomar lá na Padaria. Passo diante da Igreja do Padroeiro. Fico ali parado por algum tempo imaginando como foi difícil aos caros colegas de épocas remotas, projetar e construir este templo. Verdadeira obra arquitetônica. Pesquisas me levaram a conhecer tanto sobre a história desta igreja, de sua fundação até o acabamento, assim como o pessoal efetivo envolvido em sua construção, atas, inauguração, primeira missa, nome do padre que a celebrou, etc. No entanto, tudo isso é insuficiente para conter minha admiração e encantamento por ela, toda vez que em sua frente me posto. É como se fosse a primeira vez. Mais adiante, deparo-me com a estátua de Feliciano. Meu Deus, estou ficando velho. Conheci esse cara em vida! Fui, em infância, a vários comícios dele só para ouvir o seu lindo palavreado e comer churrasco de espeto de valeta. São aqueles espetos que eram assados sobre uma enorme vala aberta no chão, onde deitavam brasas incandescentes. Como falava bem este homem a quem o Brejo tanto deve. Conhecedor dos mais comezinhos anseios populares, domínio completo do vernáculo de Luiz Vaz, o Camões, articulação impecável, dicção e tonalidade de voz que beiravam a perfeição, aquele cara inflamava as massas com seus discursos inesquecíveis. Agora, restava ali, a minha frente, apenas e tão somente, um reduzido amontoado de pedras e bronzes em cuja cabeça alguns pássaros atrevidos, diria, talvez por não terem sido informados do quão importante foi nosso Feliciano em vida, insistem em utilizar sua bela careca à guisa de aeroporto ou banheiro público. É a vida que passa lenta e silenciosa por aquelas plagas e por todo o canto, nos conduzindo, inexoravelmente, ao grande dia em que talvez, quem sabe, se fizermos um pouquinho do que ele fez, teremos também uma estátua em nossa justa homenagem, para a alegria da posteridade e, principalmente, dos passarinhos brejeiros que ganharão mais um aeroporto.

Cansado, mas com a alma confortada, após caminhar por quase todas as ruas e avenidas do Brejo,  visitar, solitariamente, as mesmas localidades dos tempos de infância,  deixo-o do mesmo jeito em que cheguei: Calado. Silencioso. Meditabundo. Tenho por costume não deixar que minha humilde presença interfira na vida pacata da Cidade e seus locais. Mesmo quando a visito acompanhado por alguém, procuro manter a discrição.  Ciente de que,  em muitas situações da vida,  basta apenas uma simples palavra minha para fazer com que as coisas fluam, no Brejo das Almas, ou próximo dele, na casa da minha santa mãezinha lá em Burarama, recolho-me inteiramente a minha verdadeira insignificância. Ali me sinto criança outra vez. Inclusive, dou-me o direito de fruir da mesma inocência imaculada dos quase pueris.

Voltando a falar dos personagens dos quais tive conhecimento dos respectivos paradeiros, lembro-me de Maria Quitéria, claro, como poderia eu esquecer? Mudou-se do Brejo para Curvelo, onde se casou. De lá foi para Porteirinha, onde vive. Quanto ao Badú, como todos sabem, ele me encontrou aqui em São Paulo em 1973, por coincidência, na mesma empresa. Casou-se com uma Paranaense, Dalva. Tem três filhos e já se encontra aposentado cuidando de sua empresa de prestação de serviços no bairro da Mooca, aliás, é meu vizinho. Mateus, Bicalho, Conceição Formosa e Antão, retornaram para Taiobeiras e Salinas de onde não tive mais noticias. Geraldino Fogueteiro I, Demóstenes e Manezim Vaqueiro, até onde eu soube, foram para Januária. Quanto aos demais, Zezim Tocador e seu Vazamundo, Francelino do Areal, Feliciano Sansão, Zé Rodrigues, Mateus Gordo, Geraldinho Mazzaropi, Maninho do Mocó, Manél de Vovó, Neuzão, Cláudio Lagôa Seca, Demétrius, Gedeão, Almeida, Maria Bocão, Roberto Carlos do Mato, Tininho, Chuteira, Pascomiro, Galdino, João Pretinho, Geraldo Magela, Boneca Preta, Mané Pezim, Katiússia e muitos outros, permaneceram no Brejo. Cabe, portanto, aos meus queridos conterrâneos locais nos informar de seus paradeiros. Outros que porventura não se encontram relacionados aqui, das duas, uma: ou a minha mente já cansada não conseguiu recordar ou, por motivos óbvios, os excluiram da lista física dos vivos, em reverência aos seus familiares, mantendo-os eternamente na lista indelével do coração.

E tenho dito!

Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur

sábado, 12 de novembro de 2011

A IMPORTÂNCIA DA MÍDIA ELETRÔNICA NA DIVULGAÇÃO DE FRANCISCO SÁ

Enoque Alves Rodrigues


De 2004 até 2009 mantive dois blogs hospedados em importantes sites da Editora Abril, aqui em São Paulo, hoje desativados. No primeiro, denominado “isto é espiritismo”, fazia a divulgação, sem proselitismos, da Doutrina disseminada por Kardec, na França, em 1854. Ali postava fotos, resultados de pesquisas realizadas por companheiros do caminho, como materializações, psicografias, passes mediúnicos, palestras, etc., além de relatar experiências adquiridas no curto convívio que tive com Chico Xavier, em Uberaba, no começo dos anos 70, quando  eu trabalhava na Mendes Jr.,  na construção da Usina Hidrelétrica de Volta Grande, na divisa de São Paulo com Minas. Já no outro blog, “gente, causos e coisas do brejo”, cuidava da divulgação de Francisco Sá, o querido Brejo das Almas. Naquele blog, escrevia minhas crônicas quinzenais, hoje vertidas para um livro, (Brejo das Almas em Crônicas), cujo original será publicado no próximo ano de 2012  e oferecido graciosamente às Bibliotecas do Norte de Minas, principalmente, a todos os Órgãos Públicos de minha Cidade de nascimento, a fim de se resgatar coisas e casos que de a muito julgávamos perdidos no tempo e no espaço. Postava também fotos e fragmentos de livros e jornais antigos, de uma época que de tão remota, fica até difícil acreditarmos ter existido. Todo esse acervo e muito mais que consegui garimpar de lá para cá, repousa, amarelado, em minha Biblioteca particular, onde a traça e o cupim não tem vez nem razão.

