Figueira e o Brejo das Almas
*Enoque Alves Rodrigues
Quando no dia 30 de Outubro de 1672 o Sertanista Antonio Gonçalves Figueira, Paulista nascido em Santos, filho de Maria Gonçalves Figueira e de Manoel Afonso Gaia fez sua primeira viagem integrando a expedição das esmeraldas liderada por Fernão Dias Paes e Borba Gato rumo ao norte de Minas Gerais, aquela localidade nada mais era senão um amontoado de matas virgens onde apenas índios e a pintada reinavam. Figueira tinha fama de grande caçador e quando saia à caça jamais voltava de mãos abanando.
Nesta sua primeira viagem em uma expedição a qual ficaria eternamente gravada nos anais da história em consequência de vários e insólitos episódios o grande Antonio Gonçalves Figueira, nada mais era senão um simples ajudante de ordens de seu cunhado Matias Cardoso de Almeida, Tenente naquela expedição. As atribuições de um ajudante de ordens daqueles tempos se restringiam a preparar as montarias para mais graduados montarem além de se responsabilizar pelos suprimentos da tropa incluindo ai as caçadas com as quais a alimentava bem como da cozinha onde preparava o rango da moçada.
Esta primeira expedição serviu-lhe muito mais como experiência do que não deveria fazer caso fosse o desejo lograr êxito na busca das esmeraldas e outras pedras preciosas por que ao contrário do que lhe ocorria quando saia à caça voltou de mãos abanando por que nenhuma pedrinha sequer conseguira colher. Na volúpia em busca das verdinhas o Bandeirante Fernão desembestou-se pelos lados da Bahia enquanto que Figueira, seu cunhado Matias Cardoso retornaram a São Paulo para reestudarem novas tentativas que de fato viriam a efeito nos anos de 1.694 e 1698, quando, finalmente definiram um rumo certo: o norte de Minas Gerais ou especificamente em Itacambira ou mais especificamente ainda na Lagoa Vapabuçú onde segundo davam conta às más línguas o próprio Fernão, assim como havia passado e colhido algumas pedras assim como muito antes haviam feito Sebastião Tourinho e Antonio Dias Adorno.
Só que também desta vez o trem não deu nada certo para eles por que na tal Jaíba coberta por matas densas e fechadas bem como por vegetações rasteiras idênticas rodeadas, pra variar, pelos montes claros que mais se pareciam com as torres gêmeas de tão iguais que eram acabaram por desorienta-los por que por mais que andassem acabavam saindo sempre no mesmo lugar. Aborrecidos e extremamente desapontados depois de darem sete voltas retornando sempre ao mesmo ponto de partida (hoje essa localidade se chama sete passagens), acabaram por abandonar a expedição das esmeraldas a qual ainda permaneceu por ali durante sete anos, tendo cada qual formado sua pequena expedição sendo que a do Figueira composta por 1000 homens ganhou os rumos do rio verde grande onde se acampou e a expedição de seu cunhado Matias retornou á São Paulo margeando o rio grande passando por Miguelópolis até chegar ao vale do Paraíba do Sul onde conseguiram umas pedrinhas chinfrins, mas reluzentes.
As coisas não estavam boas para os lados de Figueira. De Santos chegou-lhe a notícia levada que foi por um mensageiro no lombo de um burro que sua mãe havia morrido. Ele, perdido naquela vasta região do norte de Minas não havia até então conseguido nada de mais significativo senão vários bornais de pedras que imaginava tratar-se de turmalina, um parente meio próximo da esmeralda. Havia ouro sim, metal preciosíssimo que ele não muito interessado colhia. Os patacões saltavam-se das entranhas da terra qual mamona estalando em nosso agreste calorento. A fome do ouro com o qual saciavam a fome do maldito El Rei de Portugal já havia ainda não havia passado, mas a moda agora era mais para as esmeraldas e turmalinas. Por isto fazendo couro á imensa expedição de Fernão Dias Paes Leme a de Figueira se denominava esmeraldinha.
Antonio Gonçalves Figueira acabou dono de uma vasta faixa de terras subdividida em várias fazendas denominadas de Jaíba, Olhos D’água e Colônia dos Montes Claros. Foi com a intenção de unir os Montes Claros á região do rio Gorotuba e de lá até a Bahia, que ele aos treze dias do mês de outubro de 1704 organizou uma diminuta expedição composta de apenas vinte homens partindo em direção ao nordeste quando depois de percorrer vários dias entre idas e vindas ou mais vindas que idas porque seguia se perdendo e voltando sempre ao mesmo lugar, caindo e se levantando, na histórica tarde do dia 2 de novembro daquele mesmo ano sem mais nem menos, inesperadamente, viu-se na barriga da serra do catuni, ao lado de uma linda mais singela lagoa que desaguava em um riacho com nascentes naquela mesma serra, cuja lagoa se denominava "das pedras" que ao contrário do que ele pensava e buscava, não eram preciosas, mas pedra mesmo.
Por ser já tarde, dormiu por lá onde também por ser dia de finados acabou por fincar um cruzeiro de madeira tosca ao pé do qual ele juntamente com os seus vinte comandados rezou e que batizaram de "Cruz das Almas das Caatingas do Rio Verde", onde algum tempo depois construíram uma pequenina Igreja onde depositaram a imagem de São Gonçalo que veio se tornar patrono do lugar. E o resto da história todos conhece. É de domínio público.
O Capitão Antonio Gonçalves Figueira (outros historiadores utilizam "Figueiras") não era, efetivamente, o que podia se denominar de um destemido e inteligente Bandeirante, mas, convenhamos, justiça lhe seja feita, não fossem suas trapalhadas, seus perdidos, sua falta de foco e ausência total de bússola, jamais teria chegado um dia ao meu, ao nosso e ao seu Brejo das Almas querido. Quiçá, tivesse realizado outras descobertas em outras plagas lá pelos lados da não menos querida Bahia. Mas, quis Deus que ele não fosse tão longe e assim conseguiu, mesmo sem querer, querendo, dando-nos de presente o Brejo das Almas, ou Francisco Sá, "beldade do norte de Minas", que hoje cresce a cada dia, sonhando, feliz, a cada despertar, com a aproximação do dia em que real e definitivamente se cumpra mais um vaticínio daquele "Bandeirante trapalhão" quando disse que o lugarejo se tornaria um comércio próspero, não só pela sua posição geográfica, como também pelas riquezas naturais de suas terras.
Que Deus o ouça.
E tenho dito!
*O autor nasceu no Brejo das Almas