Quando em 2009 a Abril extinguiu aqueles sites após tê-los mantido por quase cinco anos no ar, jaziam, no registrador de visitas do “blog do brejo”, para minha total surpresa e decepção, apenas e tão somente a bagatela de 212 acessos. Uma ninharia, suficiente para desmotivar qualquer mortal que se propõe escrever algo. Pois, o mínimo que alguém, tonto como eu, que se atreve a escrever alguma coisa sem qualquer outra pretensão, espera, é que outros leem e, se possível, comentem o que se escreveu. Aliás, entendo que faz parte de uma boa educação, manifestarmos através de um simples recado ou comentário, toda vez que acessarmos a página de alguém. É uma maneira de dizermos: “Olá, estive aqui. Visitei sua página rapidamente. Um abraço. Fui!”

 No caso em tela, seria muito de minha parte desejar que alguém comentasse, visto que ninguém lia, porque ninguém acessava. O pior, no entanto, já havia ocorrido: Em 2006, criei no Orkut duas comunidades que ainda existem: “Alô Brejeiros” e “Francisco Sá, meu amor!”. Pois é... Fiasco total. Até hoje o único acesso que consta lá é o meu próprio. Para a pergunta que postei: “você conhece Francisco Sá?” Nenhuma resposta. Ou melhor, uma resposta. A minha: conheço, sim, senhor. E daí, qual é o problema, cara pálida? Triste, não! Mas é a realidade. Minha filha, que naquele tempo frequentava o Orkut tinha em sua página milhares de adicionados, enquanto eu não tinha nenhum sequer em minhas páginas comunidades.
- Filha, quando é que você vai prestigiar o papai com  sua visita a uma de minhas páginas no Orkut?
- Ah, velho, me desculpe, mas com esses títulos estranhos vai ser muito difícil de alguém se aventurar. Acho que estas páginas não terão nenhum outro acesso senão o do senhor! Dito e feito: ainda bem que eu não escrevi mais nada lá. Alias, nem eu sei hoje o que lá se encontra. Nunca mais entrei naquela joça. Só atualizo a minha página pessoal no Orkut por que não posso desativa-la devido ter lá adicionados amigos caros, em sua maioria, familiares.

Em maio de 2009 ao visitar meus pais em Burarama, passei um dia e uma noite no Brejo. Ao retornar para São Paulo reiniciei em outro site, “City Brasil”, alguns relatos de pouca ou quase nenhuma relevância. No entanto, hoje, esse blog se encontra com quase 115 mil acessos. Além dos outros blogs que mantenho, sempre se referindo ao Brejo, criados na mesma época, todos eles muito bem frequentados.
Mesmo com todas aquelas postagens as quais me referi no inicio destas mal traçadas linhas, em 2008, se você jogasse no Google “Francisco Sá”, o resultado da pesquisa trazia um certo Francisco Sá Carneiro, que até hoje não sei quem é. Pois, por não se tratar do meu Francisco Sá, Cidadezinha que se achava perdida nos rincões das Gerais, terra abençoada por Deus que me viu nascer, nenhum outro interesse teria eu em pesquisar ou procurar saber a quem se referia. Por certo, pelo simples fato de esse senhor ostentar o mesmo nome do Ministro da Viação que dá nome ao nosso lugar, já deve ser um grande motivo para fruir de toda felicidade e sucesso. Por favor, não me chamem de bairrista, “porque eu sou”.

No velho, e assim como eu, quase aposentado orkut, passaram a criar, aqui e acolá, algumas comunidades alusivas ao Brejo das Almas. Nada disso, no entanto, foi suficiente para romper as barreiras Cibernéticas que separavam o nosso “Brejo das Almas ou Francisco Sá, igual a ti, outro não há”, como diria Niquinho e Corinto, do mundo incomensurável do WWW (World Wide Web), que em português significa "Rede de alcance mundial". A coisa não engatava. Não dava liga. O Brejo não queria aparecer ou quem sabe, algum brejeiro, sem querer dividi-lo com o mundo, enterrou uma cabeça de jumento aos pés do cruzeiro.

Hoje, no entanto, graças aos esforços e dedicação de todo o nosso povo, a coisa mudou radicalmente. Se você digitar “Francisco Sá”, receberá de volta uma grande enxurrada de referências sobre a nossa Cidade. Com o advento do facebook, então, as comunicações ganharam muito mais velocidade. Ferramenta poderosíssima que entre suas incontáveis funções possui também a de colocar vários indivíduos online, repercutindo, ao mesmo tempo e em tempo real, assuntos de grande, média ou de quase nenhuma relevância aparente, mas que, lá no fundo, ao se analisar melhor, se constatará, fortuita e alvissareiramente que a principal missão dos idealizadores desta ferramenta, missão esta de importância indiscutível, está sendo cumprida ao pé da letra:  aglutinar pessoas, aproximando-as cada vez mais  uma das outras. Transportando-as para as diversas partes do Globo sem que precisem tirar um só pé do chão. De deslumbramento difícil, uma vez que encaro quase tudo nesta puta vida com naturalidade,  até porque o fato de eu ser Espirita há quarenta anos não me torna diferente de ninguém, vejo-me hoje deslumbrado com as facilidades que não existiam antanho. No Oriente Médio a quase doze mil quilômetros de distância da Cidade de São Paulo, onde vivo, abro um simples computador de mão em meio a uma rua qualquer de Bagdá  e de lá meus olhos veem a desfilarem-se no canto direito da pequena tela, “tops” ou curtas mensagens me informando que alguém, em um ponto qualquer do Planeta, curtiu ou comentou o meu link. Que há alguém querendo me adicionar a fim de ter-me como seu novo amigo. Dou um clique sobre um link e em átimos de segundos estou no site da Prefeitura do Brejo, onde posso acompanhar todas as ações do amigo Zé, em benefício da gente Brejeira. Entro no link “história da cidade” e vejo lá no final, o meu humilde nome. Volto para o facebook e os “tops” continuam me informando: Que o nosso Brejo agora tem um Centro de Memórias e que estou sendo convidado a participar da cerimônia de inauguração. Que o Brejo voltou a produzir alho como antes. Que as onças do Catuní voltaram a atacar rês. Que lá em “Capivara” a dita cuja que dá nome ao povoado foi extinta. Que lá no morro não há mais mocós. Que os dois riachos já não tem mais os encantos de outrora. Que os ventos que uivavam e varriam as ruas do Brejo das Almas hoje já não uivam mais. Que as águas do Gorutuba e São Domingos estão secando, etc. Com o simples deslizar do mouse sou remetido a  fotos antigas das Praças Jacinto Silveira e Rogério da Costa Negro, do Mercado Velho, do Padre Augusto, de Geraldo Tito e Olyntho, de Feliciano, de dona Mariquinhas, de Denilson pequeno,  de Roberto do buteco, de Wanderlino, em tarde de autógrafos de um de seus livros de  crônicas e poesias, na linda MOC, do Alex sander com sua humildade, lealdade e sede do saber e dos quase dois mil amigos virtuais que frequentam minha página. Com dois cliques sobre um link, vejo e ouço  o conterrâneo Tassio, ao vivo e em cores, aos berros, em acalorado discurso na Câmara Brejeira de Vereadores, em defesa dos Munícipes. Mais um clique sobre um link e sou transportado para o mais completo e bem elaborado jornal regional. Trata-se de “o Jornal de Francisco Sá”, do meu amigo Flávio Leão. Aqui, sem que seja necessário que eu dê nenhum outro clique, mas apenas com a barra de rolagem, vejo-me, como que por encanto, literalmente no Paraiso. Cercado agora por lindas  beldades, belas e formosas mulheres, com olhares ternos e imaculados de quem acaba de deixar a adolescência, dignas representantes da mais pura “beleza brejeira”, estou extasiado. Não... Não vou navegar mais... Navegar não é mais preciso. Quem gostava de navegar era o Cabral e nós sabemos no que deu. Para mim chega! O meu destino final é aqui. Agenda apertada. Compromissos inadiáveis. Agitação de São Paulo e Bagdá. Poluição. Buzinas nas minhas orelhas. Dez mil projetos de Engenharia iniciando. Vinte mil finalizando. Definitivamente, estou mandando tudo isso às favas. Eu quero mais é ficar neste céu, acompanhado por essas “deusas”, até a morte chegar. E que a dona Teresa, sol que há mais de três décadas ilumina a minha vida, razão maior do meu existir, a mais bonita de todas as deusas, não me leia. Amém!

Voltando à realidade, para finalizar, pergunto: Valeu a pena  termos vivenciado aquele engatinhar sofrível desta nova era em prol do conforto que usufruímos nos dias atuais?

A resposta soa-me aos ouvidos na voz do Excelentíssimo Senhor Doutor Deputado Federal Romário de Souza Faria, vulgo, “baixinho”.

- Valeu, peixe!

Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur

sábado, 5 de novembro de 2011

GENTE DO BREJO - MARIA BOCÃO

GENTE DO BREJO  -  MARIA BOCÃO

Enoque Alves Rodrigues

De repente, ela surgiu como se estivesse brotando do nada. Eles sempre surgem assim:  de onde menos se espera!
Todos nós meninos, próximos a entrarmos na adolescência, estávamos em frente ao velho Cemitério do Brejo das Almas, ou Francisco Sá, em um dia de finados, no aguardo de outros moleques que se integrariam a nossa turma para juntos, acompanharmos a procissão dos mortos.

- Qual é o seu nome?

- Maria!

- Mas, Maria do que?

- Maria “Bocão”!

- Uai, estranho, mas é esse mesmo o seu nome?

- É!

Perguntada, de onde vinha, respondeu-nos: “do pé na cova”. Referia-se ao antigo e famoso boteco com este nome que existia naquela melancólica, triste e silente localidade onde apenas aqueles que partiram deste mundo rumo ao Mundo Maior, a quem devemos sempre reverenciar, reinavam. Na realidade, conforme soubemos depois, Maria de Nazaré, era esse o seu verdadeiro nome, não provinha do “pé na cova”, apenas deu uma passadinha por lá para “molhar as palavras”, e não houvera brotado do nada, não, senhor. Nasceu, assim como todos nós nascemos, de um pai e de uma mãe e sua localidade de nascimento era o povoado do Caititu, meio distante de onde se achava agora. Tivera, no entanto, ainda em infância, alguma desdita, reservada que lhe fora pelo destino implacável ao qual não nos cabe questionar, que culminou em lapsos de memórias intermitentes que muitas vezes não a permitiam sequer saber onde estava. Trazia consigo, além do sujo bornal, em seu recôndito longínquo, traumas desencadeados talvez por alguma disfunção no processo alimentar, pois tinha como hábito não levar nenhum alimento à boca sem que antes o tivesse cheirado. Muitas vezes, em minhas curiosidades de quase infante, vi-a desprezar após haver recebido de alguém, saborosos e apetitosos petiscos. Alguma coisa, por certo, por razões que desconhecíamos, não caíra bem ao seu olfato sensível. Quando isso acontecia, de o alimento não passar pelo crivo do olfato, de nada adiantava o paladar aguçar o mundo das ascaridídas lá embaixo. Maria cismou com o rango, não tinha mesmo para ninguém. Aí só restava mesmo aos parasitas, chafurdarem-se em seus respectivos infernos astrais, onde permaneciam hibernados, até quando aquele divino ser, criado a imagem e semelhança de Deus, assim como nós,  finalmente decidisse ser menos exigente para com o “pão nosso de cada dia”.

Não sei se devo reivindicar para mim a primazia de tê-la visto antes de todos. Tampouco saberia definir o que isso viria acrescentar hoje, ao meu ego e personalidade ainda em duvidosa e inacabável formação, apesar de meus quase sessentinha.

O certo é que do impacto daquele nosso  primeiro encontro,  ou seja, de nós, moleques do bem, educados dentro dos mais rígidos princípios doutrinários, até vermos Maria enturmada com mais de uma dezena de outros de seus iguais em expiações e provas em busca do burilamento espiritual neste Mundão de Meu Deus, foi um pulo. Ainda hoje seria capaz de citar todos os nomes daqueles que alguns do Brejo, inadvertidamente insistiam em chamar de “doidinhos”.

Retornando a “Francisá”, (já perceberam que a maioria de nós nascidos no Brejo, involuntariamente ou não, ainda hoje nos relutamos em aceitar um gentílico “que não é nosso”, não utilizamos a pronuncia completa e correta de Francisco Sá?), depois de cinco anos em São Paulo, fui até um “brejeiro ausente” lá nos arrabaldes de onde se começava o Brejo. Saudoso, queria logo rever os amiguinhos, assim os chamava, os quais sempre se reuniam em torno de mim, as algazarras diante de algum lar em festa. Encostado ao batente da porta da casa de Feliciano, juntamente com Zé Rodrigues, Mateus Gordo, Maninho do Mocó, Manél, Cláudio Lagoa Seca, Demétrius, Gideão, Almeida e outros, tentava, inutilmente, identificar em meio aquela turma que dançava animadamente uns com os outros, um sequer, daqueles muitos que havia conhecido em tempos não tão distantes assim. Ledo engano: Cadê Maria Bocão, Roberto Carlos do Mato, Tininho, Chuteira, Pascomiro, Galdino, João Pretinho, Geraldo Magela, Boneca Preta, Mané Pezim, Katiússia... Cadê todo o mundo, pô!

- Acalme-se, Noquinho. Essa gente é assim mesmo. Quando uns vem, outros vão e quando uns vão outros vem... Aqueles que conhecemos em nossos tempos de meninos já se foram... Para substitui-los “Mandaram” estes que ai estão. Se você fixar melhor os seus olhos ternos nos semblantes de cada um deles, verá que são iguaizinhos aos que se foram.  Não há a menor diferença. Você não tem motivo algum para deixar de amar estes também. Basta que você os olhe com os olhos do Espírito, tontinho. Cresça e apareça moleque e não se esqueça jamais de que as aparências físicas não passam de um mero e insignificante detalhe!

Ai, ai,ai,ai,ai...Diria minha Santa e bela mãezinha lá em Burarama.

Pra ser sincero, essa doeu!

É...

Por vezes, e principalmente quando tentamos burlar o que veem os nossos olhos, a voz da nossa consciência berra aos nossos tímpanos.

Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur

sábado, 29 de outubro de 2011

GENTE DO BREJO - GERALDO MAZZAROPI

GENTE DO BREJO  -  GERALDO MAZZAROPI

Enoque Alves Rodrigues

Durante muitos anos, quando a precariedade das comunicações imperava nas pequenas cidades do norte de Minas, a Prefeitura Municipal de Francisco Sá, ou melhor, do querido Brejo das Almas,  tomou a iniciativa de criar seu próprio sistema de som. Uma velha Kombi caindo aos pedaços, de “cor daltônica”, sim, por que Cristão algum conseguia distinguir qual era a cor da danada, de tão suja que se apresentava, era utilizada nesse serviço. Alguns, quando chovia, arriscavam em afirmar meio, mineiramente, que a cor da Kombi era branca, devido pingos de chuva mais afoitos terem conseguido remover o encardido que existia sobre o teto externo. Outros, numa ilusão de ótica iminente, talvez sugestionados pela predominância da cor da terra Brejeira,  teimavam em dizer que a cor da Kombi era vermelha. Alguns mais inadvertidos ou com algumas doses de cana na cuca juravam que a cor daquela Kombi era amarela, lilás, azul, verde, etc. Na verdade, nenhum Brejeiro em pleno gozo de suas faculdades mentais possuía assertividades suficientes para tais afirmações. Instados a definir com exatidão aquela cor, apropriavam-se de palavras desconexas de nosso peculiar mineirismo, que é quando falamos tudo sem dizermos nada, a fim de não penhorarmos nossa palavra com afirmações das quais não temos a convicção plena, e mandavam:

- “Noquinho, posso lhe afirmar com toda certeza do mundo que a cor desta Kombi da Prefeitura é vermelha, mas olhando melhor, me parece que é azul, cinza, roxa, rosa, sei lá...”

- “Uai, sô, mas assim você não está afirmando nada. Qual é a cor da Kombi, afinal?” Bem... Deixa pra lá...

Completando a parafernália da qual vinha falando, instalaram-se um potente alto falante sobre o teto da Kombi e, dentro da dita cuja, um locutor com voz semelhante a do grande ícone do Cine Comédia Brasileiro, o saudoso  Amácio Mazzaropi, nascido aqui em São Paulo, no bairro do Brás, mas que passou quase toda a sua vida na Cidade de Taubaté, rasgava o verbo. Tendo como fundo musical a toada melosa e porque não dizer machista denominada “empreitada perigosa” (Quem tem mulher que namora, quem tem burro empacador. Quem tem a roça no mato,  me chama que jeito eu dou... Eu tiro a roça do mato e sua lavoura melhora. E o burro empacador eu corto ele na espora e a mulher namoradeira passo o couro e mando embora...), composta pelo quase conterrâneo, o Montesclarense Tião Carreiro, que formava dupla com Pardinho, ouviam-se: “Alô brejeiros, aqui vos fala Geraldo Mazzaropi. Por iniciativa do Excelentíssimo Senhor Prefeito de Francisco Sá, tenho a honra de convidar você e digníssima família,  para os festejos comemorativos pelo aniversário de nossa bem administrada cidade...”

Geraldinho Mazzaropi, assim o chamávamos, além da entonação da voz que, como já disse, que era idêntica a do velho “Mazza”, tinha também todos os jeitos e trejeitos do Jeca de Taubaté: nádegas propositadamente estufadas para trás, pernas lânguidas e andar meio ziguezagueante como se fosse um frango d’água.  Os Brejeirinhos, ao vê-lo, logo se acercavam dele, que sempre solicito, lhes dizia: “qual é a historinha de Jeca que vocês querem ouvir hoje?”

-  Sabem aonde o Jeca pegou aquele peixão?

-  Nãããããão!

- Perguntem pro homem do Emulsão. 

- Ahhhhh!

Referia-se ao Emulsão Scott em cuja  embalagem havia um homem com um peixe às costas.

 “Domingo ás 20 horas tem espetáculo no majestoso Cine e Teatro Mineiro... Não percam o duelo do século: O grandalhão “João Váine” (não conseguia pronunciar John Wayne) vai enfrentar o sela de prata “Juliano Gema” (Giuliano Gemma). Vai ser tiro para todos os lados. Vamos lá para ver quem vai vencer. Brejeiros, façam suas apostas...”

Pronto, a sorte estava lançada. Nas escolas, bares e alamedas, Brejalminos confabulavam-se e no final deixavam seus palpites sobre quem supunham seria o vencedor do duelo. Mal conseguíamos esperar pelo domingo. Cheios de entusiasmos, acorríamos todos ao velho Cine Mineiro. Sentávamos quase sempre nas primeiras fileiras para não perdermos nenhum lance. Expectativa... Adrenalina a mil... Atônitos e eufóricos... Espera difícil. O filme não começava. Murmúrio geral. Brejeiros inquietos:

- Uai, sô, mas cadê esse trem de filme que não começa?

- Sei lá... Uai... Espere um pouco... Aquele que está lá atrás com um carretel de filme nas mãos não é o Geraldinho Mazzaropi?

- Ih... É ele mesmo! 

- Deu crepe... O tão anunciado e esperado filme enroscou todo antes mesmo de ter começado. Enquanto isso, Geraldinho, que era um “faz de tudo”, agora estava com um dos lados do carretel em uma das mãos, enquanto com o dedo  puxava a ponta da fita cinematográfica, na tentativa de endireita-la dentro do carretel para que não houvesse cortes ou comprometimento da imagem. Mesmo com todo esse esforço, tais ações resultavam-se,  quase sempre, ineficazes, pois do começo ao fim do filme, pouca coisa se aproveitava. Cortes longos e intermitentes muitas vezes, de cenas inteiras, impediam que até mesmo as mais férteis das imaginações concatenassem idéias ou tivessem a mais simples e mísera noção de como seria realmente o enredo do filme e seu final. Entretanto, frustrações “tenebrosas” ainda estavam por vir.

Após passarmos longas horas assentados, com os “quartos” doloridos e a bexiga sobrecarregada reclamando pelo xixizinho básico e imediato, eis que surge, afinal, para a alegria de todos e felicidade geral da nação brejeira, o tão esperado fim do filme e o duelo “de titãs”, finalmente ia começar.

De um lado, Wayne com seu inseparável cigarrão em um dos cantos da boca e com duas tremendas pistolas, uma em cada coldre. Do outro lado, Gemma, equipado igualzinho a Wayne. Ao lado de cada um deles, suas montarias. Ao fundo, vários casarões de madeira com alpendres, onde moçoilas se achavam debruçadas para assistirem o espetáculo de horror. Em um barzinho de araque, vários bebuns observam. Em frente à Igrejinha, também de araque, o Padre e o Sacristão faziam o sinal da cruz. Lá no front os dois homens fitam-se com ódio nos olhos. Dão algumas voltas como se estivessem estudando um ao outro. Olhar tenso. Wayne, de tanta raiva, treme os músculos da face e cerra os dentes, rompendo em dois o cigarrão, cujo pedaço, vai ao chão. Gemma, também treme todo, da cabeça aos pés. Acometido de mortal ojeriza pelo desafeto Wayne, começa a piscar um dos olhos. Não entendíamos nada. Perdemos as principais cenas do filme. Meu Deus, quais foram os motivos que levaram aqueles dois homens ao ápice da ignorância humana? Porque se odiavam tanto?

Numa sintonia de fazer inveja a perfeição da Mãe Natureza, sacaram de uma só vez suas respectivas pistolas e abriram fogo um contra o outro. Baixadas a fumaça das saraivadas de tiros e a poeira levantada pelo tropel das montarias, agora, jaziam, ali, inertes, dois corpos estendidos no chão. Morreram-se os dois.

Para nossa decepção, pelo menos daquela vez, ou enquanto os dedinhos ágeis de Geraldinho Mazzaropi tivessem forças para seguir rebobinando aquela “maldita” fita, não houve ganhadores. Todos perderam. Inclusive nós.

Deu empate!

Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur

sábado, 15 de outubro de 2011

FRUSTRAÇÕES NATURAIS – FRANCELINO DO AREAL

FRUSTRAÇÕES NATURAIS – FRANCELINO DO AREAL

Enoque Alves Rodrigues

Alguns mais antigos devem ter ouvido falar ou talvez conhecido o meu personagem da crônica de hoje. Francelino do Areal, cujo “sobrenome” vinha da denominação da Fazenda Areal, de sua propriedade que ficava no Município de Francisco Sá. Ali Francelino cultivava alho, arroz, feijão, algodão, milho, e outras culturas. Criava também gados de corte, que vendia para um hoje inexistente Frigorífico que ficava no bairro Malhada Santos Reis, em Montes Claros. Festeiro contumaz, Francelino era devoto de Nossa Senhora e de todos os santos, principalmente de São Gonçalo, Padroeiro do lugar. Todas as festas do Brejo das Almas de então, tinham-no como seu principal idealizador. Já na véspera ouviam-se ao longe os foguetórios. As bandeiras dos santos saiam do Largo da Igreja Matriz sempre com Francelino a frente rezando “um bendito é o fruto entre as mulheres” e pedindo para que os marmanjos devotos abrissem alas para que o Santo pudesse passar. “Sai da frente bando de bebuns que o Santo precisa passar”, dizia. Aos renitentes que insistiam em não abrir espaço, empurravam com uma velha bengala. Depois de dar toda uma volta em torno do velho centro, paravam, finalmente, em frente a Igrejinha de São Gonçalo e lá ficavam discursando. Após destacar todas as virtudes do Santo homenageado, iam todos encher a cara nos bares.

Sujeito de palavra, forte e destemido que veio do nada, fizera, graças ao seu elevado espírito de luta, alguma fortuna, que, no entanto, devido as muitas desavenças familiares, numa das quais chegou a levar uma facada na barriga que deixou seus intestinos a mostra, começou a virar pó. Desgostoso, vendeu a Fazenda Areal com tudo que tinha e rumou-se com a família para Grão Mogol, onde  comprou outra fazenda esta bem pequenina, de nome “Três Capões” de onde não mais se teve noticias.

Não me lembro ter feito antes alguma alusão ao grande Francelino. Caboclo brejeiro que dentro de sua simplicidade cultivava hábitos muito salutares, quando se tratava de se obter bons resultados. Empreendedor convicto, daqueles que passam ás 24 horas do dia pensando em como se ganhar mais dinheiro, Francelino era, à sua maneira, um “o Midas do brejo”. Várias eram as abrangências de seus empreendimentos que alcançavam muitos ramos de atividades. Quase analfabeto, mal escrevia, punha nos bolsos muitos doutores das letras que queimavam pestanas e se contorciam todos para ganharem alguns parcos vinténs.

Ligeiro e astuto nos negócios. Mas cordial e generoso com os menos favorecidos. Cauteloso ao extremo, quando algum caboclo se dirigia a ele no sentido de lhe pedir algo fiado ou emprestado, ouvia sempre a mesma cantilena: “num vô lhe fiar ou emprestá nada. Vorte prá sua casa e veja com a Creuza o que ocêis necessita. Eu lhe darei de graça. Se eu te emprestá, ocê num vai ter cuma me pagar. Ocê é meu amigo e ai a nossa amizade vai pro brejo que num é das armas”.

Era um motivador nato. Do alto de sua rústica eloqüência salientava sempre que todos deviam ser como ele que nascera pobre e hoje tinha  mais que o suficiente para viver. Que assim como ele, quando se luta em busca de objetivos, eles acabam “dando as caras”. Contava aos roceiros embrenhados nos eitos de suas roças, várias anedotas que beiravam o inverossímil. Era dado à pesca. Naqueles tempos, hoje tão longínquos, os rios, Verde, São Domingos, Gorutuba, Quem- Quem e até mesmo alguns córregos meio abusados, eram pródigos na oferta de peixes. Havia grandes e importantes espécies de peixes nestes rios, enquanto que nos “córregos abusados” havia desde a traíra até o bagre, que, alias, davam um bom caldo.

No entanto especialmente naquele ano as coisas não estavam muito boas para Francelino. O ano foi de pouca chuva e a lavoura, quase todas as culturas, principalmente as de arroz, feijão e milho, perderam-se no chão de deserto. Corria-se a enxada no chão seco e era só poeira vermelha que levantava. Era de chorar. Francelino, no entanto, não se abalava, ou pelo menos nada demonstrava. Por outro lado, metera-se na Política onde patrocinava amigos correligionários aos pleitos à Prefeitura, Câmara de Vereadores de Francisco Sá e outras cidadezinhas. Mas para tudo há um limite e o limite da tranqüilidade de Francelino chegou exatamente quando ele enviou uma grande manada de gado para determinado frigorífico, em Montes Claros. O negocio havia sido fechado por ele com o dono daquele frigorífico, de tradicional família da velha MOC, há muito tempo.

Lá chegando, com toda a boiada em frente ao frigorífico, o capataz de Francelino foi informado pelo dono do frigorífico, conhecedor dos costumes do caboclo, que teria que voltar com a boiada para Francisco Sá porque seu frigorífico não estava vendendo nada. Que a “crise o estava devorando aos poucos”. E arrematava: “Esta maldita crise não está deixando mais nem um pouquinho de dinheiro para o pobre comprar carne”.

Como naquela época telefone era artigo de luxo até mesmo para certos ricos, o capataz sem saber o que fazer, mas receoso de volver com a boiada sem um prévio aviso ao seu patrão, permaneceu em Montes Claros, designando um peão de sua comitiva para ser o portador daquela triste mensagem. Depois de uma eternidade, o brejeiro finalmente chegou a Fazenda do Areal. Do alpendre do casarão Francelino o avistou ao longe. Logo deduziu que aquele retorno extemporâneo e solitário não lhe traria bons fluidos. Que havia algo de podre no reino da Dinamarca. Que a porca havia torcido o rabo e que não tinha quem o endireitasse. Ou que alguém havia roído a corda e agora cabia a ele consertar.

Ainda no alpendre, já deu um grito:

- “Mateus, Mateus, é ocê?”

- “É ieu, sim, meu pratão!”, respondeu-lhe o pobre vaqueiro, assustado.

- “E por que diabos ocê tá aqui só? Adonde tá Juca com o dinheiro dos boi?”

- “Antonces, meu pratão, é sobre isso qui eu quero falá e mecê num me deja. O cabra lá do figurifi de Monte Craro falô pro Juca qui num tem fulô de abroba (notas de 1000 cruzeiros da época) prá pagá o gado de mecê, apusquê uma tar de crise teve por lá e cumeu todo o frigurifi dele. Que o probe num tem dinhero pra comprá carne apusquê a mardita crise cumeu tamêm o dinhero. Seno assim, meu pratão, é mió qui nóis num vai lá. É muito pirigoso. Eu insisti cum Juca prá num ficá lá e trazê o gado de vorta. Mais ele é temoso Cuma jumento e me obrigô a vim falá cum mecê.”

Educado, comedido e resignado, Francelino entendeu de pronto o que havia acontecido. Calmamente esperou que o peão finalizasse sua fala. Chamou-o para dentro de casa. Ofereceu-lhe água e comida e no final lhe disse:

- “Bem, ocê já feiz a sua parte. Já foi lá e vortô e a crise nun te enguliu. Mais eu tenho lá os meus gado e os meus peão. Vou lá resgatá eles. Fica ai com a Edna, minha muié rezano prá qui eu ainda encontre eles lá Vico. Tumara que a crise nun tenha cumido eles tamêm!”

Pegou seu jeep e rumou-se à caminho de Montes Claros com a consciência plena de que ali chegando teria que renegociar ainda que em suaves prestações a sua boiada com o dono do frigorífico. Que as marés dos mares de Minas realmente não estavam para peixes e que caititu fora de manada é papo pra onça. Ele tinha que entender. Precisava aderir. Tinha que se recompor. A crise quando vem não poupa ninguém. Engole tudo e ai, meu nêgo, salve-se quem puder.

É...

Por vezes, ou quase sempre, quando a coisa está feia é melhor deixar como está para ver depois como é que fica.

Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur

sábado, 24 de setembro de 2011

A FÊNIX BREJEIRA – MANEZIN VAQUEIRO


A FÊNIX BREJEIRA – MANEZIN VAQUEIRO

Enoque Alves Rodrigues


Na década de 1960, mesmo com a crise, as visitas aos principais pontos turísticos mais importantes do Velho Brejo das Almas, ou Francisco Sá, “beldade do norte de Minas”, fervilhavam-se. Uma das atrações turísticas mais visitadas era a antiga e histórica Lagoa das Pedras. Para lá, convergiam-se multidões, vindas de quase todas as localidades e se aportavam às suas margens, onde passavam dias e noites se divertindo com a gama infinita de lazer que ali existia.
Águas claras e cristalinas onde se via, nitidamente, várias espécies de peixes, hoje inexistentes, nadando ao fundo. Ovinos, bovinos, caprinos, suínos e outras criaturas do mundo animal domesticado, misturavam-se a outros animais, do mundo racional civilizado, cada qual consumindo, engolindo inteiro, mastigando e ruminando, de acordo com o que determinam suas respectivas cadeias alimentares.
Canoas a remo, barquinhos com e sem motores, transportavam os homens “de coragem” até o meio da lagoa, cuja profundidade, diziam não ter fim. As mulheres com suas crianças de colo palestravam sentadas à beira da Lagoa com seus pezinhos delicados levemente mergulhados na água rasa, enquanto que seus pimpolhos, mais crescidinhos, cavalgavam sobre pôneis nativos ou brincavam de tourear algum bezerrinho recentemente desmamado. Os mais traquinas brincavam de caçar com bodoque, juritis, pombas amargosas, codornas, rolinhas e outras avezinhas silvestres.
Famílias abastadas de Montes Claros, Grão Mogol, Salinas e até mesmo de “Belzonte”, Capital das Alterosas, faziam dali seu habitat natural. Muitas chegavam ao ponto de fixarem suas residências naquelas imediações e de lá não arredavam pé de forma alguma. Usufruíam dos confortos que a grana lhes proporcionava naquele Rincão Paraiso, enquanto que muitos de nós, Brejeiros autênticos, nascidos nos arrabaldes ou com os dois pés cravados num brejo qualquer de lá, apenas nos conformávamos em  vê-los se divertirem. Era tudo que nos restava. Naqueles tempos assim como é hoje, amanhã e para todo o sempre, amém, a nata do leite jamais se deixou misturar com o soro. O máximo que nós, soros, conseguíamos, era como já disse, observar, discretamente, a nata em sua diversão.
- Uai, e a quem pertencia a Lagoa das Pedras?
- A nós, Brejeiros, uai!
Também íamos lá, claro. Mas somente quando não se achavam os ricos. Sim, porque eles nos olhavam com desdém. Agiam em relação a nós que não fruíamos de seus “status quo” como se fossemos Cidadãos de segunda classe. Desprezavam-nos em nosso próprio território. Nada podíamos fazer. Eles aportavam riquezas ao erário de Francisco Sá. Eles faziam a máquina pesada da Administração Municipal girar, ao passo que nós, povinhos simples, apenas produzíamos algumas migalhas que em nada impactavam de relevante.
É possível que muitos dos meus conterrâneos que neste momento se encontram lendo as bestagens que escreve esse reles genérico de escritor, se lembrem, com saudades daquelas tardes e manhãs domingueiras à beira da Lagoa das Pedras.
Manezin Vaqueiro era um desses pobres brejeiros, sem eira nem beira, que se contentava apenas em ver a nata bem sucedida se divertir. Timidez própria dos que “não souberam nascer”, vivia embrenhado nas matas adjacentes a Lagoa das Pedras, observando, sorrateiro, a pompa de seus desiguais. Os homens remavam enquanto sorriam deixando à mostra o ouro que cobria seus dentes bem tratados, que reluziam sob os reflexos lampejantes do Astro Rei naquela manhã primaveril.
De repente, grita uma voz de mulher:
- “Socorro. O Marquinho está se afogando... Tirem-no da água, pelo amor de Deus!” Á maneira que a mulher não obtinha resposta ao seu pedido de socorro, a criança se afundava e eram mais fortes e desesperadores os seus gritos de aflição.
Ao notar que nenhum daqueles “bem nascidos, bundas moles” se manifestavam, Manezin Vaqueiro  perdeu a timidez. Num gesto de bravura, coragem e destemor, imbuído do mais puro e elevado sentimento de amor ao próximo e solidariedade, independente de condição social, com habilidade e destreza peculiares a todos nós que nascemos na barranca do rio, jogou-se, de corpo e alma, nesta altura mais alma que corpo, nas águas profundas da Lagoa, só saindo de lá, minutos depois, com a criança quase desfalecida em seus frágeis braços. Foi aplaudido por todos que ali estavam pela sua coragem. Mas, matuto que é matuto, principalmente o brejeiro, não se deixa influenciar por endeusamentos fúteis.
Será?
À sua maneira, frente ao mulherio, carimbou, ali mesmo, a sua lição de moral, passando um tremendo sabão nos “bundas moles” que não tiveram coragem de lançarem-se ao rio.
- “Ocêis é uns riquin de merda qui num tem corage, porra niúma e qui borra as bota a cada peido... É muito fáci ficá ai si divertindo inquanto o minino afoga... De nada adianta ter esses barrigão cheio de cumida boa si nu curação de preda num tem nada. Ni um poquin de amô siqué... Eu divia era de cutucá ocêis cumia vara de tocagado prá vê se ocês se acorda... A cabeça docêis é cuma a cabeça de bagre, só tem b...”
Antes que Manezin completasse a frase, os “ricos bundas moles” corados de vergonha, no afã de sufocarem aquela descompostura matuta, na maior cara de pau, alçaram-no do chão e enquanto caminhavam com ele nos braços, gritavam, em uma só voz, a plenos pulmões, este refrão, aliás, próprio dos habitantes do Sudeste quando em aniversário.
- “E prá Manezin, nada?” Ao passo que outros gaiatos respondiam.
- “Tudo!”
- “E, então, como é que é?”
- “É!”
- É pique... É pique... É pique... É pique... É pique. É hora... É hora... É hora... É hora... É hora.  Ra... Tim... Bum... Manezin... Manezin... Manezin... Manezin.
Num misto de frustração pelo “abafo” de suas palavras agora inaudíveis aos ouvidos humanos, mas sentindo-se como se fosse a Fênix Brejeira que renascia das cinzas nos braços daqueles marmanjos vestidos do mais puro tergal, Manezim, agora, apenas sorria. Um sorriso amarelo e desdentado, é verdade, mas era um sorriso.
Não demorou muito para que os “riquin bundas moles” encontrassem o primeiro “infernin” mais próximo aonde “dispensaram aquela tralha”. Antes, no entanto, tiveram o cuidado de efetuar o pagamento antecipado de várias garrafas de “Chora Rita”. Ao saírem dali, deixaram ordens expressas e implacáveis à Margot, dona daquele fétido boteco de beira de estrada: “Segure esse tonto ai, Margot. Faça-o beber quantas garrafas de pinga forem necessárias. Não deixe que esse encosto vá à Lagoa encher o nosso saco. Não queremos que esse estorvo perturbe o nosso merecido sossego. Estamos cansados de não fazer nada. Nós precisamos nos divertir”.
É...
Por vezes, não é sem motivo que o velho adágio popular nos diz que quando a esmola é muito grande o santo deve desconfiar.
Enoque Alves Rodrigues, brejeiro de nascimento e convicção, que atua na área de Engenharia, é Escritor com dois livros a serem lançados, (Liderança Conquistada e Brejo das Almas em Crônicas), Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. Visitem meu blog: Pra variar, é sobre Francisco Sá: http://enoquerodrigues-earodrigues.blogspot.com/  http://www.facebook.com/profile.php?v=info&edit_info=all&ref=nur